Veto de pezão deixou sobras do Riocard sem destinação

01/04/2017

 

 

O destino dos créditos residuais do Riocard — dinheiro não usado pelos passageiros na compra de passagens — criou uma polêmica entre a Assembleia Legislativa do Rio e o govenador Luiz Fernando Pezão (PMDB). Uma emenda apresentada pela bancada do PSDB ao projeto de lei nº 2248/2016, aprovado em dezembro do ano passado, sugeria que essas sobras — cerca de R$ 90 milhões, segundo auditoria do Tribunal de Contas do Rio (TCE) — fossem destinadas ao Fundo Estadual de Transportes. Mas Pezão vetou por considerá-la confisco de dinheiro de particulares sob o argumento de que a medida "se reveste de duvidosa constitucionalidade".

Em sessão prevista para terça-feira, a Assembleia deverá derrubar o veto. Diferentemente da reportagem publicada pelo GLOBO na edição de quinta-feira, 30 de março, “Alerj beneficiou Fetranspor com créditos de R$ 90 milhões do Riocard”, os parlamentares não aprovaram que o dinheiro ficasse com os empresários de ônibus. O destino dos créditos residuais, na verdade, não está definido. Se os deputados derrubarem o veto — são necessários 36 votos para isso —, a lei será promulgada novamente e o estado poderá dispor das sobras não usadas pelos passageiros para financiar o próprio programa. Outra possibilidade, se for mantido, é que o dinheiro fique com os empresários.

O impasse sobre o destino dos créditos do Riocard foi criado quando Pezão enviou à Alerj, em 4 de novembro de 2016, o projeto de lei nº 2248/2016, que modifica a lei que regulamenta os benefícios do Bilhete Único (Lei nº 5628/2009). Originalmente, tinha apenas três artigos e não mencionava o Riocard.

Na Alerj, porém, o projeto sofreu alterações. A mais polêmica foi a que incluiu no artigo 19, que trata dos tipos de passagem com prazo de validade de uso e de restituição de valores de um ano, a contar de sua aquisição, “os créditos armazenados na forma de valores monetários emitidos sobre qualquer forma, inclusive cartão eletrônico”, ou seja, o sistema Riocard.

Na prática, a alteração muda a destinação das sobras do Riocard, que pelo projeto aprovado na Alerj deixam de pertencer aos usuários que não utilizaram o valor total de seus créditos. Pezão, nas razões publicadas no Diário Oficial, argumenta que o teor do dipositivo aprovado "traduz verdadeiro ato estatal confiscatório dos créditos expirados e originários de relação privada, na medida em que redireciona o destino de valores utilizados para aquisição de serviços, sem anuência expressa do contratante".

AÇÃO CONTESTA DESTINO

A retenção das sobras do Riocard é contestada em ação civil pública, movida pelo Ministério Público Estadual e Defensoria Pública. Os autores alegam que estes créditos não podem ser confundidos com passagens pagas antecipadamente, que perdem a validade em um ano, pois são valores monetários mantidos pelos passageiros no sistema Riocard sem prestação de serviço. A juíza Maria Cristina de Brito Lima, da 6ª Vara Empresarial, acolheu o pedido, mas a Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio (Fetranspor) recorreu da decisão.

Na 25ª Câmara Cível, o desembargador Jean Albert de Souza Saadi, relator do caso, deu tutela antecipada aos autores e proibiu as empresas de aplicar a perda de validade ou deixar expirar os créditos inseridos nas ´bolsas de crédito´ dos usuários do RioCard, no prazo de um ano. Com a decisão da Alerj, que incluiu os créditos de Riocard na lei aprovada, a Fetranspor entrou com uma petição em 17 de fevereiro pedindo o arquivamento da ação, sob a alegação de perda de objeto.

Em delação premiada que fundamentou a operação "O quinto do ouro", o ex-presidente do TCE Jonas Lopes de Carvalho acusou o presidente da Alerj, Jorge Picciani, de gerir uma caixinha no tribunal para favorecer os empresários de ônibus. O teor da decisão do ministro Félix Fischer, relator do inquérito no Superior Tribunal da Justiça (STJ), faz referência à acusação, de acordo com os trechos publicados no site da revista "Época".

 

O globo, n. 30553, 01/04/2017. País, p. 4