PALOCCI DIZ A MORO TER NOMES E OPERAÇÕES DE INTERESSE DA LAVA-JATO

Cleide Carvalho 

Gustavo Schmitti

Tiago Dantas

Sérgio Roxo

21/04/2017

 

 

 

Ex-ministro admite caixa dois e sinaliza delação com informações para ‘mais um ano de trabalho’ do juiz

O ex-ministro Antonio Palocci dá mostras cada vez mais claras de que pode aderir à lista de delatores da Operação Lava-Jato. Em audiência ontem, em Curitiba, o petista admitiu a existência de caixa 2, negou ter determinado pagamentos no exterior aos marqueteiros João Santana e Mônica Moura — não falou sobre pagamentos no Brasil — e acenou com a possibilidade de contar fatos novos sobre o financiamento de campanhas políticas no Brasil, envolvendo agentes financeiros, mas não o PT. Ao juiz Sérgio Moro, disse que pode, a qualquer momento, apresentar mais informações.

— Apresento todos os fatos com nomes, endereços e operações realizadas. Posso lhe dar um caminho que vai lhe dar mais um ano de trabalho, que faz bem ao Brasil — disse Palocci, ao explicar que falaria sobre “nomes e situações” que, na audiência, não foram mencionados,

Palocci afirmou que foi o ex-presidente Lula quem, pela primeira vez, falou sobre a “provisão” de R$ 200 milhões, feita pela Odebrecht, para financiar o PT. Na versão do ex-ministro, Lula ficou irritado ao saber sobre o valor provisionado — queria saber do que se tratava e por que a doação para a campanha presidencial não havia sido feita pelas vias legais.

Ao responder a perguntas do seu advogado, Palocci contou uma história que pode dar indicativos do que ele tem a contar em uma possível delação. Afirmou que, antes da campanha de 2010, foi procurado por um banqueiro, a quem ele definiu como “uma personalidade do meio financeiro”, a quem caberia fazer “coisas relativas a financiamento de campanha, a reservas, provisões”.

Segundo Palocci, o banqueiro lhe disse que falava em nome “de uma autoridade de primeiro escalão do governo”, mas que a então candidata Dilma Roussef não sabia disso.

Palocci, que evitou mencionar o PT em eventuais negociações, disse que chamou sua atenção o fato de o banqueiro ter utilizado a palavra “provisões”, a mesma usada por Marcelo Odebrecht para se referir a dinheiro reservado à campanha petista. Em depoimento de delação, Marcelo relata ter provisionado R$ 200 milhões para o PT, dos quais R$ 133 milhões teriam sido gastos. O empreiteiro afirma que o PT pediu dinheiro por duas vezes como “contrapartida” — R$ 64 milhões referentes a um crédito para Angola e R$ 50 milhões para aprovação da MP da Crise, este último a pedido do então ministro Guido Mantega.

O ex-ministro disse ainda que o banqueiro em questão sabia da “provisão” feita pela Odebrecht e pediu ajuda dele para liberá-la. Palocci teria desconversado, dito que não sabia de nada.

— Esse assunto deu muita cria em assuntos relacionados à Lava-Jato. Se o senhor me ouvir em sigilo, me prontifico a falar tudo. Isso tem desdobramentos importantes, inclusive em relação à Odebrecht... — disse o ex-ministro.

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“ITÁLIA EU NÃO SEI QUEM É”

Palocci admitiu a Moro que sabia da existência de caixa 2 nas campanhas políticas, mas que nunca ouviu sobre pagamentos no exterior.

— Digo ao senhor, não deixei de cometer erros (..) Não me sinto em condições de falar o que todo mundo está falando, dizer que nunca existiu, que tudo foi aprovado em tribunais. Todo mundo sabe que teve caixa 2 em todas as campanhas. Não vou mentir — afirmou ao juiz.

O ex-ministro foi contundente e hábil em sua própria defesa. Negou ter determinado que fossem feitos pagamentos a João Santana no exterior

— Jamais, absolutamente não — disse Palocci. — Se aplica a João Santana, Mônica Moura. Nunca tratei de onde seria pago ninguém, onde pagar alguém.

Segundo ele, quem decidia como pagar eram empresa e recebedor. E negou ter facilitado liberação de créditos no BNDES.

— Jamais fui ao BNDES buscar linha de crédito para qualquer empresa, não digo só a Odebrecht.

A exceção, segundo o ex-ministro, se deu em casos de empresas ameaçadas de falência.

— Aí, sim, discutíamos com as empresas e o BNDES a possibilidade de salvamento. Essa nunca foi a situação da Odebrecht.

Palocci negou também ser o “italiano” ou “Itália” da planilha do departamento de propinas da Odebrecht, e disse que esse assunto o “chateia enormemente”.

— Itália, eu não sei quem é. Italiano lá no Congresso, como no Brasil inteiro, tem milhares.

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DA ASCENSÃO À QUEDA

 

1º de janeiro de 2003

Ministro da Fazenda É nomeado ministro da Fazenda de Lula. Sua gestão foi marcada pelo controle da inflação, com altas taxas de juros, e baixo crescimento do PIB. Ao mesmo tempo que obteve estabilidade na economia, recebeu críticas por não estimular o crescimento no mesmo ritmo de outros países.

 

27 de março de 2006

Revelações do caseiro Entrega a Lula carta de renúncia após ser envolvido em denúncias que culminaram na quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa, que havia dito à CPI dos Bingos que o petista frequentava mansão no Lago Sul, onde eram realizadas reuniões de lobistas.

 

1º de janeiro de 2011

Volta à Esplanada É nomeado ministro da Casa Civil a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva após atuar na linha de frente da campanha petista que elegeu Dilma Rousseff para a Presidência da República. Sua volta à Esplanada dos Ministérios é vista como uma reabilitação política.

 

7 de junho de 2011

A segunda queda Deixa a Casa Civil do governo Dilma Rousseff após revelações de que seu patrimônio havia aumentado 20 vezes entre 2006 e 2010, em razão de consultorias prestadas, inclusive quando era deputado federal. Sem revelar seus clientes, ele não resiste à pressão e pede demissão.

 

26 de setembro de 2016

Alvo da Lava-Jato É preso na 35ª fase da Lava-Jato, suspeito de defender interesses da Odebrecht entre 2006 e 2013, em aprovação de medidas provisórias e concessão de financiamentos do BNDES — ele seria o “Italiano” nas planilhas. Em troca teria recebido R$ 128 milhões em forma de propina para o PT.

 

20 de abril de 2017

Sinal para delação Em depoimento a Sérgio Moro uma semana depois da divulgação do conteúdo das delações da Odebrecht, da qual foi alvo, Palocci sinaliza que pode oferecer novas informações para a Lava-Jato. “Posso lhe dar um caminho que vai lhe dar mais um ano de trabalho, que faz bem ao Brasil”, diz ao juiz.

O globo, n.30573 , 21/04/2017. País, p. 6