Título: Réveillon amargo na Zona do Euro
Autor: Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 18/12/2011, Economia, p. 14

A moeda adotada em 17 países europeus completa uma década de circulação em janeiro diante das piores perspectivas de sua históriaNotíciaGráfico

O euro está com seus dias contados? A pergunta que ronda a mente tanto de especialistas como de leigos é um sinal definitivo da encruzilhada em que se meteu a Europa, sobretudo os 17 países que compartilham a moeda comum. A crise da dívida pública se agravou ao longo de 2011 e jogou água no champanhe comemorativo dos 10 anos de circulação da divisa, a serem completados em 1º de janeiro. Finda a euforia dos meses iniciais, o padrão monetário apontado como virtual sucessor do dólar na preferência mundial chega à primeira década com a pior perspectiva de sua história. Ao contrário da festa de ano-novo de 2002, a próxima será amarga para o continente, que enfrenta o fantasma da recessão e a realidade do desemprego, que ceifa os sonhos de 23 milhões de cidadãos.

Analistas ouvidos pelo Correio acreditam que o acordo assinado no último dia 9, após reunião de cúpula da União Europeia (UE), para assegurar maior rigor fiscal no bloco garantiu uma sobrevida ao euro. Mas os mesmos especialistas alertam: o acerto, que só teve a oposição do Reino Unido, terá de ser reforçado por ajustes externos também expressivos, com refinanciamento de passivos gigantescos de governos e bancos. Para isso, será fundamental a ajuda do Banco Central Europeu (BCE), do Fundo Monetário Internacional (FMI) e de instrumentos especiais, como o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Feef).

"Para piorar a situação, o consenso de que os governos europeus precisam dar um choque de austeridade para evitar a piora da desconfiança dos mercados deixou em segundo plano a necessidade também urgente de encontrar saídas para a retomada do crescimento", diz Moisés Marques, professor de relações internacionais da Faculdade Santa Marcelina (SP). Na visão dele, a deterioração da governança do euro começou com concessões excessivas dadas aos integrantes na década passada até ganhar escala drástica na saída da crise global de 2008 e 2009.

Os erros da política fiscal dos sócios no euro, somados à dificuldade em construir respostas coletivas com rapidez, fizeram com que a perspectiva de insolvência de Grécia, Portugal e Espanha contaminasse Itália, França e até mesmo a Alemanha. "Como não houve barreiras colocadas no tempo certo, o contágio atinge fase caótica, movida a fatores psicológicos", explica Marques. Com isso, apesar das recentes trocas de governo, como na Grécia, Itália e Espanha, as agências de risco — Moody"s, Standard & Poor"s e Fitch — colocam mais lenha na fogueira ao ameaçar baixar notas de países e bancos.

Bancos centrais nacionais da área do euro e o BCE formam um sistema com juros e padrão monetário unificados, que deveriam funcionar em economias dramaticamente desiguais. Obviamente, a experiência não deu certo.

Agora, o dilema da autoridade monetária europeia está entre cobrar mais disciplina nas contas públicas e socorrer as primeiras vítimas. "Resta deixar a situação se agravar até se saber o real tamanho do buraco financeiro", acrescenta Marques. O cenário mais pessimista inclui o fim da moeda única ou pelo menos a saída dos países mais problemáticos.

Relatório da Ernst & Young indica ser provável que a Zona do Euro sofra com uma "recessão moderada" na primeira metade de 2012. Apesar das reformas anunciadas, o clima ainda é de incerteza, o que reduz as perspectivas de crescimento da economia — a estimativa é de só 0,1% no ano que vem. Entre 2013 e 2015, a consultoria projeta alta de 1,5% a 2%. "Os investidores continuam receosos com a capacidade política da Eurozona de implementar reformas rapidamente", afirma Marie Diron, economista responsável pelo documento.

Passo atrás O governo da Suécia sinalizou ontem que não vai participar do acordo europeu sobre a disciplina fiscal se isso significar a adoção das normas mais rígidas definidas na semana passada no encontro da União Europeia. Com isso, aproximou-se da posição do Reino Unido. O primeiro-ministro sueco, Fredrik Reinfeldt, disse que o pacto ainda não foi finalizado e, por isso, é muito cedo para decidir se o país fará parte dele. "Eu não acho que devamos aceitar um regime em que o Reino Unido fique mais longe da cooperação do que o necessário", afirmou.