Thiago Herdy
14/04/2017
Compadre do senador Aécio Neves (PSDB-MG), o dono da rede de academias Bodytech, Alexandre Accioly, foi citado pelo ex-diretor da área de energia da Odebrecht Henrique Valladares como intermediário de vantagens indevidas ao político mineiro. O pagamento teria ocorrido em troca de apoio ao consórcio da Odebrecht com a Andrade Gutierrez no leilão das usinas hidrelétricas Santo Antônio e Jirau. Segundo Valladares, uma das parcelas do pagamento teria sido transferida a uma conta vinculada a Accioly registrada em Cingapura, no Sudeste Asiático.
Valladares e Marcelo Odebrecht relataram que o apoio do senador tucano custou R$ 50 milhões, dos quais R$ 30 milhões teriam ficado sob responsabilidade da Odebrecht e outros R$ 20 milhões da Andrade. A Procuradoria-Geral da República (PGR) não divulgou o número da suposta conta de Accioly, que é padrinho de um dos filhos de Aécio e um de seus amigos mais próximos. Delatores não souberam explicar, também, se o empresário era o beneficiário da conta ou teria participado de uma operação de lavagem de dinheiro (dólar-cabo) envolvendo doleiros em Cingapura e no Brasil.
Em seu depoimento, Valladares relatou ter visitado Aécio, então governador de Minas, no Palácio das Mangabeiras, na companhia de Marcelo, meses antes de um dos leilões, realizado em 2009. Segundo ele, a Odebrecht enfrentava dificuldades para lidar com a oposição de grupos do governo à sua participação no leilão, o que teria levado à mobilização de “forças para atuar em defesa dos nossos interesses em Jirau”.
O encontro foi registrado na agenda de Marcelo como realizado em 17 de março daquele ano. Valladares contou que a conversa com Aécio e Marcelo Odebrecht foi “republicana”, sem que houvesse menção a pagamento de propina.
— Na saída, na despedida, o governador Aécio Neves me disse: “Henrique, o Dimas (Toledo, ex-diretor de Furnas), nosso amigo comum, vai te procurar”. Simplesmente isso. E se despediu de mim — relatou o ex-executivo.
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’CRONOGRAMA DE R$ 30 MILHÕES’
Diretor de Furnas desde 1995, Dimas Toledo sempre foi citado como um dos indicados do PSDB de Minas Gerais para o cargo. Ele deixou o posto em 2005, em meio ao escândalo do mensalão, depois de o ex-deputado Roberto Jefferson denunciar haver um esquema de caixa dois na estatal para abastecer partidos políticos.
Em seu relato, Valladares afirmou ter sido informado por Marcelo, na saída do encontro com Aécio, sobre o compromisso de R$ 50 milhões com o tucano, com a anuência de Sérgio Andrade, acionista da Andrade Gutierrez. O objetivo era “estimular a atuação vigilante do PSDB no Congresso, com vista a assegurar a lisura por parte do governo federal nos processos de Santo Antônio e Jirau”, escreveu Valladares em documento pré-delação.
Depois da visita a Aécio, Dimas Toledo teria procurado Valladares em seu escritório, com um “cronograma de R$ 30 milhões”.
— Na medida em que o projeto ia avançando, ele trazia para mim um pedaço de papel com indicação de nomes e empresas (onde deveriam ser realizados pagamentos). A grande maioria era pagamento no exterior — contou.
Os repasses foram realizados por meio do Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht. Quatro registros do setor anexados ao inquérito mencionam pagamentos em 2010 de R$ 1.050.000,00 para “Mineirinho”, apelido de Aécio.
— Então, (um dia) o Dimas me traz um papelzinho com o nome do (Alexandre) Accioly. Eu sabia que era amigo do governador. Eu me recordo que é em Cingapura a conta. Não é Suíça, não é Bahamas, é Cingapura — contou.
Ontem, Aécio disse que “são totalmente falsas as acusações feitas pelo delator” e que, embora conheça Marcelo Odebrecht há muitos anos, “não se recorda” do encontro citado.
“Apesar de os delatores terem sido unânimes em enfatizar que os pretensos valores mencionados não envolveram nenhum tipo de ato ilícito, inexistindo, portanto, contrapartidas, corrupção ou propina, o fato é que tais doações não ocorreram”, escreveu a assessoria do tucano.
Accioly disse que vai processar Valladares e que “jamais foi titular de recursos de qualquer conta ou estrutura financeira em Cingapura” ou recebeu “depósitos em favor de terceiros em conta alguma no Brasil ou no exterior”. A Andrade Gutierrez informou que não comenta o assunto.
O globo, n. 30566 , 14/04/2017. País, p. 5