Valor econômico, v. 17, n. 4226, 31/03/2017. Empresas, p. B4

Petrobras viu incertezas na oferta da Karoon

 

André Ramalho

 

A decisão da Petrobras de desistir da venda dos campos de Tartaruga Verde e Baúna para a Karoon foi tomada não só em função do imbróglio judicial que paralisou as negociações entre as duas empresas. O Valor apurou que a estatal brasileira optou por reiniciar o processo de venda dos ativos também porque a australiana apresentou uma oferta inconsistente e que trouxe incertezas à conclusão do negócio, estimado em US$ 1,5 bilhão.

Em documento apresentado ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde a Petrobras tentava derrubar a liminar da Justiça Federal de Sergipe que suspendia o negócio, a petroleira brasileira alegou que a australiana Woodside, apresentada pela Karoon como sua sócia na aquisição, desistiu do negócio. O que por si só já era considerado um fator de preocupação para conclusão do negócio tornou-se ainda mais incômodo depois que a Woodside negou oficialmente ter feito qualquer proposta pelos ativos, em conjunto com a Karoon.

O episódio ganhou novos contornos em fevereiro, já em meio às disputas judiciais para tentar reaver a decisão da justiça sergipana. Na ocasião, a Woodside enviou uma carta diretamente ao diretor financeiro da Petrobras, Ivan Monteiro, desmentindo a Karoon e informando que a companhia não participava da negociação.

Em fato relevante, a Petrobras justificou, na quarta-feira, que um dos motivos que a levaram a rever o negócio foi a justamente a "insubsistência das condições da proposta de aquisição apresentada". O Valor apurou que a percepção dentro da Petrobras é que o grau de incerteza da venda se tornou insustentável: ou a companhia continuaria a ter problemas na Justiça que a impediriam de negociar os campos; ou, mesmo que a liminar fosse derrubada, havia riscos de que a negociação com a Karoon travasse, diante das incertezas sobre a financiabilidade da compra.

No documento enviado à Petrobras, obtido pelo Valor, a Woodside explica que foi inicialmente procurada por sua conterrânea, em agosto passado, a respeito de uma potencial oferta conjunta pelos ativos e que, na ocasião, optou por acessar o data room, para análise dos dados de Tartaruga Verde e Baúna. A Woodside, no entanto, preferiu não seguir adiante com a negociação e comunicou à estatal brasileira, ainda em novembro, em teleconferência, que não havia se associado à Karoon.

A desistência da Petrobras de prosseguir com a negociação repercutiu mal na Austrália - ontem as ações da Karoon caíram 18% na Bolsa de Sidney. Em comunicado enviado ao mercado, a empresa lamentou o fim das negociações exclusivas com a brasileira, para a compra dos campos de Tartaruga Verde e Baúna. A australiana informou ainda que o reinício do processo de desinvestimento da Petrobras é "iminente" e que mantém o interesse nos ativos.

"A Karoon permanece engajada com potenciais parceiros interessados e está comprometida com qualquer processo futuro no que se refere a esses ativos", afirmou o diretor-executivo da empresa, Robert Hosking.

A companhia informou que o processo judicial contra a negociação tornou o momento e o desfecho do processo de venda incertos, mas acredita que reiniciar o processo dentro dos novos procedimentos exigidos pelo Tribunal de Contas da União (TCU) ajudará a reduzir o risco de "qualquer ação judicial futura contra uma potencial venda, proporcionando maior certeza ao licitante vencedor".

A venda de 50% de sua participação em Tartaruga Verde e de 100% de Baúna fazia parte, inicialmente, da meta da Petrobras de atingir US$ 15,1 bilhões entre 2015 e 2016 com a venda de ativos. A judicialização do negócio foi atribuída pela empresa como o principal motivo pelo qual a estatal não conseguiu alcançar os números na íntegra. Ao todo, foi cumprido 90% do compromisso.

A meta atual da estatal é de US$ 21 bilhões até fim de 2018. Além de Tartaruga Verde e Baúna, a Petrobras também reiniciará, por exigência do TCU, os processos de venda da BR Distribuidora e dos campos terrestres e os ativos em águas rasas do Ceará e Sergipe.