Investimento vai cair, mesmo com reforma da Previdência

Fabio Graner e Edna Simão

25/02/2017

 

 

Simulações internas do governo mostram que, mesmo no cenário improvável de a reforma da Previdência ser aprovada sem alterações no Congresso, a despesa primária no segmento deve continuar crescendo e comprimir significativamente os gastos com investimento para que o limite de despesas fixado possa ser cumprido.

No cenário de reforma mais ampla, incluindo as mudanças no regime próprio e no Benefício de Prestação Continuada/Loas (BPC), além de correção do salário mínimo apenas pela inflação a partir de 2020, o espaço para as demais despesas, grupo que inclui investimentos, seria da ordem de apenas 2% do total de gastos em 2026.
Os números são tratados com reserva no governo, mas foram elaborados diversos cenários de composição da despesa primária da União levando-se em conta possibilidades de versões menos ousadas da reforma. Nesse caso, a composição da despesa ficaria ainda mais desfavorável ao investimento, por conta da limitação imposta pelo teto de gastos.

Por exemplo, se fossem aprovadas só as mudanças na regra de acesso, como idade mínima de 65 anos e o tempo de contribuição de pelo menos 25 anos, o espaço para investimentos desapareceria em seis anos, ou seja, em 2023.

Nas simulações são projetados cenários para a trajetória de alguns grandes grupos de gastos: Regime Geral de Previdência (RGPS) e Lei Orgânica de Assistência Social (Loas), pessoal e encargos, abono, seguro-desemprego, saúde, educação e demais (a maior parte de gastos discricionários, como investimentos, e alguns obrigatórios, como subsídios).

No cenário sem reforma, os gastos projetados com RGPS e Loas saem de 47% das despesas primárias neste ano, se aproximam de 60% em 2022 e atingem 72% em 2026, ano a partir do qual o teto de gastos poderá ser alterado e subir mais do que a inflação.

Os demais grupos de gastos pouco variam em proporção do total no cenário, mas pessoal e encargos sai de 21% para 24%. Enquanto isso, as demais despesas estimadas partiriam dos 15% neste ano para chegar em apenas 1% do total em 2022 e ficando sem espaço nos anos seguintes.

O que os números mostram é que o desenho final do teto de gastos aprovado é complicado de ser cumprido à medida que o tempo passa, especialmente a partir de 2023, mesmo com um avanço significativo na contenção de gastos previdenciários.

Uma fonte do governo explicou que as simulações apontam claramente a importância de uma ampla reforma previdenciária, mas também evidenciam que ela sozinha não será suficiente para viabilizar o teto. Para essa fonte, o cumprimento do teto exigirá esforços significativos em outros grupos de despesas.

Gastos com pessoal e encargos (no qual estão os gastos com servidores ativos, mas também inativos civis e militares por exemplo), desoneração da folha de pagamentos, que aparece como uma despesa do Tesouro, e os subsídios (despesa obrigatória, mas com custo definido pelos juros definidos pelo governo para os programas), além de abono e seguro-desemprego são candidatos a serem revistos nos próximos anos.

"O Novo Regime Fiscal exige aprimoramentos contínuos dos gastos", destacou. Segundo a fonte, a adoção de um teto para o crescimento do gasto público pressupõe maior governança, ou seja, ter um foco na maior na qualidade do gasto público.

Mesmo assim, as dificuldades políticas inerentes à revisão de benefícios já instalados e a capacidade de efetivamente reduzir esses gastos deve colocar em xeque o teto de gastos muito antes do que os dez anos previstos na PEC. "Não tem gordura mesmo", afirmou a fonte, acrescentando que quanto mais for flexibilizada a proposta de reforma da Previdência encaminhada ao Congresso, ainda mais rígido se torna o Orçamento.

Encaminhada em dezembro do ano passado, a proposta de reforma da Previdência Social prevê a fixação de uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos para homens e mulheres e exigência de contribuição de 25 anos. Além disso, o texto prevê a unificação das regras para trabalhadores do setor público e privado.

O governo propôs ainda a desvinculação do BPC e das pensões do salário mínimo. A proposta está sendo debatida em Comissão Especial da Câmara, mas as discussões demonstram que haverá ajustes na proposta do governo, a despeito da resistência do governo. Já foram apresentadas emendas, por exemplo para impedir a desvinculação do BPC do salário mínimo. Outros artigos também devem passar por mudança como, por exemplo, a regra de transição, considerada muito abrupta.

A previsão oficial do governo é que a reforma da Previdência seja aprovada pelo Congresso Nacional ainda no primeiro semestre. Nos bastidores, no entanto, já se admite que isso pode ficar para agosto ou setembro.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4204, 25/02/2017. Brasil, p. A5.