Planalto e relator negociam apoio para reforma da Previdência 

Geralda Doca 

05/04/2017

 

 

Estratégia prevê adiar relatório para garantir margem de aprovação

-BRASÍLIA- Diante da persistência das dificuldades em ganhar apoio para a reforma da Previdência no Congresso e do medo dos parlamentares em aprovar medidas polêmicas às vésperas das eleições de 2018, o Palácio do Planalto decidiu atrasar um pouco mais a tramitação da proposta. Numa estratégia coordenada pela Casa Civil, os líderes dos partidos começaram no início desta semana a contar os votos da base aliada, e o relator, deputado Arthur Maia (PPS-BA) foi orientado a só apresentar o parecer depois de ouvir todas as bancadas novamente e pontuar os principais pontos de resistência. O objetivo é fechar um texto que seja consenso, inclusive com os senadores.

Com isso, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287 somente chegará ao plenário da Câmara em maio, e não mais neste mês, conforme se previa anteriormente.

META É OBTER APOIO DE 85%

Reservadamente, fontes do governo admitem que está em curso um processo intenso de negociação da Casa Civil com os parlamentares da base — o que inclui liberação de emendas e nomeações em cargos em troca de apoio à reforma. Porém, não há detalhes ou definição, por enquanto, sobre como esse processo se daria, uma vez que os pleitos de cada um serão colocados nessa nova rodada de debates com as bancadas. A meta do Palácio do Planalto, para ter um certo conforto, é conseguir 85% dos 411 votos das bancadas, ou cerca de 350 adesões. Ainda assim, isso seria uma margem apertada. São necessários 308 votos em dois turnos para aprovar na Câmara as mudanças no regime de aposentadoria.

O presidente da comissão especial da Câmara que trata da reforma da Previdência, deputado Carlos Marun (PMDB-MS), disse ao GLOBO que é possível que Arthur Maia entregue o relatório depois do feriado da Páscoa, portanto, na terceira semana do mês. Na última segunda-feira, Arthur Maia disse que a previsão era entregar o relatório na próxima quarta-feira, dia 12. Mas ele admitiu que o prazo para discutir a reforma novamente com as bancadas é curto, porque só pode fazer isso em dois dias na semana, terça e quarta-feira.

Marun confirmou que o governo fará concessões ao texto original para facilitar a aprovação da reforma. Ele afirmou, no entanto, que a essência da PEC será mantida para assegurar seus efeitos nas contas públicas.

— Não haverá grandes modificações. Vamos fazer adequações com a incorporação de algumas sugestões dos deputados e senadores — afirmou o deputado.

AJUSTE NA REGRA DE TRANSIÇÃO

Ele destacou que serão feitos ajustes para os trabalhadores rurais, nos benefícios assistenciais (pago a idosos e deficientes da baixa renda), na regra de transição e nas aposentadorias especiais (policiais federais), além da vedação ao acúmulo de benefícios (pensão e aposentadoria). Segundo Marun, há consenso na fixação de idade mínima de 65 anos para homens e mulheres.

Apesar do atraso da tramitação da PEC na comissão especial, o Planalto mantém a previsão de aprovar a reforma até o fim do semestre legislativo, em julho.

A avaliação de fontes do governo envolvidas no assunto é que os lobbies de algumas categorias, como policiais e magistrados, já não preocupam mais. O presidente Michel Temer já anunciou a retirada dos servidores estaduais e municipais das mudanças, pelo menos temporariamente, lembram os deputados. A ideia é que se governadores e prefeitos não aprovarem as mudanças em seus regimes em seis meses, valerá a legislação federal.

— O governo vê essas reivindicações de forma respeitosa, mas não vai ceder — disse uma fonte, citando sobretudo membros do Judiciário (magistrados) e do Ministério Público.

O caso do líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros, é emblemático: ele critica, em todos os meios de comunicação, as propostas que deveria estar defendendo na Casa, como a reforma previdenciária e a terceirização. Sabe-se que Renan tem por objetivo se reeleger em seu estado (AL) e a saída é atacar as reformas propostas pelo Executivo. Porém, há temor de que as investidas de Renan contaminem a base e, por isso, o Planalto vai continuar insistindo numa trégua com o senador.

— Não desistimos do Renan — comentou outra fonte governista.

A orientação do Planalto é buscar apoio de outros senadores. O secretário de Previdência, Marcelo Caetano, se reuniu ontem com vários senadores da base para explicar melhor a proposta do governo.

 

O globo, n. 30557, 05/04/2017. Economia, p. 22