Santana recebeu, na Suíça, dinheiro de outros países

Cleide Carvalho

Gustavo Schmitt

19/03/2017

 

 

Extratos mostram que recursos partiram de três origens

 

Parte das investigações de propinas pagas pela Odebrecht no exterior passa pela conta, na Suíça, do exmarqueteiro do PT João Santana. Extratos e mensagens trocadas entre o publicitário e o gerente da conta Shellbill, no Banco Heritage, obtidos pelo GLOBO, mostram que a mesma conta que recebeu dinheiro de caixa 2 para a campanha da ex-presidente Dilma Rousseff movimentou recursos de pelo menos mais três países: República Dominicana, Angola e Panamá.

Em depoimento ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na ação movida contra a chapa Dilma-Temer, o ex-executivo da Odebrecht Fernando Migliaccio afirmou que a empreiteira pagou por campanhas de João Santana em seis países, incluindo, além desses três, El Salvador, Venezuela e Argentina. Dos países citados, apenas Angola e El Salvador não têm acordo de cooperação com a Lava-Jato.

A Odebrecht confessou ter pagado US$ 439 milhões em propina em obras de 11 países, sendo US$ 92 milhões na República Dominicana; US$ 50 milhões em Angola; e US$ 59 milhões no Panamá. Na Venezuela e na Argentina foram, respectivamente, R$ 98 milhões e R$ 35 milhões.

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US$ 21,6 MILHÕES APLICADOS

Procurada pelo GLOBO para falar sobre os pagamentos no exterior, a Odebrecht informou em nota que não se manifesta sobre o teor de colaborações de pessoas físicas e reafirmou compromisso de colaborar com as autoridades.

Os documentos mostram que o gerente da conta driblou, por diversas vezes, a cobrança da direção do banco Heritage para que fosse comprovada a origem de recursos, devido aos altos volumes. Em outubro de 2015, as aplicações financeiras do publicitário alcançavam US$ 21,6 milhões — ou R$ 67,1 milhões na cotação atual. Da conta saíram diversos pagamentos a offshores em paraísos fiscais, que seguem investigadas, entre elas uma identificada como “dona Maria”.

O gerente cita em mensagens dez entradas de US$ 500 mil da República Dominicana, em 2014. Ao ser preso em 2016, Santana fazia a campanha de reeleição de Danilo Medina, do Partido de Libertação Dominicana (PLD). Nos extratos, há ainda registro de 23 transferências, num total de US$ 1,996 milhão, originárias de Angola e feitas em 2014, dois anos depois de Santana ter feito a campanha do presidente José Eduardo Santos.

No Panamá, uma das empresas de Santana fez campanhas para o Partido Cambio Democrático em 2014. O contrato celebrado com a empresa fez parte dos documentos enviados pelo Heritage e que ajudavam a explicar o sucesso financeiro do publicitário.

Na maioria dos países, pagamentos de campanhas eleitorais não podem ser feitos no exterior ou a empresas estrangeiras, o que indica que os pagamentos também podem ter sido feitos por “caixa 2”.

Ao depor ao juiz Sérgio Moro, o publicitário afirmou que, se todas as pessoas que recebem por caixa 2 fossem colocadas em fila, ela poderia ser vista por satélite.

O globo, n.30540 , 19/03/2017. País, p. 6