EUA e União Europeia pedem informações

Henrique Gomes Batista

Gabriela Valente

18/03/2017

 

 

Escândalo abala imagem do país e pode levar à criação de barreiras contra produtos brasileiros

PF desarticula esquema de pagamento de propina a fiscais para liberação de produtos adulterados e impróprios para o consumo. Investigação envolve 40 frigoríficos e atinge gigantes como BRF e JBS Em operação que envolveu 1.100 policiais em seis estados e no Distrito Federal, a PF desarticulou um esquema de venda e exportação de carne adulterada. Empresas pagavam propina a fiscais agropecuários para liberarem produtos como aves, carnes, embutidos e até ração para animais domésticos impróprios para o consumo. Segundo a PF, parte da propina iria para PMDB e PP. O escândalo levou os Estados Unidos e a União Europeia a pedirem informações ao governo brasileiro, e especialistas afirmam que as exportações do país serão afetadas. Executivos da BRF (dona das marcas Sadia e Perdigão) e um funcionário da JBS (Friboi e Seara) são investigados. Após a Operação da Polícia Federal que revelou a existência de um esquema de comércio de carne adulterada, o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, foi procurado por representantes dos Estados Unidos e da União Europeia, que pediram informações. O escândalo abala a imagem do país, maior exportador de carnes do planeta, e preocupa o governo brasileiro, que teme, nos bastidores, que parceiros internacionais usem esse problema como pretexto para adotar medidas protecionistas contra o Brasil não só nas carnes, mas também em outros setores do agronegócio.

“A imagem de todo o setor fica arranhada” Tarso Veloso Analista da AG Resources

O secretárioexecutivo do Ministério da Agricultura, Eumar Novacki, admitiu preocupação com a repercussão no exterior. Porém, ele observou que o Brasil é um grande player no mercado internacional do agronegócio e ressaltou que as denúncias se referem a casos isolados e que o produto brasileiro tem reconhecimento no exterior:

— Isso nos deixa bastante preocupados. O consumidor vai buscar outros produtos.

DESCULPA PARA PROTECIONISMO

O governo americano, que em meados de 2016 passou a autorizar a importação de carne in natura do Brasil, afirmou que está monitorando a situação do país após a operação da PF. Autoridades temem que o episódio possa ser uma desculpa perfeita para que a administração de Donald Trump, com viés protecionista, barre o produto brasileiro novamente.

“Neste momento, o Serviço de Segurança e Inspeção de Alimentos (FSIS) do Departamento de Agricultura (USDA, na sigla em inglês) está trabalhando com funcionários do USDA no Brasil para saber mais sobre esse assunto. Também estamos em contato com o Ministério da Agricultura do Brasil e continuaremos monitorando a situação”, diz a nota.

O organismo, contudo, tentou tranquilizar a população americana, lembrando que toda a carne que entra nos EUA passa por testes e “reinspeção”. “O FSIS recusará a entrada para importar remessas contendo patógenos que colocam os consumidores americanos em risco”, indicando que todos os produtos que entraram até agora do Brasil são “seguros e saudáveis”.

Fontes ligadas a autoridades do comércio entre os dois países, entretanto, afirmam que a notícia afeta fortemente a imagem do produto brasileiro e pode gerar problemas. Além de impedir um aumento de importação, pode ser usado como argumento para novas barreiras sanitárias aos alimentos brasileiros.

O episódio ainda afeta a credibilidade de empresas brasileiras que atuam nos EUA — a JBS, por exemplo, é dona da Swift e da Pilgrim, líderes nacionais em diversos alimentos.

Tarso Veloso, analista da consultoria especializada em alimentos AG Resources, de Chicago, estima que os danos serão generalizados para diversos alimentos e afetarão empresas de carne brasileiras em todo o mundo.

— A imagem de todo o setor fica arranhada, este caso passa a impressão de que falta regulamentação e qualidade por parte do governo brasileiro.

Embora não haja queixa contra o Brasil, espera-se que o representante brasileiro no Comitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias da Organização Mundial do Comércio (OMC) seja bombardeado por perguntas em reunião do órgão na próxima segunda.

O globo, n.30539 , 18/03/2017. Economia, p. 24