Indústria de alta tecnologia cai menos em 2016 e pode inverter sinal este ano

Arícia Martins

25/02/2017

 

 

Setores que mais sofreram em 2015, as indústrias de alta tecnologia reduziram sua queda pela metade no ano passado e, em alguns casos, já chegaram perto da estabilização nos últimos três meses de 2016. Os dados do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), divulgados com exclusividade ao Valor, apontam um cenário mais favorável para 2017, quando a flexibilização acelerada dos juros pode acentuar a reação dos ramos mais tecnológicos.

Depois de forte tombo de 19,9% em 2015, a produção da indústria de alta intensidade tecnológica recuou 9,6% no ano passado. Esse segmento é formado pelas indústrias farmacêutica, de materiais de escritório e informática, de equipamentos de rádio, TV e comunicação e de instrumentos médicos de ótica e precisão.
Em igual comparação, a faixa de média-alta intensidade diminuiu sua retração de 16,2% para 8,2%. A maior influência positiva para esse desempenho partiu da indústria automobilística, que recuou 25,9% em 2015 e, em 2016, acumulou perda menor, de 11,4%. Na média, a produção da indústria de transformação ficou 6,1% menor no período, após encolher 9,8% no ano anterior.

Nos setores que usam menos tecnologia, apenas a indústria de baixa intensidade conseguiu atenuar o ritmo de queda entre um ano e outro, de 5% para 2%. Nela, estão as fabricantes de alimentos e bebidas, couro, têxteis e calçados e, ainda, produtos de madeira, papel e celulose. Já o setor de média-baixa intensidade tecnológica, afetado pelo desempenho ruim da produção de combustíveis e derivados de petróleo, assim como pela fraqueza da indústria siderúrgica, viu sua contração aumentar de 7,7% para 8,9% na passagem anual.

Para Rafael Cagnin, economista do Iedi e autor dos cálculos, embora todos os setores tenham permanecido no campo negativo, a evolução em 2016 pode ser considerada favorável, principalmente para o segmento de média-alta tecnologia, que tem peso de 25% na indústria total. É preciso levar em conta que, no ano passado, o ritmo de queda desse segmento foi menor do que o registrado em 2014, que foi o primeiro ano de recessão da economia brasileira, observa.

"A indústria de média-alta intensidade tecnológica é importante na estrutura industrial porque envolve bens de consumo duráveis e bens de investimento", afirma Cagnin. Esses segmentos foram os que mais tiveram perdas durante a recessão e, por isso, a redução no ritmo de queda indica um início de reversão do quadro negativo, disse ele. "É quase um cenário em que os últimos serão os primeiros."

Na comparação de outubro a dezembro em relação a igual período do ano anterior, essa é a única categoria em que houve estabilização da produção, destaca o economista. Há quatro trimestres seguidos a retração na produção da indústria de média-alta tecnologia vem perdendo força e, nos últimos três meses de 2016, caiu apenas 0,1%. "Já há uma trajetória de recuperação."

O maior responsável pela estabilização, de acordo com Cagnin, foi a indústria de veículos automotores, reboques e semi-reboques, cuja produção avançou 7,5% de outubro a dezembro. O setor vem de uma base de comparação baixa - com queda de mais de 30% no último trimestre de 2015 - pondera o economista, e ainda tem capacidade ociosa elevada, mas tem sido impulsionado nos últimos meses pelo aumento das exportações.

Há, ainda, uma melhor perspectiva para os fabricantes de materiais e equipamentos mecânicos, que também compõem o setor de média alta-tecnologia e diminuíram a velocidade de retração entre o terceiro e o quarto trimestres, de 10,5% para 3,5%. Segundo Cagnin, o ciclo de afrouxamento monetário em ritmo mais acelerado beneficia principalmente o setor de média-alta tecnologia, ao melhorar as condições de financiamento e, também, pelo lado do custo de oportunidade, que é sempre levado em conta nas decisões de investimento.

Os juros menores também tendem a impulsionar a produção do segmento de alta intensidade tecnológica, em que está a indústria de material de escritório e informática, acrescenta o economista do Iedi. Nesse setor, a produção encolheu 7,1% nos últimos três meses de 2016, mas Cagnin ressalta que o ritmo de redução já chegou a 36,6% no primeiro trimestre do ano passado e, desde então, vem arrefecendo.

Como a redução mais expressiva dos juros está ancorada em perspectivas de desaceleração também significativa da inflação, principalmente de alimentos, o setor de baixa tecnologia também é um candidato a ter comportamento mais dinâmico neste ano, afirma. A ressalva é que a indústria alimentícia tem mostrado comportamento volátil e, por ser exportadora, pode ser negativamente afetada pelo câmbio mais apreciado.

Na média, o Iedi trabalha com expansão de cerca de 1% da produção industrial de transformação em 2017, desempenho que Cagnin considera uma estabilização. A necessidade de reposição de consumo de bens duráveis após dois anos de demanda em queda livre pode abrir espaço para uma reação mais expressiva, diz, mas o cenário é de "melhora em uma terra arrasada.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4204, 25/02/2017. Política, p. A2.