Valor econômico, v. 17, n. 4221, 24/03/2017. Brasil, p. A2

Impactos positivos da reforma da Previdência

Por: Claudia Safatle

 

Os efeitos da reforma da Previdência sobre a economia do país são fortemente positivos, segundo estudo da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda. O trabalho estima os impactos da aprovação da PEC 287 em 0,65 ponto percentual sobre o crescimento anual do PIB em dez anos, período em que a taxa de investimento aumentaria 1,8% do PIB e a taxa de juros neutra da economia (que permite crescer sem pressões inflacionárias) cairia 0,62 ponto percentual.

Segundo o secretário Fábio Kanczuk, a melhora do ambiente macroeconômico se reverteria em favor dos aposentados. Se aprovada a reforma, em dez anos o consumo dos aposentados cresceria 1,7%.

A PEC 287 produz um ajuste nas contas dos benefícios previdenciários do INSS de 1,6 ponto percentual do PIB (ver gráfico abaixo). Hoje eles representam 8,1% do PIB. Sem mudanças, subirão para 9,7% do PIB em 2027. Com a reforma, ficam estáveis nos próximos 15 anos.

O sistema previdenciário brasileiro é generoso, diz o trabalho. A taxa de reposição (razão entre o valor da aposentadoria e do salário) é de 76%. A média dos países europeus é de 56%.

O mesmo ocorre com os benefícios de prestação continuada (como a Lei Orgânica de Assistência Social, Loas), que paga um salário mínimo para idosos muito pobres acima de 65 anos e para pessoas deficientes. "O valor dos benefícios assistenciais em relação ao PIB per capita no Brasil só é inferior ao do programa equivalente na Bélgica", diz o texto. Ele é de 16% nos Estados Unidos, 20% na Espanha é 20% e de 27% no Paraguai. No Brasil equivale a 33% e na Bélgica, a 35%.

A proliferação de regimes especiais e as aposentadorias por tempo de contribuição colocam a idade média de aposentadoria dos homens no Brasil entre as mais baixas do mundo, de 59,4 anos. Comparada aos países da OCDE, onde os homens se aposentam aos 64 anos, os brasileiros só perdem para os homens de Luxemburgo, que se aposentam com 58 anos. No México é de 72 anos, na Coreia, 71 anos, no Chile e no Japão, 69 anos. A dispersão é grande. Em Portugal a idade média é de 68 anos e na França, de 60 anos.

Kanzuk argumenta que trata-se de uma "pseudogenerosidade", pois acaba saindo caro para todos. Ele faz a seguinte comparação, para facilitar o raciocínio: Uma turma de estudantes vai almoçar. No cardápio há duas opções, "prato feito" e camarão. Um pensa em, já que a conta será rachada, pedir camarão. Quem optar pelo prato feito vai subsidiar o que escolher camarão. Todos tiveram a mesma ideia, pediram camarão, racharam uma conta cara, gastaram o que não podiam e vão ter que ficar sem a cerveja do fim de semana.

Tal como no atual sistema de repartição, onde os jovens arcam com os aposentados, os estudantes perderam o vínculo entre o custo e o benefício. "Parece que se está ganhando mas, na verdade, todos perdem" pagando juros altos, pesada carga de impostos e tendo menos crescimento, diz. É uma perda intangível e, portanto, difícil de ser medida, compreendida e aceita.

Nos últimos 25 anos o gasto primário do governo central passou de 10,8% do PIB para 19,7% do PIB. Do aumento de quase 9 pontos percentuais, 5,6 pontos foram com a seguridade social (previdência e assistência). O restante foi distribuído com subsídios, salários e outras despesas.

(...)

A previdência urbana, que era superavitária, no ano passado registrou déficit. A rural, que tinha um déficit de R$ 14,7 bilhões em 2002, hoje carrega um "buraco" de R$ 103,4 bilhões. Somando os dois regimes, o geral (RGPS) e o dos servidores públicos (RPPS), o gasto equivale a 13% do PIB.

Acrescentando a assistência social, chega-se às contas da seguridade cujo déficit também aumenta rapidamente. Era de R$ 58 bilhões em 2011 e foi de R$ 258,7 bilhões em 2016. O crescimento nos próximos dez anos é explosivo. Este ano a seguridade consumirá 54,6% do gasto total. Em 2026, sem a reforma, estará abocanhando 78,6% do gasto e inviabilizando o cumprimento da lei do teto do gasto bem antes disso. Com a reforma, o crescimento será mais modesto e chega em 2026 a 66,7% da despesa.

O Congresso está contra aspectos da PEC 287, sobretudo a idade mínima de 65 anos para aposentadoria rural e o aumento da idade de 65 anos para 70 anos da Loas. Esses são alguns pontos que o governo vai ter que negociar, segundo fontes do Palácio do Planalto.

Na ótica macroeconômica, o importante é preservar o valor da reforma, pouco interessando como ele será distribuído. Justiça e equidade são outras questões. Segundo dados da Instituição Fiscal Independente (IFI), é gritante a disparidade entre a aposentadoria média do trabalhador do setor privado (RGPS), de R$ 1,2 mil mensais per capita, e a do setor público (RPPS), de R$ 9,4 mil mensais, sendo R$ 10,3 mil para os militares e R$ 9 mil para os civis. Isso significa que todo mês o Tesouro Nacional complementa R$ 370 na contribuição do RGPS e R$ 6,6 mil na do RPPS. É fato que a previdência do servidor já mudou, mas há um estoque pelo velho regime que vai demorar a desaparecer.

 

Claudia Safatle é diretora adjunta de Redação e escreve às sextas-feiras