A elite que se manifesta contra a reforma da Previdência

26/03/2017

 

 

Aconjugação de crise política com severa turbulência econômica gera um rastro de mazelas de toda ordem, mas serve ao menos para instigar a sociedade a enfrentar distorções com a finalidade de evitar que tudo não se repita. Até por uma questão de sobrevivência. No caso do Brasil, se nada for feito para abortar a tendência de aumento autônomo de gastos públicos engessados em regras que obrigam o administrador a destinar boa parte do Orçamento para setores específicos, e se for mantida a indexação de parcela ponderável das despesas, a insolvência do Tesouro é certa. Com todas as implicações dessa quebra: hiperinflação, recessão profunda, desemprego ainda mais assustador.

De forma correta, a equipe econômica do governo Temer ataca essa corrida suicida, para o precipício da derrocada fiscal, com o teto dos gastos — emenda constitucional já aprovada —e, o pilar central do ajuste, a reforma da Previdência, esta o grande fator de desequilíbrio crescente das contas públicas.

Afinal, 48% das despesas primárias da União já são absorvidos por aposentadorias e pensões. Uma conta que não para de crescer. Estima-se que, se nada for feito, 100% do Orçamento serão destinados ao sistema previdenciário em 2024.

Mas a Previdência não é apenas o principal vilão na geração de déficits estruturais. Há outro aspecto do sistema pouco abordado: ele é um dos fatores que concentram renda no país. Não é o único, é verdade. Há, por exemplo, bilhões do Tesouro usados para subsidiar crédito de empresas. Mas o sistema previdenciário tem também esta faceta deletéria.

Artigo dos economistas José Márcio Camargo e André Gamerman, publicado recentemente no GLOBO, mostrou, em números, como aposentadorias e pensões também funcionam como um instrumento de canalização de renda para fatias minoritárias da população.

Os economistas registram que se um casal de idosos tiver uma aposentadoria de R$ 1.270 cada um, o valor médio dos benefícios, a soma da renda dos dois os coloca no extrato dos 20% mais ricos do país.

O disparate aumenta quando se considera a aposentadoria média de um servidor público federal: R$ 9 mil, ou mais de sete vezes o que recebe o aposentado do setor privado. Juntos, segundo o artigo, aposentados do INSS e do serviço público são 16,3% da população brasileira, mas absorvem 54% do Orçamento.

Por diversas razões — o poder de corporações sindicais e outras —, um país com ainda uma grande proporção de jovens dá prioridade a despesas com os mais idosos e, portanto, deixa em segundo plano a educação básica, por exemplo.

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O globo, n.30547 , 26/03/2017. Editorial, p.18