Valor econômico, v. 17, n. 4225, 30/03/2017. Política, p. A12

Operação da PF atinge Picciani e paralisa TCE

 

Cláudia Schüffner
Cristian Klein
Rodrigo Carro
Murillo Camarotto
André Guilherme Vieira
 
 

Em uma investigação batizada de "O Quinto do Ouro", a Polícia Federal (PF) prendeu ontem quatro conselheiros e o presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ). Foram alvo de prisão preventiva o atual presidente do tribunal, Aloysio Neves Guedes; o vice-presidente Domingos Brazão; e os conselheiros José Gomes Graciosa; José Maurício de Lima Nolasco; e Marco Antônio Alencar (ex-secretário de Fazenda do Rio e filho do antigo governador Marcelo Alencar, falecido em 2014).

O presidente da Assembleia Legislativa do Rio, Jorge Picciani (PMDB), também foi conduzido coercitivamente para prestar depoimento na sede da PF. Ele é pai do ministro dos Esportes Leonardo Picciani. As suspeitas de desvio de dinheiro público se referem aos períodos em que Sergio Cabral (PMDB) governou o Estado. Cabral está preso e é réu em seis ações penais por corrupção.

Um conselheiro que está afastado, Jonas Lopes, que junto com o filho Jonas Lopes Junior, foi alvo de condução coercitiva em dezembro do ano passado está fazendo delação premiada e teria sido decisivo para a Operação de ontem ser desencadeada. Lopes é investigado por suspeita de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Segundo esta fonte, Lopes decidiu colaborar depois de perceber que poderia ser preso a partir de provas entregues aos investigadores por outro delator, Leandro Azevedo, ex-diretor da Odebrecht no Rio.

Dos presos, Aloysio Guedes é próximo tanto de Cabral quanto de Picciani. Estava na famosa foto de autoridades do governo fluminense confraternizando com o empreiteiro Fernando Cavendish, dono da construtora Delta, tirada em Paris em 2009. Guedes foi preso em 1983, acusado de tráfico de drogas. Alegou, na época, ter sido vítima de flagrante forjado, Condenado em primeira instância, foi absolvido pela 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio.

Mais novo integrante do TCE, Domingos Brazão assumiu em abril de 2015, indicado pelo governador, Luiz Fernando Pezão. Foi vereador e deputado estadual em três mandatos consecutivos a partir de 2006. Em 2010 teve o mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, mas graças a uma liminar do ministro Ri-cardo Lewandowski foi reeleito.

José Gomes Graciosa chegou ao TCE em 1997 e presidiu o tribunal entre 2001 e 2006. Iniciou a carreira política na cidade de Valença (RJ) na década de 80. Foi eleito duas vezes deputado estadual. Outro conselheiro preso, José Maurício Nolasco presidiu a Cedae e o TCE duas vezes. Foi citado em delação de executivos da Andrade Gutierrez.

A operação de ontem criou um vácuo de poder no principal órgão de controle do Executivo. O TCE-RJ agora não tem quórum para se reunir. A corregedora Marianna Montebello Willeman, única conselheira que não foi presa, estudava com a Procuradoria Geral do Tribunal (PGT) forma de alterar o regulamento. O atual regimento interno não prevê a substituição de todos os conselheiros em caso de vacância do cargo.

O TCE-RJ tem três conselheiros substitutos e um deles, Rodrigo Nascimento, já está ocupando o lugar vago de Jonas Lopes. Os outros dois substitutos são Marcelo Verdini Maia e Andrea Siqueira Martins. Ontem a assessoria de Marianna Willeman divulgou nota informando a suspensão da plenária prevista para hoje.Na próxima semana o governo estadual deve enviar as contas de 2016 para aprovação do tribunal, que começarão a ser analisadas pelo corpo instrutivo.

A operação de ontem teve participação de 150 policiais federais e foi determinada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), já que integrantes de tribunais de contas estaduais e de assembleias legislativas têm privilégio de foro.

No caso da Operação "O Quinto do Ouro", o relator do inquérito judicial que tramita no STJ é o ministro Felix Fischer, que autorizou a condução coercitiva do presidente da Assembleia Legislativa e as prisões preventivas dos cinco conselheiros do TCE-RJ. O próprio nome da operação é sugestivo.

Segundo a PF, faz referência à figura histórica do "Quinto da Coroa", imposto correspondente a 20% que a Coroa Portuguesa cobrava dos mineradores durante período colonial e que apesar da intensa fiscalização para cobrança dos quintos, o imposto era desviado.

No caso do Rio, o que se sabe até agora é que agentes públicos teriam recebido valores indevidos para viabilizar a utilização do fundo especial do TCE-RJ para pagamentos de contratos do ramo alimentício em atraso com o Poder Executivo do Estado do Rio de Janeiro, recebendo para tal uma porcentagem por contrato faturado.

Ontem foram cumpridos 43 mandados, sendo 17 de condução coercitiva a maioria na cidade do Rio de Janeiro. A "Quinto de Ouro" é um desdobramento da Lava-Jato e é a primeira operação ostensiva deflagrada no âmbito do STJ.