Valor econômico, v. 17, n. 4210, 09/03/2017. Política, p. A7

Moro aguarda STF para homologar leniência

 

Maíra Magro
 

O acordo de leniência da Odebrecht, uma espécie de delação premiada para empresas, deve ser homologado nas próximas semanas pelo juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava-Jato em Curitiba. O Valor apurou que Moro deve aguardar o trâmite das 77 delações de executivos do grupo, entre a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o Supremo Tribunal Federal (STF), para dar a chancela do Judiciário ao compromisso em que a empreiteira se compromete a pagar multa de R$ 3,8 bilhões às autoridades do Brasil, da Suíça e dos Estados Unidos. Outros R$ 3,1 bilhões serão pagos pela Braskem.

A homologação judicial fará, na prática, com que a leniência passe a ter efeitos na esfera criminal. A partir daí novas pessoas, chamadas "lenientes", serão chamadas a prestar depoimento, para detalhar fatos relacionados às fraudes cometidas pelo grupo empresarial. Esses fatos foram revelados inicialmente pelos 77 executivos e ex-executivos que fecharam acordos de delação.

Os lenientes são considerados personagens secundários nas irregularidades. Diferentemente dos delatores, não precisarão cumprir pena e ganharão imunidade penal. A partir da homologação judicial do acordo, abre-se um prazo para os lenientes aderirem.

Já os efeitos cíveis da leniência começaram a valer no dia 15 de dezembro, quando o acordo foi chancelado pela 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, que atua no combate à corrupção e em casos relacionados a improbidade administrativa. A partir desse aval a empresa começou a implementar um programa de "compliance", inclusive a monitoria independente para verificar se os mecanismos internos de combate à corrupção estão funcionando bem.

A Odebrecht começou também a prestar informações relacionadas à disponibilidade de caixa, necessárias para viabilizar o pagamento da multa parcelada em 22 anos. Nos Estados Unidos, a primeira parcela deve ser paga no dia 30 de junho. Da multa total de R$ 6,9 bilhões sem juros e correção, somando valores pagos pela Odebrecht e a Braskem, os Estados Unidos ficarão com R$ 980 milhões.

Como o acordo de leniência foi fechado dentro do pacote com as 77 delações, os acordos caminham em conjunto. Enquanto os delatores forneceram relatos, a empresa ofereceu a maior parte das provas, em troca de obter benefícios como a promessa do Ministério Público de não entrar com ações de improbidade administrativa.

Formalmente, considera-se que o conjunto de acordos está hoje nas mãos do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que pedirá ao ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no STF, a abertura de uma série de inquéritos decorrentes das delações da Odebrecht. Ao mesmo tempo, o procurador pedirá a retirada do sigilo dos depoimentos.

O caso seguirá então para as mãos de Fachin, que decidirá se autoriza a abertura dos inquéritos. O ministro também deve fazer uma cisão das investigações entre as instâncias competentes do Judiciário. Casos envolvendo parlamentares prosseguirão no STF. Fatos envolvendo governadores irão para o STJ. Já questões envolvendo pessoas sem prerrogativa de foro seguirão para a primeira instância do Judiciário em diversos Estados. É nesse momento que a leniência voltará para as mãos de Moro, que então deve fazer a homologação, segundo relataram ao Valor fontes relacionadas às investigações.

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MPF acusa Joesley de tentar comprar silêncio de ex-sócio

 
André Guilherme Vieira
Stella Fontes
 

A Justiça Federal em Brasília decretou a prisão temporária por cinco dias do empresário Mário Celso Lopes, ex-sócio da J&F Investimentos (holding da família Batista) na produtora de celulose Eldorado Brasil. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), Joesley Batista tentou comprar o silêncio de Lopes para evitar que ele revelasse supostas irregularidades na criação do fundo de investimentos Florestal. Ele foi preso ontem pela Polícia Federal (PF) em Andradina (SP), durante a deflagração da segunda fase da Operação Greenfield, que cumpriu ainda seis mandados de busca e apreensão em São Paulo e no Mato Grosso do Sul.

Mário Celso Lopes prestou depoimento e foi solto por decisão do juiz Valisney de Oliveira, da 10 ª Vara Federal Criminal, a pedido a pedido da PF. O órgão policial informou ao magistrado que não havia vaga disponível na carceragem de Brasília para abrigar o empresário, que então foi liberado.

Procurada, a J&F informou que "nenhuma das suas empresas foi alvo de busca e apreensão ou qualquer ação policial no âmbito da Operação Greenfield nesta quarta-feira", e que seus executivos "seguem à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento".

Sobre Mário Lopes, a empresa "reafirma que todas as suas relações comerciais com o empresário foram pautadas pela legalidades seguindo as estratégias e natureza do negócio e conforme as regras e condições de mercado". A reportagem não conseguiu contato com o advogado de Joesley Batista, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Sepúlveda Pertence.

Em novembro, depois de desencadeada a Greenfield, a Eldorado firmou contrato de R$ 190 milhões com a empresa Eucalipto Brasil S A., que tinha como sócios Mário Celso Lopes e o filho dele, Mário Celso Lincoln Lopes. No entanto, segundo os investigadores, menos de um mês depois de fechado o negócio houve a retirada de uma cláusula contratual. Para o MPF, essa alteração beneficiou Mário Celso Lopes em prejuízo da Eldorado e dos sócios minoritários: os fundos de pensão Funcef (Caixa Econômica Federal) e Petros (Petrobras). Todas as movimentações acionárias e negociações que viabilizaram os investimentos feitos pelos dois fundos de pensão acabaram por beneficiar Mário Celso Lopes e seu filho e sócio, no entendimento do MPF.

A procuradoria da República no Distrito Federal suspeita que o contrato tratou-se de uma manobra com o objetivo de "dissimular" o que seria a real intenção de Joesley Batista: garantir que seu à época sócio guardasse segredo sobre ilícitos que seriam relacionados à criação da Florestal.

Mário Celso Lopes foi sócio de Joesley Batista na Florestal S.A. e teve participação de 25% no capital da Eldorado. Essa fatia foi vendida à J&F investimentos em 2012, e resultou na saída do empresário da companhia.

"Considerando que depois de ter saído dos investimentos Mário Celso voltou a firmar contrato com o Grupo J&F, a fim de fornecer maciço florestal no total de R$ 190 milhões, deve essa conduta dos investigados Joesley Mendonça Batista e Mário Celso Lopes ser profundamente investigada", escreveu o juiz Valisney.

O magistrado determinou, a pedido do MPF, o bloqueio de bens e investimentos de Lopes, de seu filho - cujos endereços também foram alvos de buscas - e de três de suas empresas (MCL Participações, MCL Empreendimentos e Negócios e Eucalipto Brasil).

O MPF apontou ao juízo indícios de que os investigados praticaram gestão fraudulenta de fundos de pensão que fizeram aportes no Fundo de Investimentos em Participação Florestal, que recebeu cerca de R$ 550 milhões de Petros e Funcef.

Estabelecido em Andradina e dono de terras na região de Três Lagoas (MS), o empresário chegou a anunciar um novo projeto bilionário para produção de celulose em Ribas do Rio Pardo (MS). Os planos de Mário Celso levaram a J&F à Justiça, sob alegação de que o empresário assinou um acordo de não concorrência com a Eldorado. As partes chegaram a um acordo e o projeto não saiu do papel. Parte das florestas que seriam usadas para abastecer a nova fábrica foi vendida pelo empresário à Eldorado, por meio da Eucalipto Brasil. O contrato que estabelece essa transação, de R$ 190 milhões, é o foco das suspeitas do MPF.

A empresa Eldorado passou a ser investigada pela Greenfield após a descoberta de indícios de irregularidades no processo de escolha da empresa para receber recursos dos fundos de pensão.

Para a procuradoria, os responsáveis pelos investimentos no FIP Florestal atuaram ilicitamente e permitiram sobreavaliação dos ativos de investimento.

Mesmo com grande aporte de capital próprio (cada fundo investiu R$ 275 milhões) e assumindo riscos, Funcef e Petros não tiveram o controle da Florestal, diz o MPF.