Delator: Despesas pessoais de Pezão foram pagas com propina 
Juliana Castro e Marco Grillo 
04/04/2017
 
 
Jonas Neto diz que esquema no TCE rendeu R$ 900 mil ao governador

O advogado Jonas Lopes Neto afirmou, em delação premiada, que o subsecretário adjunto de Comunicação do governo do Rio, Marcelo Santos Amorim, contou a ele ter pago R$ 900 mil em despesas pessoais do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) com recursos oriundos de corrupção. Os valores viriam de empresas da área de alimentação que tinham contratos com o estado.

Marcelinho, como é conhecido, é casado com uma sobrinha de Pezão e foi levado coercitivamente para depor na Operação O Quinto do Ouro, que prendeu cinco conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE). O subsecretário é citado em depoimentos ao Ministério Público Federal (MPF) como um dos operadores do suposto esquema de corrupção que envolvia fornecedores do estado e conselheiros do TCE. Jonas Lopes Neto é filho do ex-presidente do Tribunal Jonas Lopes de Carvalho, que também firmou acordo de colaboração.

“Que Marcelinho, além dos R$ 150 mil recolhidos na Milano (empresa de alimentação), apresentou ao colaborador uma anotação indicando que teria arrecadado quase R$ 900 mil junto às demais empresas, mas teria utilizado a quantia para pagamento de despesas do governador Pezão”, disse Jonas Lopes Neto.

Sete empresas do setor foram alvos de mandados de busca e apreensão na semana passada.

Os delatores contaram que um dos braços do esquema envolveu a liberação de R$ 160 milhões, em 2016, de um fundo do TCE para o governo estadual, em função da crise financeira. A transferência ocorreu após a aprovação de uma lei na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e foi direcionada para a Secretaria estadual de Administração Penitenciária (Seap) e ao Degase. Os órgãos, então, repassaram a verba às empresas que forneciam quentinhas para os presidiários.

PEZÃO NEGA ENVOLVIMENTO

Os conselheiros concordaram em ajudar desde que as companhias entregassem a eles 15% dos valores recebidos do governo estadual. Marcelinho, que já tinha uma relação estabelecida com as empresas, ficaria com 1% da quantia arrecadada. Em seu depoimento, Jonas Lopes Neto diz que Marcelinho “seria o operador de Pezão’.’ Em ofício que consta do inquérito aberto no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Polícia Federal (PF) classifica Marcelinho como “suposto operador” do governador.

A atuação do subsecretário gerou incômodo entre os integrantes do esquema. Segundo o depoimento do filho, Jonas Lopes de Carvalho questionou o secretário de Governo, Affonso Monnerat, sobre a interferência de Marcelinho nos repasses acertados entre as empresas e os conselheiros. Monnerat então respondeu que havia recebido a informação que o subsecretário não tinha a autorização de Pezão para recolher os valores.

Em nota, o governador afirmou que “desconhece o teor das investigações”. Ele nega ter “recebido valores ilícitos ou autorizado qualquer pessoa a receber”. Pezão disse ainda que está “à disposição da Justiça para quaisquer esclarecimentos”. Marcelinho disse que “já prestou todos os esclarecimentos à Polícia Federal” e que “repudia as declarações mentirosas imputadas a ele”.

De acordo com os depoimentos, Pezão tinha conhecimento também de um outro ramo do esquema: o pagamento de 1% em propinas ao TCE sobre todas as obras orçadas acima de R$ 5 milhões. A suspeita de que o então subsecretário de Obras Hudson Braga — Pezão era vice-governador e ocupava a secretaria à época — estaria cobrando 2% dos contratos em nome do TCE levou à marcação de um jantar na casa de Pezão, no Leblon. Jonas Lopes de Carvalho contou que, no encontro, “Pezão acompanhou toda a reunião e dela participou ativamente, inclusive intervindo para acalmar as discussões iniciais”. O delator pontuou ainda que “toda a discussão sobre as vantagens indevidas pagas ao TCE foi feita às claras na presença de Pezão”. O conselheiro do TCE Aloysio Neves também participou do encontro. Em ofício direcionado ao ministro do STJ Félix Fischer, que determinou as prisões, a PF aponta um “possível conhecimento” de Pezão sobre a cobrança de 1% de propina em cima dos contratos.

REUNIÃO NO PALÁCIO

O ex-presidente do TCE contou também que se reuniu novamente com Pezão em 2015, no Palácio Guanabara. Segundo a delação premiada, Jonas Lopes “indagou quem falaria ao governo junto ao TCE”. Pezão respondeu que “seria Affonso Henrique Monnerat Alves da Cruz”, secretário de Governo. Ainda de acordo com o delator, com a expressão “falaria ao governo junto ao TCE”, ele e o governador entendiam ser uma referência aos acertos financeiros com os integrantes do TCE.

Em fevereiro, a Polícia Federal apontou em relatório indícios de que Pezão recebeu propina do suposto esquema de corrupção comandado pelo ex-governador Sérgio Cabral (PMDB). O nome do governador aparece em anotações encontradas na casa de Luiz Carlos Bezerra, apontado como operador de Cabral. De acordo com a PF, Pezão estaria ligado a repasses de propina de R$ 140 mil e um outro de R$ 50 mil.

 

O globo, n. 30556, 04/04/2017. País, p. 4