Governo pode mudar cálculo de precatórios para reduzir rombo

Martha Beck e Danilo Fariello 

24/03/2017

 

 

Recurso destinado a ação judicial não seria contabilizado como despesa Aumento do IOF sobre câmbio e de PIS/Cofins sobre combustíveis está em discussão. Governo pode rever desonerações

-BRASÍLIA- Para tentar reduzir o tamanho do corte nos gastos necessário para cumprir a meta fiscal de 2017, de déficit de R$ 139 bilhões, a equipe econômica decidiu resgatar uma medida proposta pela equipe da ex-presidente Dilma Rousseff envolvendo o uso de precatórios (obrigações de pagamento dos entes públicos decorrentes de ações judiciais definitivas). A ideia geral é que recursos destinados ao pagamento de precatórios que estejam parados nos bancos há mais de quatro anos não sejam contabilizados como despesas primárias e ajudem na realização da meta.

A medida, apresentada em 2016 pelo então ministro da Fazenda Nelson Barbosa, previa a criação de fundos públicos nos quais o dinheiro ficaria até ser sacado pelos beneficiários. Na época, o governo estimava haver R$ 12 bilhões em recursos não sacados na Caixa e no Banco do Brasil que poderiam ajudar a reforçar o resultado fiscal de 2016.

DECISÃO DEVE SAIR TERÇA-FEIRA

Com a troca de governo, a ideia foi descartada. No entanto, com a dificuldade em obter receitas para fechar as contas, ela voltou à mesa. E será levada ao presidente Michel Temer junto com propostas de aumentos de impostos e reversão de desonerações. Segundo técnicos da área econômica, a ideia, agora, é um pouco diferente. Uma das possibilidades é que não sejam criados fundos públicos, e os recursos parados voltem para a conta do governo.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse ontem em entrevista ao SBT Brasil que estão na lista de possíveis aumentos de impostos alterações no PIS/Cofins e a reoneração de alguns setores da economia que tiveram incentivos fiscais no passado mas que não tiveram o incremento esperado na produção.

Nos bastidores, também estão na mira da equipe econômica para serem elevados o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), possivelmente sobre câmbio. No caso do PIS/Cofins, seria sobre combustíveis. Os técnicos da também estudam aumentar a Cide, mas PIS/Cofins foi considerada melhor opção, porque essa receita não tem de ser partilhada com estados e municípios.

Existe, ainda, a possibilidade de reverter a desoneração da folha de pagamento das empresas, que custa R$ 18 bilhões aos cofres públicos. Foram feitas simulações de aumentos de vários tributos. O IOF sobre câmbio, por exemplo, daria um reforço adicional de R$ 4 bilhões a R$ 5 bilhões à União.

A equipe econômica informou esta semana que o rombo nas contas de 2017 está em R$ 58,2 bilhões. Mas não haverá um corte nesse valor. Antes de passar a tesoura, o governo quer incluir nos cálculos receitas de decorrentes de decisões judiciais com concessões e precatórios que podem somar entre R$ 14 bilhões e R$ 18 bilhões. Só isso já reduziria o corte para pouco mais de R$ 40 bilhões.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, explicou ontem que a decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), de revogar a liminar que suspendia a relicitação da hidrelétrica de Jaguara, em posse da Cemig, poderá elevar as receitas deste ano. Assim como a usina, a estatal resiste em permitir a relicitação de outras duas hidrelétricas, que, se leiloadas novamente, podem responder por recursos significativos ao país.

— Existem outras duas hidrelétricas em condições similares que a Advocacia Geral da União (AGU) estará concluindo nos próximos dias se já podemos registrar isso como futura receita — disse Meirelles.

A decisão do STF referiu-se a Jaguara, mas as hidrelétricas de Miranda e São Simão estão em situação jurídica similar. Juntas, as três têm capacidade de gerar cerca de 2,5 mil megawatts (MW). Em 2015, o governo federal arrecadou R$ 13,8 bilhões com a relicitação de duas usinas prontas de 2,6 mil MW.

O governo chegou a prever mais de R$ 10 bilhões em arrecadação neste ano com a relicitação de usinas da Cemig, mas a manutenção desses recursos na revisão oficial foi posta em xeque pelas disputas jurídicas.

Meirelles prometeu anunciar na terça-feira o corte de gastos. Porém, o prazo final para a publicação da definição, destacou, é no próximo dia 29. Ele disse que o governo vem prorrogando o anúncio por conta do esforço para evitar elevar impostos.

 

O globo, n. 30545, 24/03/2017. Economia, p. 22