Valor econômico, v. 17, n. 4210, 09/03/2017. Política, p. A12

Renan acusa Cunha de atuar com seu grupo para tomar conta do governo

 

Vandson Lima
 
 

Em um prenúncio de que uma verdadeira guerra interna se avizinha do PMDB, Renan Calheiros (AL) foi aos jornalistas para afirmar que, diretamente da cadeia em Curitiba (PR), Eduardo Cunha continua comandando seu grupo político e está atuando fortemente para tomar conta do governo de Michel Temer e do próprio PMDB.

"Eliseu Padilha precisa aproveitar que melhorou de saúde e voltar imediatamente para a Casa Civil. Ou ele volta logo, ou Eduardo Cunha bota o Gustavo Rocha em seu lugar", alertou. Rocha é subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil e considerado um homem de confiança do grupo político ligado a Cunha.

Renan disse ter dado o aviso ontem ao ministro Moreira Franco, da Secretaria-Geral da Presidência, em almoço. Para o senador, Cunha e seus aliados estão em franca disputa com o PSDB para tomar todos os espaços possíveis no governo. "Se Temer não fizer essa leitura, é porque está equivocado sobre decisões que toma", alertou. "É melhor um governo formado pelo PSDB do que por Cunha. Nessa disputa entre Cunha e PSDB, sou radicalmente PSDB", afirmou Renan.

Além de tomar espaços no governo, o grupo buscará também ocupar a estrutura do PMDB. É neste contexto que está a carta feita por deputados da sigla que defende o afastamento, do comando nacional do partido, de todos os dirigentes acusados de envolvimento no esquema de corrupção investigado pela Operação Lava-Jato.

O senador Romero Jucá (RR), um aliado de primeira hora de Renan, é o alvo. Ele seria retirado da presidência do PMDB se adotada a medida. "A próxima etapa, depois de tomar conta do governo, é quererem tomar conta do PMDB", vislumbrou Renan. A nomeação de Osmar Serraglio para o Ministério da Justiça, avaliou, contempla o grupo comandado por Eduardo Cunha.

O assunto foi discutido na noite de terça-feira em reunião de Renan com a bancada do Senado, juntamente com Jucá. O PMDB cancelou a reunião de ontem da Executiva, na qual a carta seria apresentada.

O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), acusou Renan, é o porta-voz das articulações de Cunha, que está preso no Paraná. Marun visitou o ex-presidente da Câmara em janeiro.

"Essa carta do Marun veio depois da conversa que ele teve lá com o Cunha em Curitiba e agora age como seu porta-voz. Isso é tão óbvio! Imagina, o PMDB, que tem um papel histórico, ser comandado pelo Marun?", acusou.

Por fim, Renan apontou que o presidente Michel Temer estaria sob chantagem do grupo. "O [Sergio] Moro, há 20 dias, estava defendendo o presidente da chantagem de Eduardo Cunha, negando as perguntas". O juiz federal Sergio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava-Jato na primeira instância, barrara 21 das 41 perguntas formuladas pela defesa de Cunha Temer, por considerá-las inapropriadas ou sem pertinência com o objeto da ação penal.

Citando o líder argentino Juan Domingo Perón, Renan disse que a política não se aprende, a política se compreende pelos sinais. "E esses são sinais que a política tem emitido".

E deixou claro que se empenhará em estar ao lado dos tucanos nesse embate. "Eu prefiro um governo formado pelo PSDB do que pelo Eduardo Cunha. Eu inclusive já defendi um espaço maior para o PSDB", disse Renan, elogiando as indicações dos tucanos, especialmente Aloysio Nunes Ferreira para o Ministério das Relações Exteriores.

No Palácio do Planalto, a avaliação foi de que ainda não estão claras quais as intenções reais de Renan, um jogador nato e que costuma se antecipar aos acontecimentos, com essa ofensiva ao grupo da Câmara. (Colaborou Bruno Peres)