Valor econômico, v. 17, n. 4226, 31/03/2017. Política, p. A6

Por 2018, Renan articula aliança com Lula e rompimento com o governo

 

Vandson Lima
Fabio Murakawa
 
 
Não é por cargos e nem por discordâncias sobre terceirização ou mudanças na aposentadoria que o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), tem se tornado cada vez mais crítico ao governo do presidente Michel Temer. Pragmático, às voltas com a Operação Lava-Jato e preocupado com a reeleição do filho no comando de Alagoas, Renan resolveu iniciar um movimento de desembarque da base aliada para apostar suas fichas em uma aliança com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2018.

Lideranças de PMDB, PSDB e PP ouvidos pelo Valor já estão cientes e o presidente Michel Temer, asseguram, também: Renan, que nunca cortou laços com Lula, aposta que a economia não dará sinais robustos de recuperação até 2018 e que as reformas vão minar a popularidade de seus defensores.

Nesse cenário, na hipótese de o ex-presidente ter condições legais de concorrer à Presidência da República novamente, Renan enxerga na formação de um palanque com Lula as condições ideais para a reeleição de Renan Filho (PMDB) no governo de Alagoas, onde o ex-presidente continua muito popular.

Uma pesquisa à qual Renan teve acesso fez com que ele se decidisse por este caminho. No Estado, Lula teria 53% de aprovação e Temer, 7%. O grupo político do senador e de seu filho foi derrotado nas principais cidades de Alagoas em 2016 por adversários de PSDB e PP, que agora ameaçam o PMDB nas disputas majoritárias em 2018. O caso do próprio Senado, de acordo com a sondagem, é emblemática: há pelo menos seis outros possíveis postulantes às duas vagas do Senado. Ronaldo Lessa (PDT), Teotônio Vilela Filho (PSDB), o atual senador Benedito Lira (PP), os ministros Maurício Quintella (PR, Transportes), Marx Beltrão (PMDB, Turismo) e até Heloísa Helena. Todos em condições melhores que Renan, cuja impopularidade teria batido os 73%, de acordo com fontes que tiveram acesso à pesquisa. Dadas as condições, o senador já estaria até vislumbrando uma candidatura a deputado federal.

Segundo dirigentes petistas de Alagoas, a articulação é vista com naturalidade. Fontes do PT local reiteram que Renan jamais rompeu pontes com eles. "Renan é um animal político que trabalha constantemente com pesquisas. E a informação que temos é que Lula subiu muito em Alagoas", conta um deputado. "Se Renan pular do 10º andar de um prédio, pode pular atrás porque lá embaixo é água".

No Senado, petistas lembram que, no impeachment, Renan foi decisivo para que a ex-presidente Dilma Rousseff mantivesse seus direitos políticos, apesar de cassação do mandato. O gesto foi visto como uma mostra de lealdade.

Tudo somado, Renan passou a ser desde já um crítico contumaz do governo, como forma de já ir moldando um discurso que lhe dê "coerência" mais à frente. Para além da discordância com medidas de impacto econômico, Renan acusou recentemente o governo de Temer de atender indicações feitas pelo ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, condenado ontem a 15 anos de prisão, diretamente da cadeia: a nomeação de Osmar Serraglio para o Ministério da Justiça e do Subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha Vale, são usados por Renan como exemplos.

Um embate nesse sentido ocorrerá nos próximos dias: Vale foi indicado à recondução como membro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Renan tem feito intensa campanha contra o suposto aliado de Cunha. "Suposto não. Ele mantém relações com Eduardo Cunha, eu sei disso", rebate, quando questionado.

A estratégia de Renan é considerada por senadores próximos "de alto risco" e já produz ruídos. Ele "forçou a mão", dizem, para que a bancada do PMDB chancelasse uma nota contrária ao projeto de terceirização. Obteve oito apoios entre 22 pemedebistas. Alguns, no entanto, foram depois ao Palácio do Planalto se explicar.

Se levar a cabo a articulação, lembram ainda, Renan colocará em xeque o comando de ministérios que influenciou as indicações, como Turismo e Hélder Barbalho na Integração Nacional. E também a disposição do governo para encaminhar recursos para Alagoas.

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Planalto negocia acúmulo de benefícios

 
Edna Simão
 
 
O governo já ensaia um novo recuo na reforma da Previdência Social ao considerar a possibilidade de permitir a acumulação de pensão com aposentadoria até um determinado valor, conforme foi proposto pelo PSDB.

A avaliação da equipe técnica, no entanto, é que esse teto deveria ser inferior ao do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), atualmente de R$ 5.531,31. Os tucanos propuseram que fosse permitida a acumulação até o limite do INSS. O governo defende a vedação completa do recebimento dos dois benefícios, mas sabe que a resistência é grande.

Além de amenizar esse ponto, também está sendo negociada a possibilidade de os trabalhadores rurais se aposentarem cinco anos mais cedo do que será exigido dos demais brasileiros. Com isso, a idade de aposentadoria dos rurais seria de 60 anos tanto para homens quanto para mulheres.

A proposta de reforma do governo estabelece uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos para homens e mulheres e a unificação das regras para trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos federais.

Segundo um técnico do governo ouvido pelo Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, a ideia de manter o tratamento diferenciado para o trabalhador rural é do relator da PEC 287, deputado Arthur Maia (PPS-BA). Maia evita falar sobre o teor de seu relatório, que deverá ser apresentado na próxima sexta-feira, para não atrapalhar as negociações com as bancadas partidárias.

Apesar de não adiantar detalhes do parecer, o relator terá que resolver várias concessões feitas pelo governo. No caso dos servidores de Estados e municípios, que foram retirados da proposta, Maia deverá estabelecer o prazo de seis meses para que esses entes aprovem em suas assembleias mudanças na concessão de aposentadoria. Se não conseguirem, terão que seguir as regras aprovadas pelo Congresso Nacional.

Sobre a fórmula de cálculo das aposentadorias, o relator dará a palavra final de como será feito. A intenção do governo é manter a regra de utilização de 80% das maiores contribuições. Segundo técnico da área econômica, essa sempre foi a intenção. A interpretação geral da PEC, no entanto, foi que seria utilizada a média simples de todas as contribuições. "Sempre pensamos em 80%, mas a interpretação foi de 100%, o que foi reforçado pelo erro no material divulgado", explicou uma fonte ouvida pelo Valor PRO. Apesar da declaração do técnico, em dezembro, o secretário de Previdência Social, Marcelo Caetano, havia dito que seria utilizada todas as contribuições feitas ao longo de 25 anos no cálculo da aposentadoria.

Ontem, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, participou de audiência pública de Comissão Especial para defender a proposta do governo de reforma. A audiência foi marcada por bate boca dos parlamentares da situação e oposição.

Em seu discurso como o relator da proposta, Arthur Maia afirmou que o PT não teve coragem de enviar ao Congresso uma proposta de mudanças nas regras de aposentadoria por "populismo". O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) se revoltou, pediu a palavra e disse que Maia atacou o PT sem ter "autoridade política e moral", chamando-o de "caloteiro" da previdência. O relator não se conteve e chamou Chinaglia de "vagabundo". Este por sua vez chamou o colega de parlamento de "safado" e recebeu as mesmas palavras de volta.

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Governadores do NE querem fatia de receitas de contribuições sociais

 
Marta Watanabe
 
 
Em reunião em Fortaleza na quarta-feira, sete governadores do Nordeste decidiram levar ao presidente Michel Temer uma carta na qual pedem mudança na proposta de reforma previdenciária e também o compartilhamento dos recursos de arrecadação de contribuições sociais como PIS, Cofins e CSLL. O Estados querem 17,5% dessa arrecadação.

A proposta, diz o secretário de Tributação do Rio Grande do Norte, André Horta, que participou da reunião, é de "recuperação do federalismo fiscal", e a previdência dos Estados é um das bases para isso. Os recursos compartilhados com Estados das contribuições sociais renderiam cerca de R$ 70 bilhões e devem ir para um fundo federativo de previdência estadual com o objetivo de "fortalecer a previdência" nos governos regionais.

A proposta de repasse das contribuições sociais, diz Horta, foi aprovada pelo Consefaz, que reúne os secretários de Fazenda dos Estados. Essa proposta inclui a criação de um "fundo solidário" para a parte dos recursos do fundo estadual que excederem os déficits de cada Estado.

Pela proposta do Consefaz, os R$ 70 bilhões compartilhados em contribuições sociais poderiam ser recompostos com a reversão de desonerações. Além da desoneração de folha já anunciada na quarta-feira, o conselho sugere benefícios relativos ao Simples Nacional e às entidades filantrópicas.

Os Estados nordestinos, diz Horta, apoiam a reforma previdenciária, mas não o texto proposto pelo governo federal. Segundo o secretário, os governadores do Nordeste querem debater uma reforma que preserve os direitos da população rural e de menor renda.

Outro pleito da carta dos governadores do Nordeste é por um solução ao alongamento da dívida dos Estados com o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico Social (BNDES). Esse alongamento, que resulta em redução das parcelas vincendas da dívida, foi contemplado no acordo sobre a dívida com a União, mas os Estados, diz Horta, não estão conseguindo efetivar os descontos. O assunto necessitaria de uma regulamentação para valer na prática.

Segundo Horta, dos nove governadores do Nordeste, só não estavam na reunião de quarta-feira os do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), e da Bahia, Rui Costa (PT). Horta diz que, apesar da ausência, eles apoiam as deliberações. O movimento é liderado por Robinson Faria (PSD, do Rio Grande do Norte) e Wellington Dias (PT, do Piauí). A carta deve ser encaminhada pelo governador do Ceará, Camilo Santana (PT).