O globo, n. 30516, 23/02/2017. País, p. 7

Serra entrega carta de demissão da pasta de Relações Exteriores

Tucano alega problemas de saúde para deixar cargo; PSDB cogita nomes

Por: LETICIA FERNANDES e MARIA LIMA

 

-BRASÍLIA- O senador José Serra (PSDB-SP) pediu demissão do cargo de ministro das Relações Exteriores ontem à noite. Em uma conversa com o presidente Michel Temer, no Palácio do Planalto, o tucano explicou que precisará passar por um tratamento de saúde de pelo menos quatro meses, período no qual não poderia realizar as viagens internacionais que fazem parte das funções de chanceler. Durante o encontro, Serra também entregou uma carta na qual detalha a situação.

A saída de Serra do Itamaraty deixa vagas duas das principais pastas do governo Temer — já que o presidente vem enfrentando dificuldades para preencher o Ministério da Justiça —, e, na avaliação de parlamentares, pode levar o presidente a fazer um rearranjo na Esplanada.

 

“MOTIVO DE ORGULHO”

No PSDB, os dois principais nomes para o cargo, tidos como de perfil semelhante ao de Serra, são os dos senadores Aloysio Nunes Ferreira (SP) e Tasso Jereissati (CE). Apesar disso, os tucanos admitem que, diante do apetite do PMDB por mais espaço no governo, Temer pode usar a circunstância para alterar a configuração dos partidos. Ministros do PSDB acreditam, no entanto, que a legenda de Temer não tem quadros que preencheriam o perfil desejado para a chancelaria.

— Se houver decisão do presidente do PSDB de manter o mesmo tamanho do partido no governo, tem todo o desenho favorável para assumir o Aloysio ou o Tasso, sem dúvidas os nomes com mais perfil para substituir Serra. Pode ser que o PMDB queira reivindicar, mas eles não têm perfil para o Itamaraty — disse um ministro tucano.

Segundo auxiliares do presidente, durante o encontro com Serra ontem à noite, Temer insistiu para que o chanceler permanecesse no posto, mas ele declinou. Em dezembro, Serra foi submetido a uma cirurgia na coluna vertebral, no Hospital Sírio-Libanês, e a recuperação vem sendo dolorosa. Na carta, ele justifica o pedido de demissão e promete ajudar o governo no Congresso. Serra deve reassumir hoje e pedir licença em seguida.

“Para mim foi motivo de orgulho integrar sua equipe. No Congresso, honrarei meu mandato de senador trabalhando pela aprovação de projetos que visem à recuperação da economia, ao desenvolvimento social e à consolidação democrática do Brasil”, escreveu Serra na carta.

Há cerca de dois meses, Serra, que tem 74 anos, já havia confidenciado a amigos que vinha se sentindo cansado para o dia a dia da pasta. Segundo um deles, o então chanceler chegou a dizer que temia que um eventual pedido de demissão fosse interpretado como uma reação de temor em relação à Operação Lava-Jato. Desde a cirurgia na coluna, Serra só fez uma viagem ao exterior, semana passada para a Alemanha.

O ministro Antonio Imbassahy, da Secretaria de Governo, que esteve com Temer e Serra depois do pedido de demissão, disse que Serra levou um laudo para mostrar ao presidente.

— Não dá para insistir para ele ficar, ele levou um laudo e há uma recomendação médica muito forte para que ele evite esse tipo de deslocamento. A viagem que ele fez agora para a Alemanha foi um sofrimento. Serra preza muito pelo cargo, mas ele não tem mais condições de viajar — afirmou Imbassahy.

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Um chanceler odiado pelos bolivarianos

Por: ELIANE OLIVEIRA


 

A vida de José Serra como chanceler não foi fácil, principalmente no começo. Assim que assumiu a função de ministro das Relações Exteriores, logo após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em maio de 2016, enfrentou a ira dos chamados países bolivarianos. Venezuela, Cuba, Nicarágua, Equador e Bolívia insistiam em dizer que houve um golpe no Brasil. A Bolívia, por exemplo, chegou a chamar seu embaixador em Brasília de volta a La Paz.

As desavenças não terminaram e tiveram consequências que são sentidas até hoje. Por exemplo, o presidente Michel Temer não conseguiu o "agreement" — espécie de sinal verde — de Havana para emplacar um embaixador brasileiro no país caribenho.

O agora ex-ministro José Serra foi um dos responsáveis pela expulsão da Venezuela do Mercosul. Tinha posição crítica em relação ao governo do presidente Nicolás Maduro. Comprou a briga e teve como aliados o Paraguai e a Argentina. Enfrentou dificuldade para convencer o Uruguai, que acabou aderindo à ideia de tirar os venezuelanos do bloco.

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Temer quer anunciar ministro da Justiça amanhã

Deputado do PMDB e vice-procurador da República são os nomes mais cotados

Por: LETICIA FERNANDES, EDUARDO BARRETTO e JÚNIA GAMA


 

-BRASÍLIA- Com o caminho livre depois da aprovação de Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal, o presidente Michel Temer disse a ministros e aliados que pretende escolher e anunciar até amanhã o novo ministro da Justiça. Os nomes mais fortes no momento são os do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), a “solução parlamentar”, e o do subprocurador da República, José Bonifácio Borges de Andrada, a “solução jurídica”, mas ligado ao PSDB. Na bolsa de apostas do Planalto, o nome de Gustavo do Vale Rocha, assessor de assuntos jurídicos da Casa Civil, perdeu força. Temer, que viaja para a base de Aratu (BA) no Carnaval, tem conversado com pessoas próximas para definir o ministro.

— O presidente quer fechar um nome que tenha aceitação generalizada, para que a sociedade não entenda (a escolha) como um sinal trocado, principalmente em relação à LavaJato — afirmou uma fonte próxima ao presidente.

Segundo auxiliares de Temer, ainda não está definido se a opção será por um perfil político ou jurídico. O presidente tem guardado segredo sobre sua escolha para evitar uma “fritura” de potenciais candidatos e para não sofrer novos desgastes com desistências de convites, a exemplo do que ocorreu com Carlos Velloso.

Tucanos da cúpula afirmam que Temer tende a ceder à pressão do PMDB por mais espaço no ministério. Neste cenário, o nome de Osmar Serraglio é o favorito. Antes com dificuldades para se viabilizar internamente na bancada, Serraglio conseguiu reunir apoio majoritário no PMDB e é visto como a alternativa mais provável depois que Rodrigo Pacheco (PMDB-MG) foi esvaziado por declarações contrárias ao Ministério Público.

— Isso já foi superado. Se for um deputado do PMDB, a bancada vai apoiar. Serraglio trabalhou internamente e conquistou o apoio da maioria da bancada. Mas a nomeação ainda é uma hipótese, cabe ao presidente decidir — afirmou o líder do PMDB, Baleia Rossi (SP).

No caso de optar por um perfil mais técnico, Temer tem avaliado a possibilidade de nomear o vice-procurador-geral José Bonifácio de Andrada, que é bem visto por aliados de peso de Temer, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), o presidente do Senado, Eunicio Oliveira (PMDB-CE), e o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG).

Andrada conversou esta semana com interlocutores de Temer e afirmou que se sentiria “honrado” com eventual convite.

Segundo assessores do Planalto, Temer desistiu da ideia de criar uma estrutura separada para a Secretaria de Segurança Pública, com a recusa do ex-secretário de Segurança do Rio José Mariano Beltrame.