Prisão de conselheiros do TCE amplia crise no Rio

Fabio Serapião/ Beatriz Bulla/ Wilson Tosta/ Julia Affonso

30/03/2017

 

 

O Quinto do Ouro. Em nova ação que atinge a política fluminense, PF prende 5 dos 7 integrantes do Tribunal de Contas do Estado e obriga presidente da Assembleia a depor

 

 

Em mais um desdobramento da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro, a Polícia Federal prendeu ontem cinco dos sete conselheiros do Tribunal de Contas do Estado e levou coercitivamente para depor o presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani (PMDB). Os detidos são suspeitos de participar ou serem coniventes com supostos desvios praticados em obras públicas durante a gestão do ex-governador Sergio Cabral (PMDB).

A Operação O Quinto do Ouro aprofundou a crise do Rio e as denúncias de corrupção expandiram do Poder Executivo – cujo ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) foi acusado de chefiar uma organização criminosa – para o Legislativo, comandado por Picciani e tendo a corte de contas como órgão auxiliar.

A expectativa agora é quanto a possíveis acusações ou suspeitas que atinjam o Judiciário, onde o ex-governador tem fortes ligações.

A ação federal utilizou informações fornecidas pelo conselheiro Jonas Lopes e por seu filho, o advogado Jonas Lopes Neto, em acordo de colaboração premiada celebrado com o Ministério Público Federal. Jonas Lopes foi conduzido coercitivamente na Operação Descontrole, desdobramento da Lava Jato, e negociou a confissão de crimes praticados no TCE por uma pena leve.

Foram presos temporariamente com autorização do ministro Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o atual presidente do TCE, Aloysio Neves, o vice-presidente, Domingos Inácio Brazão, e os conselheiros José Gomes Graciosa, Marco Antonio Alencar e José Mauricio Nolasco. O exconselheiro Aluísio Gama também foi detido. Da atual formação da corte de contas, apenas a corregedora Marianna Montebello Willeman não foi alvo da operação.

A Polícia Federal cumpriu ao todo 43 mandados – seis deles prisões temporárias e 17, conduções coercitivas. A maioria dos mandados foi cumprida na capital, mas também em Duque de Caxias e em São João do Meriti.

O nome da operação, O Quinto do Ouro, faz alusão, segundo a PF, ao “Quinto da Coroa”, imposto cobrado pela Coroa portuguesa dos mineradores do Brasil Colônia.

Jonas Lopes partiu para a delação após ter sido citado por executivos da Carioca Engenharia, Odebrecht e Andrade Gutierrez em depoimentos. Em todos os casos, ele era apontado como destinatário de uma parte da propina oriunda de grandes obras no Rio.

 

Esquema. De acordo com a Polícia Federal, a operação se concentrou na suposta participação de conselheiros do TCE do Rio, em tese responsáveis por zelar pelas contas do Estado, no esquema de favorecimento de grandes empresas em obras públicas.

Em troca de pagamentos, os agentes públicos favoreceriam empresas e políticos na análise de contas/contratos sob fiscalização no Tribunal.

Outro alvo da investigação é o recebimento de vantagens indevidas por parte dos conselheiros para viabilizar a utilização do fundo especial do TCE-RJ no pagamento de contratos do ramo alimentício atrasados junto ao Poder Executivo.

Alvo ontem da operação, Aloysio Neves, o atual presidente do tribunal, foi chefe de gabinete de Cabral quando ele ocupava a presidência da Alerj (de 1995 a 2002). Os dois aparecem juntos em fotos de uma viagem a Paris, divulgada por opositores do peemedebista. Na gestão de Cabral na Assembleia, Jorge Picciani era o primeiro-secretário da Casa.

 

Picciani. Levado para depor na Superintendência da PF no Rio, Jorge Picciani já havia sido citado na delação de executivos da Carioca Engenharia. Segundo a ex-diretora financeira Tânia Fontenelle, a empresa Agrobilara, do presidente da Alerj, vendeu vacas superfaturadas para gerar dinheiro em espécie para a empreiteira.

Por sua vez, o proprietário da Carioca, Ricardo Pernambuco, revelou no seu acordo que comprou 160 cabeças de gado dos Piccianis por R$ 3,5 milhões.

Como o preço era acima do praticado no mercado, disse o empresário, o político teria devolvido R$ 1 milhão e ficado com o restante.  A ação da Polícia Federal confirmou previsão que corria entre a classe política fluminense havia algumas semanas de que ele não resistirá à divulgação da delação premiada de Jonas Lopes. O mais atingido pelas denúncias deverá ser o PMDB, que tem um ex-governador, exsecretários e um ex-presidente da Câmara dos Deputados (Eduardo Cunha) presos, e agora tem seu presidente regional sob investigação. 

 

Presidente. O chefe do Tribunal de Contas, Aloysio Neves, é levado para a sede da Polícia Federal, na área portuária do Rio

 

Vice. Domingos Brazão (à esq.), nº 2 da corte, chega à PF

 

 

PARA LEMBRAR

Delator foi alvo da PF há 3 meses

Em dezembro de 2016, o então presidente do TCE-RJ, Jonas Lopes, depôs coercitivamente na Operação Descontrole. Ele foi citado por delatores da Odebrecht e Andrade Gutierrez como favorecido do esquema de desvios em obras do Rio, revelado pela Operação Calicute, que prendeu o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB).

 

‘O QUINTO DO OURO’

● A ação investiga desvios de contratos com órgãos públicos para autoridades, em especial integrantes do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ) e da Assembleia Legislativa do Rio

 

Ordens judiciais

MANDADOS DE BUSCA E APREENSÃO - 20

CONDUÇÕES COERCITIVAS - 17

PRISÕES TEMPORÁRIAS – 2

 

Principais alvos

Prisões temporárias

Aloysio Neves

PRESIDENTE DO TCE-RJ

 

Domingos Brazão

VICE-PRESIDENTE DO TCE-RJ

 

José Gomes Graciosa

CONSELHEIRO DO TCE-RJ

 

José Maurício Nolasco

CONSELHEIRO DO TCE-RJ

 

Marco Antônio Alencar

CONSELHEIRO DO TCE-RJ

 

Condução coercitiva

Jorge Picciani

(PMDB)

PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RIO

 

Locais

São João do Meriti

Duque de Caxias

Rio de Janeiro

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45089, 30/03/2017. Política, p. A4.