Contratação mais fácil 

Glauce Cavalcanti e Lucas Moretzsohn 

24/03/2017

 

 

Aval para terceirização deve ampliar geração de emprego, preveem analistas

O projeto de lei da terceirização aprovado na quarta-feira pela Câmara dos Deputados deve estimular a geração de emprego, avaliam economistas e advogados especializados em mercado de trabalho. O projeto dá segurança jurídica às empresas que já atuam com mão de obra terceirizada ou avaliam fazer isso. Apesar do aval da Câmara, o texto ainda não é definitivo para regular esse serviço. Ele será complementado por outro projeto em tramitação no Senado e, depois, regulamentado pelo Executivo. Manuel Thedim, economista do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), defende que, a curto prazo, o impacto será pequeno, mas no futuro o número de vagas crescerá:

— A longo prazo, sem dúvida gerará empregos. Quanto mais flexível, menos medo o empregador vai ter ao contratar. A médio prazo, aumenta a disposição para contratar.

José Márcio Camargo, economista da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio, argumenta que a medida vai gerar de mais empregos:

— Na hora em que se contrata, o empregador não tem a mínima ideia do custo do trabalhador. Muita empresa vai à falência por um problema de passivo trabalhista em decisões na Justiça. Isso vai diminuir muito e, consequentemente, vai demandar mais trabalho.

A segurança jurídica vem pela definição das regras do jogo, explicam advogados. Fica demarcado quem é a prestadora de serviço e como atua. A terceirização passa também a valer para contratos dentro da atividade-fim da empresa contratante, e não apenas para atividades-meio, o que antes era motivo de disputas judiciais.

— A terceirização é uma realidade. Qualquer regulamentação é melhor que nenhuma, ela traz segurança para o empresário que terceiriza. Mas não é uma segurança absoluta, podendo ser questionada a existência de vínculo (empregatício) direto pela subordinação — afirma Luiz Marcelo Góis, sócio na área Trabalhista do BMA.

Pelo novo texto será possível contratar por regimes diferentes profissionais para cargos equivalentes. Isso só pode ocorrer se esses trabalhadores não forem subordinados à mesma chefia.

— A lei atende ao anseio do empregador por flexibilização em recrutamento de mão de obra, mas ele precisa usar esse serviço da forma correta — diz José Carlos Wahle, do Veirano Advogados.

Ontem, em entrevista ao SBT Brasil, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse disse que a experiência internacional mostra que as leis mais flexíveis ajudam a aumentar o emprego.

—A perspectiva e a experiência internacional têm uma resposta diferente dessa que as pessoas pensam, de que a rigidez das leis trabalhistas, a judicialização pesada da Justiça do trabalho, beneficia o trabalhador. A experiência internacional diz que não, isso faz com que o país cresça menos, faz com que as empresas contratem menos trabalhadores e isso prejudica a todos.

MAIS AGILIDADE NA CONTRATAÇÃO

É consenso entre os advogados que o ganho para quem contrata não é financeiro, mas em agilidade na contratação e dispensa de mão de obra.

— Fazer e cancelar um contrato com uma empresa terceirizada tem impacto muito menor. É mais fácil para o empresário contratar e descontratar uma terceirizada do que um funcionário — diz Pedro Capanema, consultor jurídico da Firjan, entidade que avalia o projeto como “importante avanço” e que setores como de construção civil e audiovisual vão ser os setores mais beneficiados com a regulamentação.

“É uma decisão emblemática, que trará avanços importantes nas relações de trabalho”, declarou José Carlos Martins, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), por meio de nota.

O economista Bruno Ottoni, da Fundação Getulio Vargas (FGV), não vê risco de precarização das condições de trabalho, conforme as centrais sindicais denunciam:

— O que eu interpretaria como precarização seria não garantir os direitos da CLT e o piso mínimo do sindicato. A nova lei deve garantir isso para os terceirizados. Mas a nova legislação tenderá a produzir terceirizados que não terão os mesmos benefícios — afirma ele, reconhecendo que o projeto em tramitação no Senado é mais favorável aos trabalhadores.

Claudio Dedecca, professor do Instituto de Economia da Unicamp diz que o emprego não deve aumentar com a lei. Para ele, a criação de vagas está atrelada ao crescimento econômico e não a relações de trabalho mais flexíveis. Ele avalia que a insegurança jurídica permanece e que o projeto tende a precarizar as relações trabalhistas:

— Haverá uma enxurrada de ações na Justiça com controvérsias da expansão da terceirização em empresas. Se a Justiça for fortemente demandada para arbitrar situações de terceirização, a insegurança jurídica permanece — avalia o acadêmico. — As empresas buscam contratar mão de obra terceirizada em setores cuja presença sindical é mais baixa, os salários são mais baixos. É válvula de escape para as empresas.

As centrais sindicais criticaram o projeto e dizem que não vai gerar vagas:

— Dizer que isso aí vai gerar emprego bom, de qualidade, é mentira. Vai trocar o bom emprego por um emprego ruim — afirma João Cayres, secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

João Carlos Gonçalves, secretário-geral da Força Sindical, avalia que terceirizar em atividades-fim fragmenta a estrutura de trabalho da empresa e também das organizações sindicais:

— A legislação (aprovada ontem) rasgou a carteira de trabalho. A proposta é contraditória com aquela que já está no Senado, que foi negociada com trabalhadores, empresários e sindicatos.

Juliana Bracks, professora da FGV Direito Rio, diz que o projeto deixa lacunas, principalmente num momento que a reforma trabalhista dá mais peso aos acordos firmados com os sindicatos do que à legislação.

__________________________________________________________________________________________________________

Regras só devem valer após projeto do Senado

24/03/2017

 

 

Governo quer unir as duas propostas e vai negociar com patrões e empregados

-BRASÍLIA- Após a Câmara dos Deputados aprovar, anteontem, a regulamentação da terceirização, permitindo que a atividade principal também possa ser transferida para terceiros, o Palácio do Planalto vai esperar outro projeto, mais completo, que tramita no Senado, para sancionar uma regulamentação mais abrangente, unindo os dois projetos. O Senado deve votar a matéria em duas semanas.

Segundo o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDBRR), o projeto que passou na Câmara é “genérico” e foi aprovado rapidamente para reduzir inseguranças jurídicas e estimular a geração de empregos, como, por exemplo, com ampliação do contrato temporário de trabalho de 90 para 180 dias. A que está no Senado lista garantias que o governo quer manter.

— A regulamentação da terceirização faz parte da agenda microeconômica do governo. É importante para o país, porque vai estimular as contratações.

Na próxima terça-feira, Jucá vai se reunir com representantes das centrais sindicais, de entidades empresariais e com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), para fazer um ajuste fino entre os dois projetos e sugerir ao presidente os itens a serem sancionados e vetados. A ideia é votar o projeto do Senado sem alterações, para não atrasar a regulamentação.

Entre as salvaguardas previstas no texto do Senado, o governo quer manter a exigência de as empresas contratantes cobrarem das prestadoras uma garantia, pode ser dinheiro ou caução, seguro-garantia ou fiança bancária, para assegurar o cumprimento das obrigações por parte das prestadoras de serviço.

O governo também quer que as contratantes exijam mensalmente das prestadoras comprovação da regularidade das obrigações trabalhistas (salários, FGTS) e previdenciárias. As empresas contratantes poderão reter o pagamento da fatura se as prestadoras não cumprirem a lei.

O governo também quer aproveitar do projeto que tramita no Senado o tratamento isonômico nas instalações da empresa (refeitório, banheiros e ambulatório médico).

Apesar da resistência das entidades patronais, o governo vai manter a contribuição sindical temporária e a prerrogativa dos sindicatos de representarem os trabalhados quando eles forem da mesma categoria. Outra decisão é exigir que as contratantes retenham impostos e contribuições (IR, PIS/Confis, CSLL e INSS). Atualmente, isso é feito apenas nos casos de cessão de mão de obra, como limpeza, vigilância, construção civil, de informática, por exemplo. O texto da Câmara não entra na questão.

Jucá disse, ainda, que o governo deve vetar a parte do texto que está no Senado que cria a responsabilidade solidária (quando o trabalhador prejudicado escolhe a quem acionar na Justiça) e preservar o da Câmara, de responsabilidade subsidiária (o trabalhador aciona primeiro a prestadora e cita a contratante no processo). A proibição da terceirização do setor público deve ser vetada no projeto do Senado. O da Câmara permite.

Jucá afirmou que houve negociação com os representantes dos trabalhadores, mas centrais divulgaram ontem nota conjunta “condenando” o projeto da Câmara, mas dizem que estão abertos à negociação.

 

O globo, n. 30545, 24/03/2017. Economia, p. 21