Título: Desconfiança põe fundo em xeque na UE
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Fonte: Correio Braziliense, 17/01/2012, Opinião, p. 14

O rebaixamento da qualidade dos títulos da França não surpreendeu os analistas. Há menos de três meses a notícia foi aventada, mas só se concretizou na sexta-feira última. A segunda economia da Zona do Euro perdeu o triplo A — classificação que a considerava acima de qualquer calote. A Áustria caiu junto. Itália, Espanha e Portugal desceram de patamar.

A queda não abala só o prestígio do presidente Nicolas Sarkozy, que está em plena campanha para a reeleição. Ao ser informado do risco, ele teria dito: "Se nos tiram o triplo A, estou morto". Abala também o país e o bloco. Um dos impactos: o aumento dos juros cobrados na rolagem e na emissão de títulos de dívidas francesas.

Crédito mais caro agrava o deficit público nacional e obriga os bancos credores a aumentar a capitalização. Há também a ameaça de investidores mais exigentes recusarem papéis que apresentem vislumbres de não serem honrados. Mais: no mesmo dia do anúncio, interromperam-se negociações entre o governo grego e banqueiros sobre a redução da dívida de Atenas.

O dominó começou em agosto. Os Estados Unidos caíram na avaliação da Standard & Poor"s (S&P). Em meio a crise que muitos comparam à de 1929, uma das mais importantes agências de classificação de risco do mundo retirou o triplo A da maior potência do planeta. A medida acendeu a luz vermelha na União Europeia.

Países que pareciam ilhas de prosperidade não resistiram aos tremores da economia americana. O Velho Continente se contagiou. As primeiras vítimas foram nações com o Produto Interno Bruto (PIB) menos substantivo no total dos membros do clube do euro. Portugal, Irlanda e Grécia sobressaíram na incapacidade de honrar as dívidas. Atrás, PIBs maiores — Espanha e Itália.

Sem liderança capaz de aglutinar os interesses particulares em torno de uma causa comum, as duas mais fortes economias do bloco — Alemanha e França — tomaram a frente das articulações. Depois de muitas idas e vindas, vislumbraram-se tímidos sinais de estabilização.

Agora, embora Sarkozy afirme que nada muda, o cenário ficará mais sombrio. A França, depois da Alemanha, é a maior fiadora do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, criado para socorrer os governos da Zona do Euro impossibilitados de fazer frente aos fluxos de pagamento. É razoável supor que a perda de crédito de Paris contagie o fundo. E torne mais difícil ainda a normalização das finanças públicas europeias.