Temer nega caixa 2 e quer manter Padilha

Simone Iglesias e Eduardo Barreto 

25/02/2017

 

 

Presidente confirma que pediu doação à Odebrecht, mas nega ilegalidade; ministro fica de licença médica

O presidente Michel Temer manterá, por ora, o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil) no cargo, mas quer explicações sobre o conteúdo do pacote deixado pelo doleiro Lúcio Funaro para Padilha no escritório do advogado José Yunes, amigo do presidente
Temer conversou com Padilha, que está em Porto Alegre para tratamento de saúde, por telefone, na noite de quinta-feira. Acertaram uma licença médica, em princípio, até o dia 6 de março. A depender do resultado da cirurgia de próstata a que Padilha será submetido na próxima segunda-feira e do andamento das investigações, o afastamento poderá ser estendido.

Padilha se licenciou antes de o depoimento de Yunes se tornar público, logo depois de ficar internado por dois dias. A licença é por atestado médico e não está publicada no Diário Oficial. Na última segunda-feira, Padilha foi internado no Hospital das Forças Armadas em Brasília, com um quadro de hiperplasia prostática benigna. Ele teve uma obstrução urinária e precisou fazer um procedimento ambulatorial. O ministro deve ser operado segundafeira e, até o próximo dia 6 de março, ficará em recuperação.

Temer está preocupado e desconfortável com a situação porque, além de levar seu principal ministro para dentro da Lava-Jato, coloca Padilha e Yunes como adversários. Ambos são considerados os amigos mais próximos de Temer, um pelo lado político, e o outro pelo lado jurídico.

No Palácio do Planalto, a situação de Padilha está sendo tratada com cautela e muitas reticências.

— O que existe até o momento é uma ligação de Padilha a Yunes pedindo para ele receber em seu escritório documentos. Padilha não falou quem entregaria, não mencionou Funaro. Há questões que não estão claras. Temos que primeiro esperar esse episódio depurar, ouvir tudo com calma — disse um auxiliar próximo a Temer.

O presidente sabia que Yunes havia prestado depoimento ao Ministério Público e também foi informado pelo amigo sobre a entrevista à revista “Veja”. O advogado esteve com Temer no Palácio da Alvorada na tarde de quinta-feira.

Desde dezembro, Yunes vinha mostrando disposição de depor para esclarecer o fato de ter sido citado na delação premiada de Cláudio Mello Filho, ex-executivo da Odebrecht. Segundo o delator, Yunes recebeu em seu escritório parte de R$ 10 milhões, em espécie, acertados entre o dono da empreiteira, Marcelo Odebrecht, e Temer, em um jantar no Palácio do Jaburu, para a campanha eleitoral de 2014.

Em meio ao depoimento de Yunes, que complicou a situação de Padilha, o Planalto voltou a negar que Temer tenha se beneficiado de caixa 2 nas eleições de 2014, quando concorria a vice da petista Dilma Rousseff.

Em dezembro passado, quando Cláudio Mello Filho fez uma delação premiada arrastando para dentro da Operação Lava-Jato Temer e seus principais ministros, o peemedebista divulgou uma nota oficial repudiando de forma veemente o recebimento de R$ 10 milhões de Marcelo Odebrecht por meio de repasses não contabilizados para a campanha eleitoral. Dois meses depois, Temer mantém a posição de que não recebeu nada ilegalmente e que todos as doações estão registradas no TSE.

PEDIDO FEITO À ODEBRECHT CONFIRMADO

Ontem, a Secretaria de Comunicação da Presidência reafirmou que Marcelo Odebrecht participou de um jantar no Palácio do Jaburu onde recebeu pedido de “apoio financeiro” de Temer, mas sem que o peemedebista tenha especificado valores a serem repassados.

— O presidente não admite caixa 2 e confirma que pediu apoio financeiro sem especificação de valor — disse a assessoria.

À tarde, por meio de nota oficial, o presidente disse que a Odebrecht doou R$ 11,3 milhões ao PMDB em 2014:

“Quando presidente do PMDB, Michel Temer pediu auxílio formal e oficial à Construtora Norberto Odebrecht não autorizou, nem solicitou que nada fosse feito sem amparo nas regras da Lei Eleitoral. A Odebrecht doou R$ 11,3 milhões ao PMDB em 2014. Tudo declarado na prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral. É essa a única e exclusiva participação do presidente no episódio” diz a nota.

“Quando presidente do PMDB, Michel Temer pediu auxílio formal e oficial à Construtora Odebrecht; não autorizou, nem solicitou que nada fosse feito sem amparo nas regras da Lei Eleitoral” Nota oficial da Secretaria de Comunicação

Perguntas e respostas*

José Yunes é um dos melhores amigos de Michel Temer. Como manter Eliseu Padilha ministro se o próprio Yunes confirma o principal trecho da delação de Cláudio Mello Filho, que trata de caixa 2 organizado pelo presidente?

Temer manterá, por ora, Padilha no cargo, porque avalia que há questões que precisam ser melhor esclarecidas, caso do conteúdo do pacote entregue pelo doleiro Lúcio Funaro aos cuidados de Padilha. Temer e o ministro da Casa Civil acertaram uma licença médica, em princípio, até o dia 6 de março. A depender do resultado da cirurgia de próstata a que Padilha será submetido e do andamento das investigações, o afastamento poderá ser estendido.

Quando a delação veio à tona, em dezembro, Temer divulgou nota em que repudiava as acusações de Cláudio Melo Filho e afirmava que as doações feitas pela Odebrecht ao PMDB foram todas por transferência bancária e declaradas ao TSE. O presidente mantém a posição?

O presidente mantém esta posição.

O presidente não admite que o diretório nacional do partido que presidia arrecadou recursos por meio de caixa 2?

O presidente não admite caixa 2 na campanha de 2014. Por meio de nota, diz que a Odebrecht doou R$ 11,3 milhões ao PMDB em 2014. Tudo declarado na prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral.

Na delação de Cláudio Melo Filho, o executivo da Odebrecht afirmou que Temer solicitou “direta e pessoalmente” a Marcelo Odebrecht apoio financeiro para as campanhas do PMDB em 2014. O presidente confirma que pediu os valores? Padilha tinha alguma tarefa de arrecadação? Qual era? Ele tinha autonomia para negociar a forma de pagamento das doações?

O presidente Michel Temer confirma que pediu apoio financeiro sem especificação de valor, que Padilha era um dos coordenadores da campanha de 2014, mas não tinha autonomia para negociar formas de pagamento das doações. O presidente não autorizou, nem solicitou que nada fosse feito sem amparo nas regras da Lei Eleitoral.

O presidente já teve algum contato com Lúcio Funaro? Quando?

O presidente não conhece nem nunca falou com Funaro. *Perguntas à assessoria da Presidência da República feitas pelo GLOBO

 

O globo, n. 30518, 25/02/2017. País, p. 4