Marcelo Odebrecht revelou ao TSE que Dilma sabia que a empreiteira estava usando o caixa dois para pagar o marqueteiro João Santana, na campanha de 2014. Disse ainda que doou R$ 50 milhões na eleição como contrapartida à aprovação da MP 470, que permitiu refinanciar dívida da Braskem. A delação de Alexandrino Alencar, exdiretor da Odebrecht, relata em detalhes como a empreiteira participou da compra de tempo na TV para a campanha de Dilma Rousseff em 2014.
Alexandrino contou aos procuradores, em sua delação já homologada, que, a pedido de Edinho Silva, então tesoureiro da campanha de Dilma, deu a três partidos um total de R$ 21 milhões (R$ 7 milhões para cada) no caixa 2. Um de esquerda (PCdoB), um de direita (PROS) e outro do alto (ou do céu), o PRB, apêndice partidário da Igreja Universal.
A delação revela que o PT terceirizou a um executivo da Odebrecht a compra de tempo de TV de partidos que se tornaram aliados e garantiram mais tempo de TV à campanha.
Com o PRB, dono de 1m1s no horário eleitoral, foram três reuniões na sede da Odebrecht, em São Paulo. Todas com o presidente do partido e atual ministro da Indústria e Comércio do governo Michel Temer, Marcos Pereira.
Também na Odebrecht, Alexandrino reuniu-se com o representante do PCdoB Fábio Tokarski, que em 2014 foi candidato a deputado federal, mas acabou barrado pela Lei da Ficha Limpa. O PCdoB tinha direito a 1m12s por dia no horário gratuito — tempo vendido à chapa PT/PMDB, segundo Alexandrino.
O encontro com Euripedes Júnior, dono do PROS e de 45 segundos por dia de tempo na TV e no rádio, para acertar o caixa 2 foi num hotel em frente ao aeroporto de Congonhas, em São Paulo.
Edinho Silva disse, em nota, que a afirmação é um “verdadeiro absurdo”. “Jamais pedi doações que não fossem legais. As dezenas de doadores da campanha Dilma 2014 sabem disso. Uma afirmação sem nexo e sem lastro na realidade”.
Segundo ele, há uma nítida tentativa de “criminalização da campanha Dilma”.
Em depoimento ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no processo que investiga a campanha de 2014, o ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht contou que naquele ano o então ministro da Fazenda, Guido Mantega, relatou que parte dos recursos da empresa deveriam ser doados a partidos da coligação de apoio à reeleição da presidente da República.
— A pedido do Guido, nós doamos para outros partidos da coligação. E, aí, se eu não me engano, uma parte disso foi de caixa 2. Ele pediu para dar, foi para a coligação. Então, teve também isso, mas que não era campanha dela. Marcelo Odebrecht afirmou ainda que teria recebido uma orientação de Dilma: as doações da empresa iriam direto para a campanha dela, e não para o PT.
— Aí eu me lembro que, em maio de 2014, o Guido teve uma conversa comigo e disse: “Marcelo, a orientação dela agora é que todos os recursos de vocês vão para a campanha dela. Você não vai mais doar para o PT, você só vai doar para a campanha dela, basicamente as necessidades da campanha dela: João Santana, Edinho Silva (tesoureiro da campanha) ou esses partidos da coligação”.
Na campanha de Dilma em 2014, Marcelo Odebrecht relatou que acertou o pagamento de R$ 177 milhões com Mantega. Isso inclui R$ 50 milhões não doados em 2010 e que ficaram para a campanha seguinte..
SEMELHANÇA COM MENSALÃO
Ao falar do ex-ministro Antonio Palocci, entre 2008 e 2014, o empresário disse que foi acertado repasse de R$ 300 milhões. Não ficou claro se o valor diz respeito apenas a Palocci ou se inclui os valores acertados com Mantega.
A compra de apoio dos partidos também apareceu no mensalão. Em 2005, parlamentares foram acusados de receber pagamentos em troca de atuação favorável ao governo na votação de projetos de interesse da Presidência. O ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB), autor da denúncia que revelou o esquema, recebeu R$ 4 milhões. Jefferson apontou o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu como o mentor do esquema. Os dois foram condenados, junto com outras 23 pessoas.
O globo, n. 30545, 24/03/2017. País, p. 3