Valor econômico, v. 17, n. 4209, 08/03/2017. Brasil, p. A3
PIB cai no 4º tri e deixa herança negativa para 2017
 
Sergio Lamucci
Camilla Veras Motta
Alessandra Saraiva
Robson Sales


O Produto Interno Bruto (PIB) caiu no quarto trimestre do ano passado 0,9% em relação ao terceiro, uma queda expressiva, que deixou uma herança estatística bastante negativa para 2017, de -1,1%. Com um desempenho pior no segundo semestre do que no primeiro na série com ajuste sazonal, a economia brasileira encolheu 3,6% em 2016, um tombo influenciado especialmente pelo forte recuo do investimento e do consumo das famílias.

Apesar do resultado ruim, não houve uma grande onda de revisões para o resultado do PIB deste ano. A expectativa dominante é que haverá uma recuperação lenta e gradual ao longo do ano, que pode começar já no primeiro trimestre, embora com uma alta muito modesta em relação ao trimestre anterior. O ciclo de queda dos juros e a expectativa de safra recorde são dois dos principais fatores que levam os economistas a apostar na retomada em 2017, num quadro de melhora da confiança de empresários e consumidores.

No acumulado de 2015 e 2016, a economia brasileira encolheu 7,2%. Segundo a coordenadora de contas nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Rebeca Palis, os dois últimos anos foram os primeiros na série histórica da instituição a apresentar resultados negativos anuais consecutivos desde 1948. Em 2015, o PIB havia recuado 3,8%. O PIB per capita, por sua vez, está em baixa desde 2014, quando caiu 0,4%. Em 2015, encolheu mais 4,6% e em 2016, outros 4,4%. No período, o tombo acumulado chega a 9,1%.

Os analistas ouvidos pelo Valor Data esperavam uma retração do PIB de 0,6% no quarto trimestre, mas o número ficou em 0,9%, deixando uma herança estatística de -1,1% para 2017. Isso quer dizer que, se o PIB não crescer nada em relação ao nível dos três últimos meses de 2016, a economia recuará 1,1% neste ano.

Para Silvio Campos Neto, da Tendências , isso "realça o cenário desafiador" para a economia em 2017. A consultoria, que tem projeção de expansão de 0,7% para o PIB neste ano, deve revisá-lo "ligeiramente para baixo" ainda nesta semana. Ainda assim, Campos Neto diz que a "tendência de melhora ao longo do ano está mantida".

Para o economista, fatores que devem estimular a retomada continuam de pé, como a queda da inflação, o ciclo de redução dos juros e a melhora da confiança. A consultoria observa, porém, que "a reação da demanda no curto prazo é limitada pelo necessário ajuste fiscal e desalavancagem [a redução do endividamento] de empresas, famílias e governo."

Levantamento preliminar feito pelo Valor Data ontem mostrou que, pelo menos por enquanto, não houve uma leva relevante de revisões das projeções para o PIB. A enquete contabilizou quatro revisões entre 13 estimativas. A Daycoval Investimentos e a GO Associados reduziram a projeção para o ano, de 0,1% para zero e de 0,8% para 0,6%, nessa ordem. Já a Parallaxis diminuiu de zero para -0,1% a expectativa para o primeiro trimestre e manteve em 0,5% a de 2017. A Rosenberg Associados, por sua vez, alterou ambas as projeções. A previsão para o PIB em 2017 caiu de 1% para 0,7%, e a estimativa para o primeiro trimestre foi reduzida de uma alta de 0,4% para 0,3% em relação ao trimestre anterior.

"A economia deve demorar mais tempo para se recuperar. O primeiro e o segundo trimestres devem ser um pouco piores do que se esperava", afirma Thais Marzola Zara, economista-chefe da Rosenberg, para quem o PIB deve crescer com mais força no segundo semestre. Muitos analistas acreditam que a economia poderá crescer a um ritmo anualizado de 2,5% a 3% no quarto trimestre, num momento em que o efeito da queda dos juros terá mais impacto.

O consumo das famílias recuou no quarto trimestre 0,6% em relação ao trimestre anterior, a oitava queda seguida nessa base de comparação. No ano, a queda do principal componente do PIB pelo lado da demanda, com peso de 64%, foi de 4,2%. A situação dramática do mercado de trabalho e o endividamento ainda elevado das famílias ajudam a entender o mau desempenho do consumo, que já havia recuado 3,9% em 2015.

O investimento, por sua vez, recuou 1,6% no quarto trimestre. Em 2016, o tombo foi de 10,2%, uma retração que se seguiu ao recuo de 13,9% registrado no ano anterior. Excessivamente endividadas e num quadro marcado por grande ociosidade na economia, as empresas deixam de investir, num momento em que o governo segura os gastos de capital.

Já o consumo do governo caiu 0,1% no quarto trimestre, fechando 2017 com recuo de 1%. O setor externo, por sua vez, teve contribuição positiva no ano, com a alta de 1,9% das exportações de bens e serviços e a baixa de 10,3% das importações.

Pelo lado da oferta, a agropecuária amargou um recuo de 6,6% no ano. Segundo a Rosenberg, o resultado "decorreu principalmente do desempenho da agricultura", com a safra de grãos registrando queda de mais de 10%. "Em 2017, o quadro será inverso: a safra recorde deverá repor não só as perdas de 2016 como superar a safra de 2015 em muito", diz a consultoria. A agropecuária já teve um comportamento melhor no quarto trimestre, crescendo 1% em relação ao terceiro, feito o ajuste sazonal.

A indústria também foi fonte de más notícias para a atividade em 2016. O PIB industrial recuou 3,8%, encerrando o terceiro ano seguido em baixa. Em 2015, a queda tinha sido de 6,3% e em 2014, de 1,5%. Um ponto favorável é que a queda da indústria no quarto trimestre foi de 0,7%, um recuo menos intenso do que o 1,4% registrado no terceiro, como nota o Bradesco.

Com peso de 73,3% no PIB pelo lado da oferta, os serviços caíram 2,7% no ano e 0,8% no quarto trimestre. Em 2015, a queda também havia sido de 2,7%. (Colaboraram Arícia Martins e Estevão Taiar, de Brasília)