As contas do governo central registraram em fevereiro o seu pior resultado para o mês da história: um déficit primário de R$ 26,26 bilhões. No acumulado dos dois primeiros meses do ano, o déficit foi o segundo maior da série, mesmo com o governo segurando fortemente os gastos, que, no período, tiveram queda nominal de 3,2%.
A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, avaliou que a contenção de gastos em curso é importante para garantir o cumprimento não só do teto de gastos, mas também da meta para o ano, de déficit de R$ 139 bilhões, que ela classificou de "arrojada".
"A meta é a necessária para a gente sinalizar esse esforço. O Brasil tem pressa. O Brasil precisa voltar a crescer. O Brasil precisa recuperar a confiança porque precisa reativar investimentos. Essa reativação da economia vai ajudar no cumprimento das próximas metas fiscais, dos próximos orçamentos e isso vai também ser muito importante para melhorar a condição das famílias e das empresas, todas inseridas nessa crise", disse.
Ela garantiu que o resultado em 12 meses, que ficou em R$ 151,31 bilhões, vai convergir para o alvo fixado para o ano, o que ela considera essencial para a retomada da confiança, a queda dos juros e a volta do crescimento econômico. Ela rebateu a tese de que a forte contenção de despesas em curso no primeiro bimestre poderia prejudicar a retomada da economia e defendeu que esse esforço deixa o Estado "mais leve" e evita uma sobrecarga de impostos.
A secretária reconheceu que o contingenciamento de R$ 42,1 bilhões no Orçamento, divulgado na noite de quarta-feira, é "duro, de fato". Mas salientou que há não apenas um esforço para reduzir o tamanho desse corte ao longo do ano, mas também medidas de gestão dentro do governo federal para permitir a reorganização de sua estrutura de gastos dentro da nova realidade fiscal. "Estamos num ambiente de contenção de despesas, mas precisamos aprimorá-lo".
Em meio à força-tarefa do governo Michel Temer para aprovar a alteração nas regras de aposentadoria, Ana Paula destacou que o déficit primário acumulado no primeiro bimestre reflete o aprofundamento do saldo negativo da Previdência. Enquanto o Tesouro Nacional foi superavitário em R$ 19,76 bilhões no período, a Previdência Social (RGPS) ficou negativa em R$ 26,92 bilhões.
O Tesouro projetou que, somadas, as previdências do setor público e privado devem encerrar o ano com déficit de R$ 274 bilhões. "O Brasil tem acelerada transição demográfica e isso nos traz enormes desafios. Precisamos atualizar as regras previdenciárias a essa tendência", acrescentou.
Enquanto as despesas obrigatórias sobem, o Tesouro segurou fortemente as despesas que consegue controlar. Os dados mostraram que os investimentos do governo central totalizaram R$ 1,77 bilhão em fevereiro, menos da metade dos R$ 4,290 bilhões de igual período do ano anterior. No primeiro bimestre de 2017, os investimentos foram de R$ 2,97 bilhões, com recuo de 69%.
Ana Paula afirmou que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) terá de ser redimensionado para a nova realidade do corte de R$ 10,5 bilhões em seu Orçamento. "Estamos no limite da nossa contenção de gastos", disse, explicando que, por isso, o governo buscou medidas como a reoneração da folha de pagamentos.
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Ribamar Oliveira
Com o contingenciamento de R$ 42,1 bilhões nas dotações orçamentárias deste ano, anunciado ontem pelo governo, a despesa primária total da União deste ano (exclui o pagamento de juros das dívidas) ficará 0,65 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) abaixo daquela executada em 2016, segundo cálculo divulgado nesta quinta-feira pelo Tesouro Nacional. Haverá, portanto, uma forte contração fiscal.
Esse dado mostra que estavam erradas as previsões de que a despesa teria um crescimento real neste ano, pois o limite para o gasto incluído no Orçamento foi a despesa de 2016 corrigida em 7,2%. Como a inflação está em queda, o percentual de correção utilizado para o cálculo do teto do gasto resultaria em aumento real.
Não foi levada em consideração nas análises iniciais o fato de que, além de ser obrigado a observar o teto do gasto, o governo precisa cumprir também a meta fiscal estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que, para 2017, é um déficit de R$ 139 bilhões para o governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central).
Como a receita federal não terá a trajetória inicialmente prevista, que permitiria a realização dos gastos orçados, o governo está sendo obrigado a reduzir as despesas drasticamente para obter a meta fiscal. Essa realidade poderá mudar se, durante o exercício, a área econômica conseguir receitas adicionais que permitam a redução do contingenciamento.
Os números das contas da União divulgados pelo Tesouro mostram uma forte redução da despesa primária total. Nos dois primeiros meses deste ano, o gasto total caiu 7,9% em termos reais, na comparação com igual período do ano passado. Houve até mesmo queda nominal, de 3,2%.
Uma análise mais atenta dos números mostra que as despesas obrigatórias continuam crescendo em ritmo acelerado, muito acima da expansão da economia. Para compensar isso e obter um resultado primário compatível com a meta fiscal deste ano, o governo está cortando de forma drástica os investimentos públicos e outras despesas sobre as quais tem autonomia legal. Essa redução foi necessária para evitar um déficit primário ainda maior no primeiro bimestre.
Nos dois primeiros meses deste ano, a despesa com benefícios previdenciários aumentou 6% em termos reais, na comparação com o mesmo período do ano passado. A elevação real dos gastos com pessoal foi ainda maior, 7%, enquanto a despesa com os benefícios da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) subiu 4,7%. Entre as obrigatórias, apenas a despesa com abono e seguro desemprego caiu: 21,2%, mais por conta da concentração de pagamentos nos primeiros meses de 2016.
O pagamento dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi reduzido em 73,5% nos dois primeiros meses deste ano, em termo reais, na comparação com o mesmo período do ano passado, enquanto o gasto com o programa Minha Casa, Minha Vida foi reduzido em 87,8%. Outros gastos discricionários também foram cortados.
Esse processo de corte dos investimentos, que sempre foi a variável de ajuste fiscal, deverá continuar nos próximos meses, admitiu hoje a secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi. Mesmo porque as receitas serão mais baixas do que o previsto inicialmente. "O esforço de contenção será muito forte e inevitável", disse. "Os investimentos terão a mesma perspectiva das outras despesas discricionárias", acrescentou. A secretária disse que todos os órgãos públicos devem se preparar para enfrentar essa nova realidade.