Temer envia reforma tributária este semestre 

Martha Beck, Gabriele Valente e Eduardo Barretto 

08/03/2017

 

 

Presidente diz que editará medida provisória para simplificar PIS/Cofins. Fazenda prevê iniciar mudança em 60 dias

-BRASÍLIA- Em meio ao agravamento da crise política, o governo decidiu reforçar a agenda econômica e encaminhar ao Congresso sua proposta de reforma tributária. O presidente Michel Temer anunciou ontem, durante reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), o Conselhão, que vai editar uma medida provisória (MP) simplificando a cobrança de PIS/Cofins ainda este ano.

A ideia é fazer uma mudança gradual. Primeiro, será feita a alteração no PIS, que tem uma alíquota mais baixa e servirá de teste para o novo regime. Isso deve ocorrer em 60 dias. Depois disso, virão as mudanças na Cofins. No segundo semestre, o governo quer tratar da reforma tributária nos estados, com mudanças no ICMS.

Durante a reunião do Conselhão, os empresários reclamaram da burocracia e das dificuldades para acertar as contas com o Leão. Integrantes do Conselho apresentaram ao presidente uma proposta de criação imediata de um IVA (Imposto sobre Valor Agregado), unificando tanto tributos federais quanto estaduais. Foi na hora de responder a essa demanda que Temer falou das mudanças no PIS/Cofins.

— O governo até concorda com a direção dos conselheiros. Até o fim de março, adotaremos medida provisória para simplificação do PIS. Até o primeiro semestre, da Cofins, e, no segundo semestre, do ICMS — disse o presidente.

Posteriormente, técnicos da equipe econômica explicaram que o Ministério da Fazenda entregará a proposta final de mudança no PIS ao Palácio do Planalto em 30 dias. E, em 60 dias, ela poderia ser encaminhada ao Congresso por meio de projeto de lei ou ser feita por medida provisória. Somente depois disso viria a Cofins.

Internamente, integrantes do governo avaliam que é difícil tocar, simultaneamente, três reformas importantes: Previdência, Trabalhista e Tributária. Mas, diante da necessidade de mostrar avanços no campo econômico para desviar o foco dos problemas políticos, o Planalto avaliou que era hora de atender ao pleito do setor produtivo de reduzir a burocracia e melhorar a produtividade. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse ontem:

— Essa reforma (tributária) já está começando num ritmo vigoroso.

PREOCUPAÇÃO NO SETOR DE SERVIÇOS

Segundo a Receita Federal, a reforma do PIS/Cofins terá efeito neutro sobre os contribuintes. A ideia básica é que, ao fim do processo, os dois tributos sejam unificados, e as alíquotas, hoje em 3,65% e 9,25%, respectivamente, elevadas. Para compensar esse aumento, seria criado um sistema de abatimento de créditos pelo qual as empresas poderiam descontar todas as compras de insumos dos impostos pagos.

Isso, no entanto, preocupa o setor de serviços. Como o maior gasto dessas empresas é com mão de obra, e não com insumos, elas teriam pouco crédito a abater e acabariam oneradas. Ao falar das mudanças no PIS/Cofins, Temer não entrou em detalhes sobre como será feita a mudança.

Durante a reunião do Conselhão, Meirelles disse que a equipe econômica continua estudando medidas para aumentar a produtividade no país, como o aperfeiçoamento da Lei de Falências e a regulamentação das Letras Imobiliárias Garantidas (LIGs), um título com garantia real de operação separada do ativo do banco emissor. Ele citou ainda o fim da margem de preferência nas compras governamentais e a recuperação da autonomia das agências reguladoras.

Segundo Meirelles, o governo tem algumas metas a alcançar. Entre elas está reduzir o tempo gasto com o pagamento de impostos de 2.600 horas por ano para 600 horas por ano. Outro objetivo é diminuir o tempo de abertura de uma empresa de 101 dias para três dias.

Meirelles aproveitou para defender a reforma trabalhista. Ele citou o exemplo de uma multinacional europeia que relatou ter grandes dificuldades com a legislação vigente no mercado de trabalho brasileiro, onde emprega milhares de funcionários. Segundo o ministro, a empresa contou responder a 27 ações trabalhistas no exterior e a 25 mil ações no Brasil.

Durante a reunião do Conselhão, representantes do governo ouviram críticas em relação ao atual patamar do câmbio (com real valorizado frente ao dólar) e o prejuízo que isso traz para os exportadores. O ministro da Fazenda deixou claro que a equipe econômica não pretende controlar o câmbio. Ele lembrou que isso foi tentado no passado e que o que o governo tem de fazer é aumentar a competitividade:

— Se o governo cometesse uma sequência de novos erros, teríamos a depreciação da moeda.

Meirelles, entretanto, afirmou que sabe que a venda de produtos brasileiros para o exterior tem sido penalizada por várias questões. Em relação aos tributos, Meirelles disse que a questão será levada em consideração no projeto de reformulação do PIS, que será apresentado em 30 dias e enviado ao Congresso Nacional em 60 dias

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Meirelles: imposto pode subir para garantir meta

08/03/2017

 

 

Ministro diz que alta seria temporária e não descarta contingenciamento

-BRASÍLIA- O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, admitiu, ontem, que o governo poderá aumentar impostos para cumprir a meta fiscal de 2017, fixada num déficit primário de R$ 139 bilhões. Ele assegurou que o governo vai fazer o que for necessário para cumpri-la:

— Se for necessário aumentar impostos, será aumentado. Se for necessário contingenciar gastos, será contingenciado. Temos uma meta de R$ 139 bilhões e ela será cumprida.

O ministro destacou que o rombo das contas públicas em 2017 é bem menor que o de 2016, de R$ 154,3 bilhões. Ele destacou que, se o governo não tivesse adotado um teto para os gastos públicos e mantido a trajetória de elevação de despesas vista nos últimos anos, o déficit primário passaria de R$ 280 bilhões. Meirelles disse ainda que cortes de despesas precisam ser permanentes, enquanto elevações de tributos, se necessárias, devem ser temporárias:

— O que temos que fazer é um compromisso de cumprir a meta. A carga tributária no Brasil é elevada e isso (aumento de impostos) tem que ser feito com cuidado — afirmou.

O governo terá de anunciar, nos próximos dias, um contingenciamento no Orçamento de 2017. O valor ainda não foi fechado, mas isso vai ocorrer porque as receitas do ano estão superestimadas. O Orçamento de 2017 foi elaborado com base na premissa de que a economia cresceria 1,6%. No entanto, os técnicos já sabem isso não irá acontecer, o que vai reduzir a arrecadação.

TEMER É CONTRA SUBIR IMPOSTO

Integrantes da equipe econômica ouvidos pelo GLOBO afirmaram que a projeção para o Produto Interno Bruto (PIB) vai cair — ficando provavelmente em 1% de alta — e que haverá redução na estimativa de receitas extraordinárias com concessões. Além disso, a reabertura do programa de repatriação, que pode render R$ 10 bilhões aos cofres públicos, ainda não foi aprovada. Assim, por ora, o governo não pode contar com esse valor para fechar as contas.

— Estamos revisando pra baixo aquelas receitas extraordinárias, com concessões de petróleo, hidrelétricas, etc. E tem a repatriação, que ainda não foi aprovada no Senado. Se ela não for aprovada até dia 20, não pode entrar — explicou um técnico.

É justamente por causa do cenário desfavorável de receitas que o governo voltou a considerar a possibilidade de aumentar impostos em 2017. Esse não é desejo do Palácio do Planalto, que considera o momento ruim diante do fraco desempenho da economia. Tanto que o presidente Michel Temer deu a determinação a Meirelles para que o ministro “faça de tudo” para não elevar impostos.

Isso também poderá ocorrer caso não haja um recuperação mais vigorosa e o contingenciamento não seja suficiente para assegurar a meta fiscal do ano. Por enquanto, a medida está em espera:

— Não precisa ter aumento de imposto agora. Dá pra segurar com um contingenciamento — disse o integrante da equipe econômica.

META NÃO SERÁ REVISTA

Diante do desafio das contas públicas de 2017, alguns analistas já apontam que o governo poderia ter de rever a meta fiscal do ano e aumentar o rombo do ano. Meirelles, no entanto, descartou essa possibilidade ao ser perguntado sobre ela.

— A resposta é simples: não. Mantemos a meta e o compromisso. Será tomada a medida necessária para isso — disse ele, acrescentando: — A arrecadação sofreu os efeitos desse PIB menor (de 2016). Os efeitos (da recessão sobre as receitas) foram no ano passado, e, mesmo assim, entregamos um resultado melhor. Vamos manter esse padrão. O compromisso com a meta será mantido e pronto. (Martha Beck, Gabriela Valente, Eduardo Barretto e Cristiane Jungblut)

 

O globo, n. 30529, 08/03/2017. Economia, p. 23