Marcelo cobrava Mantega por MP ‘desarrumada’

Amanda Almeida 

15/04/2017

 

 

Odebrecht diz que texto ‘dúbio’ gerava mais pagamentos a congressistas

Ao falar sobre suas negociações com o Congresso, o empresário Marcelo Odebrecht relatou em sua delação premiada que chegou a alertar Guido Mantega, então ministro da Fazenda, que estava tendo “custos” para conseguir a aprovação de medidas pois elas não estariam sendo feitas pelo governo exatamente como esperava a construtora. Questionado pelo procurador se esses “custos” eram descontados de algum repasse a Mantega, o empresário respondeu que só falou sobre o assunto com o ex-ministro para que ele não se sentisse “supervalorizado” por ter ajudado a empresa ao enviar medidas provisórias que a beneficiavam.

“Em algumas medidas, as coisas saíam da Fazenda meio desarrumadas, meio dúbias, que podiam gerar questão. No Congresso, você ajustava. Quando você pedia isso aí, o deputado ou o senador criava expectativa”, diz, completando que avisou o ministro.

“Cheguei para o Guido e falei: teve custo. É uma forma também de dizer: você não fez tudo que devia fazer. Então, deixou problema. É mais uma negociação minha para ele não supervalorizar o que ele fez para a gente”, relatou.

Em depoimento, Marcelo Odebrecht detalha suposto pagamento de R$ 100 milhões para a campanha de 2014 da ex-presidente Dilma Rousseff a pedido do então ministro Mantega. O pagamento teria sido combinado com a aprovação da Medida Provisória 613, que ajudou a Braskem, uma empresa do grupo da construtora.

“EXPECTATIVA”

Com medo do apetite de deputados e senadores nas campanhas, Marcelo Odebrecht revelou que já calculava quanto desembolsaria a eles em troca da aprovação de medidas provisórias durante a tramitação delas, antes mesmo do período eleitoral. O empresário disse que orientava o diretor da construtora responsável pelas tentativas com parlamentares, Cláudio Melo Filho, que já contasse com a “expectativa” dos políticos e acertasse internamente os valores que seriam pagos pelos “negócios”.

— Mesmo que o compromisso que o Cláudio mencionava não tivesse sido acertado explicitamente ou na hora, é óbvio que, se um deputado ou senador atuou a favor de determinada medida provisória, mesmo que ele não tenha dito que demandaria recurso por conta daquela medida, ele criou expectativa. E lá na frente (nas eleições), ele ia cobrar — relata o delator.

Nesse trecho da delação, Marcelo diz que orientava o diretor a ter cuidado nas conversas com os parlamentares.

 

O globo, n. 30567, 15/04/2017. País, p. 4