Título: Arrocho divide o governo
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 17/01/2012, Economia, p. 10

Guido Mantega quer um superavit mais robusto nas contas públicas, mas seu secretário executivo, Nelson Barbosa, prioriza investimentos

Às vésperas de bater o martelo em torno da política econômica no segundo ano de mandato, o governo aposta as fichas no aumento da arrecadação de impostos para poupar o equivalente a 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB) — e, dessa forma, cumprir a meta de superavit nas contas públicas —, sem sacrificar os investimentos. Esse virou o principal nó a ser desatado pela presidente Dilma Rousseff, que deve definir em até 15 dias o tamanho do corte no Orçamento de 2012. No Palácio do Planalto, há uma clara noção de que o desempenho fraco de 2011, período no qual os investimentos caíram 8,7% em termos reais, não pode ser repetido.

Em contrapartida, há a preocupação de manter o compromisso fiscal, fazendo um arrocho efetivo nos gastos. O controle das despesas será necessário para permitir a continuidade da queda dos juros básicos e facilitar o crescimento da economia.

O incômodo é tanto que Dilma convocou a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, para uma audiência, ontem, antes mesmo de a chefe da pasta retornar ao seu gabinete, após as férias. A intenção da presidente era, ao lado da chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, ponderar as avaliações vindas do Ministério da Fazenda, no qual se estabeleceu uma disputa velada entre o ministro Guido Mantega e o secretário executivo, Nelson Barbosa. Mantega defende o bloqueio entre R$ 60 bilhões e R$ 70 bilhões do Orçamento para cumprir o superavit. O secretário, porém, fala em ampliação dos investimentos, mesmo em detrimento da meta completa — embora publicamente concorde com a economia cheia de 3,1% do PIB.

Interessada em desestimular a divisão, Dilma tenta conciliar a retomada dos investimentos com a meta fiscal. "Uma ação não anula necessariamente a outra. O governo sabe que as obras de infraestrutura sofreram no ano passado, mas a culpa não foi toda do contingenciamento. Se as receitas surpreenderem novamente, dá para fechar a conta mantendo os investimentos, o superavit fiscal e o corte orçamentário", estimou um assessor com trânsito no Palácio do Planalto.

Para os economistas, não será fácil resolver a equação. "É preciso conceder o benefício da dúvida, mas cortar R$ 60 bilhões ou mais do orçamento, cumprir o superavit todo e acelerar o investimento é pouco crível", ponderou Felipe Salto, da consultoria Tendências. Em sua avaliação, algumas receitas extraordinárias, como o pagamento de dividendos das empresas nas quais o governo tem participação ou a incorporação de depósitos judiciais poderiam compensar os gastos com investimentos e a fatura do aumento do salário mínimo.

Nos cálculos de Salto, entretanto, deve prevalecer a lógica de despesas maiores e um saldo nas contas de, no máximo, 2,6% do PIB. "Para Dilma, o problema político será menor dessa forma, porque ela poderia justificar o superavit inferior com mais obras espalhadas pelo país.

Embora seja mais facilmente reconhecida pela população, no entanto, essa postura atrapalhará o Banco Central no corte juros", comentou. A legislação permite que o governo desconte os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e, ainda assim, a meta é considerada cumprida.

Em consonância com Mantega, o BC pressiona o governo para um corte expressivo no Orçamento e um controle maior nos gastos, como forma de manter os juros reais em um nível mais baixo por um período longo. Em um estudo publicado em dezembro, o órgão deixou claro que a redução no ritmo de expansão das despesas é mais eficiente no controle da inflação do que o ajuste feito com base no aumento da arrecadação.

Técnicos da Fazenda argumentam que as despesas com pessoal em 2011 cresceram menos do que o PIB. "Não podemos esquecer que o controle está sendo feito e muito menos ignorar que dois anos de gastos menores com pessoal vão fazer diferença no resultado fiscal", destacou um deles.

Injeção Embora aumente o peso da folha de pagamento, o reajuste de mais de 14% do salário mínimo está sendo encarado pelo governo como uma mola propulsora da atividade no início de 2012. Depois da estagnação da economia no terceiro trimestre de 2011, essa é uma das apostas para a retomada do crescimento. "Há o efeito negativo nos gastos da máquina, mas também uma consequência positiva, que vai ajudar na recuperação neste trimestre", comentou um assessor da Fazenda. A estimativa é de que R$ 63 bilhões sejam injetados no mercado consumidor com o ajuste do mínimo.