Título: Cristo que não acaba mais
Autor: Ribeiro, Luiz
Fonte: Correio Braziliense, 18/12/2011, Política, p. 9

Obra de um monumento do tamanho do que existe no Corcovado, no Rio, não foi concluída em Bocaiúva, no norte de Minas, e provoca discussão entre prefeito e seu antecessor

Desde a sua passagem pela Terra, Jesus Cristo fomenta debates em torno de suas pregações e da própria fé cristã. Em Bocaiúva, cidade de 44,4 mil habitantes, no Norte de Minas Gerais, Jesus está no centro de uma polêmica, não por questões religiosas, mas por razões políticas e administrativas.

Uma estátua do Cristo Misericordioso, de 38m — a mesma altura do Cristo do Redentor do Rio de Janeiro —, construída há três anos, no fim da gestão do ex-prefeito Alberto Caldeira (PMDB), continua inacabada. O atual prefeito, Ricardo Veloso (PSDB), adversário ferrenho do antecessor, avisou que não vai realizar os serviços previstos no projeto original porque, para ele, "não é prioridade".

Veloso enumera as prioridades: asfalto, educação e saúde. Com esse pensamento, praticamente não fez qualquer esforço para terminar a obra projetada para ser uma atração turística da cidade, deixando-a na mesma condição em que a encontrou quando tomou posse em janeiro de 2009.

Distante 380km de Belo Horizonte, Bocaiúva é a terra do legendário político José Maria Alkmin e do sociólogo Hebert de Souza, o Betinho. Na época da construção da estátua, em 2008, o então prefeito Alberto Caldeira divulgou que o monumento faria parte de um "complexo turístico", incluindo centro de artesanato, restaurante, lanchonete e quadra poliesportiva, com investimento total de R$ 875 mil, envolvendo recursos da prefeitura e do governo federal. Como não conseguiu eleger o sucessor, Alberto Caldeira acelerou ao máximo os serviços do monumento no fim de 2008 para deixá-lo como uma das marcas da sua gestão, mas não conseguiu concluir a obra.

Ferros à mostra A estátua pode ser vista de qualquer parte de Bocaiúva, mas, quando alguém se aproxima do local, no ponto mais alto da cidade, no Bairro Zumbi, encontra somente a escultura, ainda sem pintura, e com ferros à mostra na extremidade da base. Nada de centro de artesanato, restaurante, lanchonete ou quadra. "Mas o que estava previsto no projeto foi feito" , alega Veloso, que sustenta já ter sido apresentada à Caixa Econômica Federal a prestação de contas de R$ 200,7 mil destinados ao centro de artesanato. O prefeito diz que não houve liberação de recursos para restaurante e lanchonete.

"A obra está totalmente inacabada", sustenta, no entanto, o ex-prefeito. Segundo Caldeira, o projeto original previa a construção de uma escada pelo lado interno da estátua, dando condições para a subida até o ponto mais alto da escultura, onde deveria funcionar uma espécie de mirante. As obras complementares estariam a cargo da prefeitura.

"Deixamos em caixa R$ 300 mil para o centro de artesanato e projeto pronto para captação de mais R$ 200 mil por meio de convênios com o governo federal", alega. Veloso desafia: "É mentira. Gostaria que ele mostrasse o extrato bancário dos R$ 300 mil em caixa e a documentação sobre projetos para a assinatura de novos convênios". O atual prefeito alega ainda que não se pode usar recursos públicos com obra de cunho religioso. Por outro lado, ele diz que já manteve entendimentos com a Igreja Católica para que seja construída uma capela junto do monumento.