Ainda há tempo para evitar intervenção na Oi, diz secretário

Daniel Rittner

05/04/2017

 

 

Ainda há tempo para um acordo entre controladores e credores da Oi, avisa o homem em Brasília responsável por acompanhar cada capítulo da crise financeira vivida pela maior operadora de telefonia do país. Por isso, a intervenção do governo não é um mecanismo para ser usado imediatamente. "Ela é um evento hipotético. O instrumento deve estar pronto e implementável, mas é hipotético", disse o secretário de telecomunicações, André Borges, em entrevista ao Valor.

Designado pelo ministro Gilberto Kassab (Ciência, Tecnologia, Comunicações e Inovações) para acompanhar o assunto, Borges compara a recuperação judicial a uma partida de futebol para ilustrar que um entendimento é possível. "Dificilmente um processo de tamanha relevância se define aos cinco minutos do primeiro tempo. Geralmente, é decidido na prorrogação", diz.

E, no meio do tiroteio entre os "bondholders" (detentores de títulos da dívida) e o empresário Nelson Tanure (segundo maior acionista da Oi), em que momento do jogo estamos agora? "Eu diria que estamos caminhando para a metade do segundo tempo."

O secretário admite que "talvez" falte uma maior conversão das dívidas em ações dos credores na operadora, mas minimiza a demora no processo. "Da parte da companhia, poderia haver maior atenção à interatividade com os credores, que se ressentem de uma falta de comunicação ou do modus operandi com o qual estão habituados", afirma Borges, que já atuou na Oi como diretor de regulamentação e estratégia (2012-2013). "Os trâmites e os prazos da recuperação judicial são passíveis de tensão. Isso acontece normalmente. A questão é que nunca tivemos um processo desse vulto no Brasil."

Em sua visão, o aceno feito pelo empresário Nelson Tanure - que tem 7,7% das ações com direito a voto na Oi e promete trazer US$ 2 bilhões de investidores externos após a aprovação do plano em assembleia de credores - não deve ser vista como menos crível do que outras promessas, como a do egípcio Naguib Sawiris ou do fundo Cerberus. "Honestamente não fiz a verificação de nada. Só sei que são pessoas capazes de realizar os negócios prometidos. Não tenho motivos para acreditar piamente nem para duvidar de ninguém", afirma.

Para ele, no entanto, não haverá dinheiro novo sem um sinal verde ao plano de recuperação judicial. "É uma questão de fechar a equação financeira e tocar o negócio para frente", ressalta.

Borges procura dissociar a medida provisória que deve ser publicada nesta semana de uma intervenção na operadora. "Ela é importante não só para uma intervenção, porque esclarece papéis e prerrogativas, mas também porque permite uma solução para negociar a dívida. Ela permite as duas coisas. Se tudo der errado, um instrumento eficaz de intervenção. Mas, por outro lado, permite que as coisas deem certo e sem favorecimento a ninguém."

Falta consenso ainda em torno das multas aplicadas pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) à Oi que já subiram da esfera administrativa para a Advocacia Geral da União (AGU) e se transformaram em crédito constituído do governo federal.

Parece uma discussão meramente burocrática, mas trata-se de um encaminhamento decisivo para o futuro da recuperação judicial. Dos pouco mais de R$ 20 bilhões em multas da agência, quase R$ 7 bilhões estão nas mãos da AGU, que hoje é obrigada por lei a cobrar essa dívida. O máximo que os advogados da União podem fazer é parcelar esse débito da companhia em cinco anos, com a incidência da taxa Selic.

Borges faz uma defesa veemente da transformação dos créditos constituídos da União em obrigações de investimentos na rede de telefonia e de banda larga da Oi. Para ele, essas multas podem voltar à Anatel e ser transformadas em um termo de ajustamento de conduta, semelhante ao TAC que foi firmado entre a agência reguladora e a empresa.

Outras fontes graduadas ouvidas pelo Valor afirmam que a solução aventada pelo secretário enfrenta um empecilho de ordem prática: cria precedente perigoso para que empresas de qualquer outro ramo de atividade econômica também queiram converter suas dívidas em obrigações de investimentos. Por isso, uma das minutas da MP previa apenas um alongamento da cobrança de cinco para dez anos.

Borges expôs as divergências em torno da questão. "Por isso ela [a MP] ainda não foi editada", observa. Ele argumenta que esse é um componente essencial para que o plano de recuperação seja bem sucedido. "É uma flexibilização absolutamente necessária para o sucesso do plano. Não podemos deixar um negócio bom, lucrativo e sustentável quebrar. É melhor adequar a regra", afirma.

Mas isso não gera um precedente importante? "Gera e tem que ser feita a devida análise de impacto nos demais setores. Entendemos que isso tem um impacto maior e geral sobre outras atividades da economia. Mas, sem qualquer estudo mais aprofundado, não me lembro de nenhum outro setor com um quadro tão grave de multas e débitos como ocorre com as telecomunicações", diz Borges. Por isso, ele é taxativo: "Acho que é uma situação diferenciada e bastante exagerada em relação aos demais setores. Se essa premissa é verdadeira, o precedente é necessário porque é algo que previne uma falência. Por conta de uma inflexibilidade, de uma limitação, vamos acarretar a falência?", questiona.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4229, 05/04/2017. Empresas, p. B6.