Valor econômico, v. 17, n. 4225, 30/03/2017. Brasil, p. A4

Dez setores produtivos concentravam 67% da renúncia fiscal na folha

 

Tainara Machado

 

Em termos de volume de recursos, a renúncia fiscal com a desoneração da folha de pagamentos é concentrada em alguns setores de atividade, segundo levantamento do Valor com base em dados divulgados pela Receita Federal. Dez ramos de atividade, entre eles transporte terrestre, produção de veículos, de máquinas e equipamentos e tecnologia da informação, tiveram renúncia de R$ 7,9 bilhões entre janeiro e novembro do ano passado, último dado disponível, o equivalente a 67,4% do total que a Previdência arrecadou a menos por causa da desoneração da folha no período.

A Receita atualizou ontem, até novembro de 2016 e com menos informações em relação a divulgações anteriores, as estatísticas sobre renúncia tributária com a medida. Até o início da tarde de quarta-feira, o último dado disponível era referente a agosto de 2015.

Não estão na tabela, por exemplo, dados sobre o número de empresas beneficiadas por setor, ou a quantidade de empregos em cada setor desonerado, o que permitiria o cálculo de quanto custa cada trabalhador desonerado. A partir dos dados disponíveis, também não é possível analisar a importância da desoneração em relação à folha de pagamento total do setor, apenas em termos absolutos.

Ainda assim, o conteúdo publicado ontem pela Receita permite observar que, até novembro de 2015, quando a desoneração "cheia" valeu para todos os setores contemplados, 82 mil empresas eram beneficiadas pela medida. Com a reversão parcial do benefício pelo ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy a partir daquele mês, passaram a vigorar novas alíquotas, de 2% a 4,5%, (embora a reversão parcial da desoneração tenha sido sancionada pela presidente Dilma Rousseff em setembro, a elevação de alíquotas precisa respeitar a noventena, por isso o efeito "fiscal" só aparece em novembro de 2015).

Desde então, o número de empresas desoneradas caiu bastante. Quando o governo decidiu elevar as alíquotas, a estimativa era que 56 mil empresas continuariam a se beneficiar da desoneração. No entanto, como o projeto de lei tornou a contribuição previdenciária sobre o faturamento facultativa - ou seja, empresas de um mesmo setor poderiam decidir contribuir sobre a receita ou sobre a folha de salários - o número de companhias beneficiadas caiu mais rápido do que se esperava. Em fevereiro do ano passado, já eram 43 mil. Em novembro, o número caiu mais, para 40,7 mil companhias.

A renúncia estimada pela Receita até novembro do ano passado é de R$ 11 bilhões. O gasto com a compensação à Previdência, segundo dados do Tesouro, foi de R$ 18 bilhões em 2016. Além do período ligeiramente diferente de comparação, o governo costuma demorar até três meses para repassar a diferença, o que explica a divergência entre os dados.

Desse total de R$ 11 bilhões, quase 70% ficam com apenas dez setores, a maioria deles na área de serviços, apesar de a medida ter sido originalmente desenhada para elevar a competitividade da indústria, dentro do Plano Brasil Maior.

Em dois setores, obras de infraestrutura e serviços de tecnologia da informação, a desoneração continuou bastante significativa mesmo com o aumento da alíquota sobre faturamento para 4,5% no fim de 2015, em vez dos 2% cobrados anteriormente.

Fabricação de artefatos de couro e atividades de rádio e televisão foram alguns dos setores que continuaram com alíquota abaixo de 2% depois de 2015, por terem sido considerados segmentos com mão de obra intensiva. Para esses ramos, a contribuição patronal é dada por alíquota de 1,5% sobre o faturamento. Os demais entre os dez maiores beneficiados contribuem com alíquota de 2,5%.

Para alguns segmentos, a mudança de alíquotas, em vez de reduzir a desoneração, aumentou o benefício. As agências de viagens, por exemplo, tiveram renúncia 130% maior, de janeiro a novembro de 2016, na comparação com os mesmos meses de 2015. Em publicidade, a alta foi de 12%.

Quem mais perdeu, na mesma comparação, foi a extração de produtos metálicos e de petróleo e gás natural. Juntos, os dois segmentos tiveram renúncia de R$ 400 mil até novembro de 2015. Em 2016, os setores passaram a pagar R$ 1 milhão a mais em contribuição previdenciária do que se contribuíssem com 20% sobre a folha.