A ocasião que faz o ladrão

João Mauad

12/03/2017

 

 

Reportagem do jornal “O Estado de S.Paulo” revelou recentemente que o ministro Herman Benjamin, relator no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) do processo que pede a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, teria ficado impressionado com os depoimentos de Marcelo Odebrecht e de dois outros ex-executivos da empreiteira. Segundo o ministro, a Odebrecht teria se apropriado do poder público para benefício próprio.

Data máxima vênia, acho que o ministro Benjamim está a confundir causa e efeito. Se queremos resolver o problema, o primeiro passo é identificá-lo corretamente. É claro que, quando se fala de corrupção, não existem inocentes, e todos são culpados, mesmo porque a lei é clara ao equiparar corruptores e corruptos. Mas falar de apropriação do Estado pelas empresas é um grave equívoco. Fica parecendo que a origem do problema está na ganância e na má índole do empresário brasileiro, que corromperam agentes públicos indefesos e sem alternativa de recusar o “negócio”.

Ora, ninguém pode comprar um produto ou serviço que não esteja à venda. Se Odebrecht e outros compraram votos de políticos e “favores” de burocratas é porque essas “mercadorias” estavam à venda. Ademais, se desconhece que algum dos envolvidos tenha sido obrigado a qualquer coisa. Se as partes se locupletaram foi por livre escolha e, principalmente, porque havia fartos incentivos para isso.

A explicação para a corrupção que abunda nestas plagas é muito simples. Em primeiro lugar, está a impunidade reinante em Pindorama, seguida de perto pela enormidade do Estado. Buscar as causas da corrupção em fatores sociológicos, políticos ou psicológicos é perda de tempo. O empresário brasileiro não é, por natureza, melhor ou pior que o resto da humanidade. Logo, apontar a ganância como causa da corrupção é como culpar a lei da gravidade pela queda de um avião. Como qualquer outro crime, a corrupção é questão de incentivos e oportunidade.

Num contexto de instituições fracas como o nosso, quanto maior for o grau de intervencionismo do Estado, quanto mais inchada for a máquina pública e quanto mais poder e dinheiro nas mãos do governo, mais propício será o ambiente para a proliferação da bandalheira e maiores as chances de que ela venha a ocorrer, independentemente das ideologias dos partidos que eventualmente estejam ocupando o poder. “A ocasião faz o ladrão”, já dizia o velho brocado.

Quem duvida, basta olhar a impressionante sintonia verificada entre o índice de liberdade econômica, publicado anualmente pela Heritage Foundation, e o ranking da corrupção, publicado pela Transparência Internacional. Salta aos olhos a forte correlação existente entre intervencionismo e corrupção. Parece bastante óbvio que, quanto maior for a oferta de possíveis favores, mais haverá interessados em adquiri-los.

Como a solução do problema da impunidade não será possível em curto prazo, a maneira mais rápida, eficiente, lógica e econômica de combatermos o câncer social da corrupção é através da redução do tamanho do Estado, bem como da sua influência na economia. Todas as outras, por mais bem intencionadas, não passarão de meros paliativos. (...)

 

O globo, n. 30533, 12/03/2017. Artigos, p. 15