Valor econômico, v. 17, n. 4218, 21/03/2017. Política, p. A9

Lista de Janot inclui um terço do ministério Temer

Fontes afirmam que o ministro Blairo Maggi e o ex-presidente José Sarney também estão citados

Por: Maíra Magro

 

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a abertura de inquérito contra nove ministros do governo do presidenteMichel Temer. O Valor apurou que praticamente um terço da Esplanada, formada por 28 pastas, está na segunda lista de Janot, decorrente das delações premiadas da Odebrecht e enviada na semana passada ao Supremo Tribunal Federal (STF). Os nomes de seis ministros vieram a público na semana passada, logo após a entrega dos pedidos de investigação. O sétimo do rol é o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, segundo apurou o Valor. Outros dois nomes ainda não foram revelados. O Palácio do Planalto já foi informado que nove ministros são citados.

Mais um integrante da lista é o ex-presidente José Sarney, que figura ao lado de governadores, ex-governadores, parlamentares ex-parlamentares do PMDB. O ex-presidente já foi alvo de um pedido de prisão - negado pelo STF - feito por Janot, por suspeita de atrapalhar as investigações da Lava-Jato. Outros dois ex-presidentes, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, também foram incluídos nos pedidos de investigação.

A lista inclui ainda integrantes do Tribunal de Contas da União, entre eles o ministro Vital do Rego.

A lista de Janot foi enviada na terça-feira ao STF, como resultado das 78 delações premiadas fechadas por executivos e ex-executivos da Odebrecht. Logo em seguida, na quinta-feira, Maggi pediu licença do cargo por dez dias para tratar de assuntos pessoais. O ato chamou a atenção por coincidir com o envio da lista ao Supremo. Com a eclosão da Operação Carne Fraca, da Polícia Federal, o ministro da Agricultura acabou cancelando o afastamento para tomar as rédeas da crise em sua pasta.

Maggi (que deixou o PR e filiou-se ao PP para integrar o ministério de Temer) foi governador do Mato Grosso de 2003 a 2010 esenador de 2011 a maio de 2016, quando se tornou ministro. Procurado pelo Valor por meio de sua assessoria, ele disse que não iria comentar sua inclusão na lista de Janot. Os motivos pelos quais Maggi se tornou alvo de requerimento de investigação ainda não vieram à tona, mas informações da sua área levantam duas hipóteses.

Atualmente, o grupo Odebrecht detém no Mato Grosso a concessão da BR-163, ligando Cuiabá a Santarém. A OdebrechtTransport, braço do grupo que explora concessões de infraestrutura, venceu o leilão de concessão em 2013. O trecho é uma via importante para o escoamento de grãos das regiões produtoras do Centro-Oeste. As obras de duplicação são feitas em parte pelaOdebrecht e em parte pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Enquanto senador, Maggi foi um importante interlocutor com o governo federal sobre as obras e, mais tarde, defendeu que elas fossem integralmente repassadas àOdebrecht.

No ano passado, a Odebrecht Transport colocou à venda o controle da BR-163, com a justificativa de que não estava conseguindo evoluir nas tratativas com o Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para obter empréstimo de longo prazo para as obras de duplicação da rodovia. Não houve até agora um comprador.

Alguns delatores da Odebrecht também relataram casos de ex-governadores interessados na aprovação de projetos relacionados ao ICMS. Segundo as delações, o grupo apoiou as demandas dos governadores com o pagamento de propina.

Além de Blairo Maggi, os nomes de outros seis integrantes do ministério de Temer se tornaram públicos nos dias seguintes ao envio da lista ao STF. Entre os ministros mencionados, Eliseu Padilha (Casa Civil), um dos articuladores mais próximos ao presidente, é alvo de mais de um pedido de inquérito. Também estão na lista Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência), Aloysio Nunes(Relações Exteriores), Gilberto Kassab (Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações), Bruno Araújo (Cidades) e Marcos Pereira (Indústria, Comércio Exterior e Serviços).

A lista de Janot também inclui governadores como Geraldo Alckmin (PSDB-SP), Luiz Fernando Pezão (PMDB-RJ), Fernando Pimentel (PT-MG), Beto Richa (PSDB-PR), Renan Filho (PMDB-AL) e Tião Viana (PT-AC).

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Ministro da CGU critica lista fechada

Por: Raphael Di Cunto

 

O ministro da Transparência, Fiscalização e da Controladoria-Geral da União (CGU), Torquato Jardim, criticou ontem a articulação para aprovar a lista fechada para eleição de deputados e vereadores e afirmou que isso engessará os partidos. "A quem interessa fechar a lista? Quem controla a lista fechada?", questionou, em seminário internacional para discutir a reforma política.

A movimentação para mudar o sistema eleitoral da lista aberta para a lista fechada ganhou apoio da cúpula do Legislativo, dos maiores partidos e do governo depois da delação premiada da empreiteira Odebrecht, que delatou mais de uma centena de políticos - que querem agora manter o foro privilegiado para responderem as acusações no Supremo Tribunal Federal (STF).

No atual modelo, voto proporcional em lista aberta, o eleitor pode votar diretamente no candidato ou no partido. Os votos recebidos pela coligação são somados para contabilizar o número de cadeiras que esse agrupamento terá direito e as vagas são distribuídas seguindo a ordem dos mais votados. Já na lista fechada quem decide essa ordem é a direção do partido.

Para o relator da reforma política, deputado Vicente Cândido (PT-SP), esse modelo "diminui fortemente a disputa interna entre os candidatos e reduz o custo de campanha". "Não existe democracia sem partidos políticos", disse. Ele apresentará no dia 4 de abril seu parecer, com a lista fechada para 2018 e 2022 e a partir de 2026 o modelo alemão, um híbrido, em que o eleitor vota em um partido e em um candidato de seu distrito.

O petista também vai sugerir proposta para tirar o sistema eleitoral da Constituição, tornando mais fáceis futuras alterações, e reconheceu que não existe hoje no Congresso apoio suficiente para aprovar a lista fechada, mas que espera construir maioria durante dois meses de debates. Ele rejeitou a acusação de que a alteração visa salvar os envolvidos na Lava-Jato. "É um modelo adotado em mais de 80% dos países", disse.

Torquato não quis comentar a articulação para reeleger os investigados na Lava-Jato, mas defendeu que o prazo é muito curto para discutir a mudança. "A lista é aberta desde 1932. Fechar de repente exige mais discussão e apoio popular", disse. A mudança precisa ser sancionada até 6 de outubro de 2017 para valer em 2018.

O ministro criticou ainda a tese de que a lista fechada promoverá campanhas eleitorais mais baratas e, por isso, seria mais compatível com o fim das doações empresariais e um fundo público para as eleições. "Esse discurso não convence. Pelo contrário, [esse modelo] me parece ossificar ainda mais os partidos", opinou.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, que organizou o seminário, repetiu que o sistema atual está exaurido sem doações de empresas e com a manutenção das coligações. "No nosso sistema hoje vota-se em Tiririca [PR-SP] e elege-se Valdemar da Costa Neto [PR-SP] e Protógenes Queiroz [PCdoB-SP]", afirmou. Para ele, um fundo público no sistema atual será insuficiente mesmo que some R$ 5 bilhões, devido ao grande número de candidato e campanha.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli evitou se posicionar, dizendo que a decisão sobre o sistema é doCongresso, mas fez coro a Gilmar Mendes sobre o atual modelo estar "falido" pela compra de votos, fragmentação política e um presidencialismo de "cooptação". Ele defendeu que a lista fechada pode ser uma transição para o modelo alemão.

Para Miguel Relvas, integrante do Parlamento de Portugal, a lista fechada pode fortalecer a cultura partidária e obrigar os partidos a assumirem "posições firmes", mais ideológicas, mas não acaba com um problema da lista aberta. "Ela não acaba com o personalismo. As pessoas ainda buscam votar em candidatos", disse.

Presidente da comissão da reforma política, o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) disse que a maioria na Câmara sobre o sistema eleitoral é flutuante. "Tinha uma maioria, mas os deputados estão se assustando um pouco e vi vários recuarem, só com a discussão vamos saber", disse.

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Reforma política inverte prioridade, diz Nicolau

Por: Cristian Klein
 

Defensor de alterações incrementais na legislação eleitoral, o cientista político Jairo Nicolau, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que a nova onda em prol de uma ampla reforma política é "temerária". O debate ganhou força na esteira do aprofundamento da Operação Lava-Jato e da proibição de doações de campanha por empresas, mas recebe críticas do especialista. Nicolau reconhece que a reforma política pode ser usada para anistiar o caixa dois - livrando investigados da prisão - ou aumentar a chance de sobrevivência eleitoral de políticos com a imagem desgastada - com a criação da lista fechada - mas destaca como erro de origem o foco no financiamento a nortear as mudanças. "A discussão sobre o sistema eleitoral tem que vir primeiro e separada do financiamento. São questões totalmente diferentes", diz.

Para Nicolau, primeiro seria necessário que se encontrasse o sistema representativo mais adequado - que reduzisse o número de partidos e aproximasse o eleitor de seu representante. "Depois vamos atrás da melhor forma de financiamento, que não é essa", afirma.

O cientista político lembra que a reforma política vem sendo debatida desde 1994 pelo menos e que não obteve consenso mesmo em situações mais favoráveis. "Para colocar qualquer coisa no lugar do atual sistema se exige reflexão mais profunda. Não vai ser agora o melhor momento, num ambiente desse, em que o Congresso perdeu tanta legitimidade e abriga um monte de investigados. Melhor que seja feita na próxima legislatura, que provavelmente terá muita renovação", defende.

Nicolau, que já participou de audiências sobre o tema no Congresso, afirma que desta vez tem percebido os deputados sem orientação, sem uma ideia-força que galvanize o debate, como já foi a lista fechada, em 2007, e o distritão, em 2015. As iniciativas são lideradas por gente de fora, como o presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e o presidente da República Michel Temer. "A ideia-força é apenas como financiar o sistema depois que ele desabou", aponta.

A lista fechada - em que o eleitor vota apenas em partidos - surge então como uma consequência natural já que a proposta de criação de um superfundo estatal não seria compatível com o financiamento de campanhas de candidatos individuais. O esforço central dos políticos, diz, é aumentar o volume de recursos para os gastos de campanha.

Em 2015, o fundo partidário foi triplicado para o atual patamar de R$ 800 milhões, mas ainda está muito aquém da montanha de dinheiro que costumava-se arrecadar com as doações de empresas - muitas das quais empreiteiras encalacradas na Operação Lava-Jato. As campanhas eleitorais em 2014 custaram cerca de R$ 5 bilhões e, por isso, há preocupação da classe política em se cobrir a diferença entre esse valor e o atual fundo partidário, por meio da criação de um superfundo eleitoral. Entre as propostas, algo em torno de R$ 4 bilhões.

Nicolau critica a simples dotação orçamentária de grandes somas de dinheiro dos cofres da União para os partidos. Isso, destaca, não cria incentivos para a doação mais pulverizada dos eleitores, como acontece na Alemanha e no Canadá. Nestes países, há incentivos fiscais, com dedução do imposto de renda, ou "doação casada" na qual o cidadão oferta determinada quantia ao partido e o Estado contribui com o mesmo valor. Em ambos os casos, os partidos precisam se mexer e ir atrás do apoio na sociedade, em vez de se acomodarem com o dinheiro público garantido. "Por que, depois de 70 anos da atual legislação, e a quatro meses de se expirar o prazo para alterações válidas à próxima eleição, vão mudar o sistema? Para viabilizar o financiamento? Aí tudo fica em função disso, desse velho problema", diz.

Nicolau pondera, no entanto, que a lista fechada encontra seus maiores adversários na opinião pública e nos parlamentares que não são da elite partidária e não teriam controle sobre o ordenamento dos nomes da lista. "Os grandes inimigos são os deputados do baixo clero, que morrem de medo de ficar fora das melhores posições da lista", diz.

Em 2007, a lista fechada obteve 182 votos a favor e 251 contra a sua adoção. Em 2015, perdeu muito fôlego e foi derrotada por 402 votos a 21. "Foi um massacre. E estamos na mesma legislatura, são os mesmos deputados. Será um desafio danado aprová-la", lembra Nicolau.

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TRF-2 nega prisão domiciliar para Adriana Ancelmo

Por: Cláudia Schüffner
 

A advogada Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador do Rio, Sergio Cabral, permanecerá presa em regime fechado. Ontem o desembargador Abel Gomes, da 1ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) acatou argumentação do Ministério Público Federal contrária ao benefício da prisão domiciliar, que tinha sido concedida na sexta pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio.

Segundo a assessoria do tribunal, a decisão vale até o julgamento do mérito do processo pelo colegiado da 1ª Turma, que ainda não tem data para ocorrer.

A justificativa para a decisão de Bretas foi a legislação que permite o benefício para mães que têm filhos menores de 12 anos. O casal tem dois filhos, sendo um com 14 e outro com 11 anos.

Os procuradores argumentaram que a prisão domiciliar de Adriana Ancelmo representa "evidente risco à ordem pública, sendo grande a probabilidade de que a mesma continuará na prática de ilícitos e persevere na ocultação do produto dos crimes perpetrados contra a Administração Pública".

Segundo o MPF, a advogada "conta com o apoio de várias outras pessoas, inclusive parentes, com possibilidade de serem acionadas para atrapalhar o curso das várias investigações em curso". Segundo o MPF, foram desviados mais de R$ 300 milhões do esquema de Cabral, e a suposição é de que esse valor seja parte do dinheiro desviado de contratos, pelos quais o ex-governador cobrava 5%.

Hoje serão devolvidos R$ 250 milhões ao governo do Rio de Janeiro. Foram encontrado no exterior, com as investigações sobre o esquema de desvio de recursos liderado pelo ex-governador.

O dinheiro será utilizado para pagar 146 mil aposentados e pensionistas que estão com o 13º salário atrasado. Com isso, 57% da folha para essa categoria será paga, segundo nota do Ministério Público Federal. Os servidores que tiverem vencimentos até R$ 3,2 mil receberão integralmente.

O repasse foi possível com a repatriação de US$ 85,3 milhões que tinham sido depositados pelos doleiros Renato e Marcelo Chebar em contas que pertenciam a Sérgio Cabral, Wilson Carlos (ex-secretário de Governo) e Carlos Miranda, amigo e assessor do ex-governador, que também estão presos.

A devolução do dinheiro será feita em uma cerimônia na sede do TRF2, com a presença do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, do procurador coordenador da Lava-Jato no Rio, Leonardo de Freitas e com o procurador-geral do Estado, Leonardo Espíndola.