Rombo maior

Míriam Leitão 

23/03/2017

 

 

O rombo de R$ 58,2 bilhões é resultado de o governo ter superestimado receitas quando fez o Orçamento. E esse governo disse que não faria isso. Os ministros da área econômica já apontaram também um caminho que durante algum tempo disseram que não iriam trilhar: o aumento de impostos. Devem aumentar alíquotas de PIS, Cofins e IPI.

Anotícia boa é que a equipe econômica está levando a sério o que manda a Lei de Responsabilidade Fiscal que determina que, diante do balanço bimestral de receita e despesa, o governo anuncie o que fará para manter o país no rumo da meta. Nos últimos anos do governo Dilma, a meta era descumprida e isso ia ficando cada vez mais claro a cada balanço bimestral. No fim do ano ,o governo mandava uma nova meta do tamanho do estouro que havia feito e pedia que o Congresso convalidasse. Depois dizia que havia cumprido a meta.

Ao fazer o balanço, no entanto, a equipe econômica postergou decisões. Disse que só anunciará o tamanho do contingenciamento na semana que vem, porque antes precisa esperar o resultado de decisões do STF e STJ sobre uma briga judicial em torno do encerramento das concessões de energia. A Cemig, ainda na época dos governos tucanos, entrou na Justiça para não entregar usinas hidrelétricas com a concessão vencendo. O governo Dilma havia antecipado o fim das concessões. Agora a Justiça está dizendo que o governo tem o direito de relicitar as usinas que forem vencendo.

Muito mais razoável era o governo anunciar o contingenciamento ou até mesmo o aumento de impostos para cobrir o rombo, em vez de dizer que vai esperar a Justiça se pronunciar na terça. Os tempos dos tribunais são outros. E se alguém pedir vista? Depois, se houver boas notícias, decisões favoráveis e novas receitas, basta reverter o contingenciamento.

Se o governo está distante R$ 58 bilhões da meta fiscal para este ano, isso quer dizer que, se nada for feito, o déficit será de R$ 197 bilhões, ao invés dos R$ 139 bilhões previstos na Lei Orçamentária. O quanto será cortado ainda não foi definido, mas já está certo que haverá aumento de impostos. Outro ponto já decidido foi a reoneração da folha de pagamento, com redução de subsídios.

A queda da arrecadação, com um crescimento menor do que se previa, explica parte do problema. Mas o governo Temer também está pagando a conta dos aumentos salariais que concedeu quando tomou posse. Na época, justificou a medida dizendo que os gastos já estavam “acordados”e no “orçamento”. Segundo o economista Fábio Klein, da Tendências Consultoria, as despesas com pessoal e encargos sociais terão aumento de 5,7% este ano, com crescimento real, porque ficará acima da inflação prevista pelo mercado, de 4,3%. Na ponta do lápis, o aumento chegará a R$ 27 bilhões sobre o ano passado. São despesas fixas, que não podem ser reduzidas e engessam ainda mais o Orçamento. A Tendências não acredita que o governo consiga cumprir a meta deste ano, de um déficit de R$ 139 bilhões. Avalia que o rombo será maior, de R$ 148 bi.

— A base de contingenciamento para cortes está muito comprimida, pelos cortes que já foram feitos nos últimos dois anos. A partir de agora, acredito que o ajuste terá que ser feito cada vez mais via aumento de arrecadação — explicou Fábio Klein.

O rombo mostra o quanto estão ruins as contas públicas brasileiras. Um dos caminhos de reverter essa tendência é a reforma da Previdência, mas o governo começou a recuar. O argumento de que era preciso excluir professores e policiais para não interferir na autonomia dos estados não convence o governador Paulo Hartung, do Espírito Santo.

— A regra tem que ser uniforme. A idade mínima tem que ser única no país todo, e a regra sobre aposentadoria de homem e mulher também tem que ser uma só. Pode-se pôr na lei um dispositivo para que as assembleias confirmassem, mas não se pode deixar solto. Mesmo que haja necessidade de tratamento diferenciado para uma categoria, como a dos professores, tem que ser uniforme — diz o governador.

O governo está enfraquecendo a reforma mais importante e está correndo o risco de não cumprir a meta que, é bom sempre lembrar, é de um enorme déficit de R$ 139 bilhões.

 

O globo, n. 30544, 23/03/2017. Economia, p. 22