‘Pacote’ de petista pode afetar lava jato

Igor Gadelha

14/03/2017

 

 

Wadih Damous propõe extinção de processos penais que não forem concluídos em 1 ano e anulação de decretos de prisão baseados em delações

 

 

 

O deputado Wadih Damous (PT-RJ) apresentou uma série de projetos que, se aprovados, podem afetar as investigações da Lava Jato. Uma das propostas estabelece que processos ou procedimentos penais serão extintos, sem julgamento de mérito, se não forem concluídos em um ano.

O petista, aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, protocolou os projetos há uma semana, no mesmo dia em que o Supremo Tribunal Federal tornou o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) réu na Lava Jato, sob acusação de ter recebido propina “disfarçada” de doação registrada, o chamado “caixa 1”.

As propostas também foram apresentadas em meio à expectativa dos pedidos de investigação da Procuradoria-Geral da República contra políticos, com base na delação da Odebrecht.

No projeto que trata sobre extinção de processos penais, Damous disse que a proposta busca a “efetividade da garantia constitucional da razoável duração do processo”. Caso seja aprovado, o projeto afetaria a Lava Jato, já que a maioria dos processos da operação dura mais de um ano. A Procuradoria-Geral da República apresentou a primeira lista com pelo menos 50 políticos investigados em março de 2015. Até agora, não houve condenação e quatro parlamentares se tornaram réus por decisão do STF.

Alguns dos projetos apresentados por Damous se contrapõem às propostas do Ministério Público Federal no pacote anticorrupção levado ao Congresso. Entre eles, o que prevê a anulação de sentenças e decretos de prisão preventiva fundamentados apenas em delações.

O MPF propôs a validação do uso de provas obtidas de maneira ilícita e a criação de possibilidade para justificar prisões preventivas - para identificar e localizar produto do crime. Essas propostas acabaram recusadas.

“Delação premiada não é só para o doutor Sérgio Moro, não. Qualquer pessoa pode ser alvo. Hoje a gente só pensa em Lava Jato. A Lava Jato vai passar, mas o direito fica. Se o direito for contaminado por um tipo de prática autoritária, que desrespeita a lei em nome de qualquer outro bem, é isso que vai ficar. E é isso que não gostaria que ficasse”, disse o parlamentar.

Outro projeto apresentado pelo petista que contraria o pacote anticorrupção é o que prevê que o Ministério Público poderá pedir a suspensão de um processo caso o delito tenha ocorrido há mais de cinco anos. No pacote do MPF, as propostas iam no sentido oposto, como a que aumentava os tempos de prescrição e a que estabelecia que o prazo para prescrição só começaria a contar após esgotados todos os recursos.

 

Encarceramento. Ex-presidente da OAB do Rio, Damous negou que os projetos tenham o objetivo de atingir a Lava Jato. “Minha maior preocupação é com a questão do encarceramento. Estamos caminhando para ser o terceiro país com maior número de presos. Mais da metade das pessoas que estão encarceradas hoje nem deveria estar lá”, declarou.

 

‘Direito’

“A Lava Jato vai passar, mas o direito fica. Se o direito for contaminado por um tipo de prática autoritária, é isso que vai ficar.”

Wadih Damous

DEPUTADO (PT-RJ) l

 

PROPOSTAS

Prazos

Deputado

Processos ou procedimentos penais não concluídos no período de um ano serão extintos sem julgamento de mérito

MPF

Estende prazo de prescrição, que começa a contar após esgotadas todas as possibilidades de recursos

 

Prisão preventiva

Deputado

Retira o requisito de ordem pública e econômica como motivo para pedidos de prisão preventiva

MPF

Prevê nova possibilidade de prisão: para identificar e localizar o produto do crime

 

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'Só citação de delator não é motivo para nada', afirma Padilha

Vera Rosa

 

 

De volta após licença médica, ministro da Casa Civil nega saída do cargo e diz que não vai falar ‘sobre o que não existe’

 

 

 

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse ontem que as delações premiadas de ex-executivos da Odebrecht envolvendo o nome dele não são motivo para saída do governo. “Em time que está ganhando não se mexe”, afirmou o chefe da Casa Civil. “Só citação de delator não é motivo para nada”, disse.

Homem forte do governo e fiador da reforma da Previdência, Padilha retornou ao trabalho no Palácio do Planalto, na manhã de ontem, após 21 dias de licença médico. O ministro se submeteu a uma cirurgia para retirada da próstata, em Porto Alegre, no último dia 27.

Logo ao chegar, ainda abatido, o chefe da Casa Civil se reuniu com Michel Temer. Recebeu respaldo do presidente para não responder às acusações em depoimentos no âmbito da Lava Jato. “Não vou falar sobre o que não existe”, disse. “Está tudo baseado num delator. Qualquer fala agora vai ser prejudicial à investigação e a mim. Então, fico quietinho.”

Às vésperas da divulgação da lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot - que pedirá abertura de inquérito contra políticos de vários partidos, muitos dos quais da base aliada -, o clima no governo é de apreensão. Apesar do discurso de Padilha, sua permanência no governo continua incerta.

A licença de Padilha coincidiu com o agravamento da crise. Pouco antes de seu afastamento, o advogado José Yunes, ex-assessor de Temer, disse que, em setembro de 2014, recebeu um “pacote” no seu escritório, a pedido de Padilha, das mãos do operador financeiro Lúcio Funaro. O lobista é ligado ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Tanto Cunha como Funaro são presos da Lava Jato.

 

Parâmetro. Questionado se faria um pronunciamento sobre a declaração de Yunes, além de acusações de delatores da Odebrecht, segundo as quais teria recebido R$ 4 milhões da empreiteira, na campanha de 2014, Padilha respondeu que não. “O presidente Michel Temer já firmou a linha de posicionamento do governo”, afirmou ele, numa referência ao parâmetro estabelecido por Temer para que ministros deixem a equipe.

Pela “linha de corte” de Temer, quem for denunciado será afastado temporariamente do governo. Se virar réu, terá de deixar o cargo. Foi ao mencionar esse parâmetro que Padilha disse que citação de delator não é motivo para sair.

Padilha lembrou que o ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello - decano da Corte - já disse que citação em delação premiada não significa culpa e precisa ser provada.

O chefe da Casa Civil afirmou que os médicos queriam que ele permanecesse em licença até o próximo dia 19. “Eu tinha de ficar de repouso até a semana que vem, mas o ‘psicológico’ disse que eu tinha de voltar”, disse Padilha, ao citar proposta de reforma da Previdência, que tramita na Câmara.

“Eu e minha equipe é que temos memória da Previdência. Os médicos disseram que sou doido, mas eu precisava voltar.”/ COLABOROU TÂNIA MONTEIRO

 

‘Quietinho’

“Qualquer fala agora vai ser prejudicial à investigação e a mim.Então, fico quietinho.”

Eliseu Padilha

MINISTRO DA CASA CIVIL, SOBRE CITAÇÕES A SEU NOME

 

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Rodrigo Janot desconversa sobre lista

Breno Pires e Beatriz Bulla

 

 

Após presidir uma sessão do Conselho Superior do Ministério Público Federal na manhã de ontem, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não respondeu à pergunta da imprensa sobre quando ele pretende enviar ao Supremo Tribunal Federal (STF) os pedidos de novas investigações com base das relações da Odebrecht. “Vamos trabalhar, trabalhar, trabalhar”, disse Janot aos jornalistas, no prédio da PGR, onde a sessão foi realizada.

A meta da Procuradoria-Geral da República era remeter ontem ao STF os pedidos de abertura de cerca de 80 inquéritos, que se somarão aos já existentes na Corte no âmbito da Lava Jato. O grupo que auxilia Janot na Lava Jato passou o fim de semana trabalhando na finalização do material sobre as 78 delações de executivos da empreiteira baiana, mas não há garantia de que o prazo estimado de entregá-lo hoje será alcançado.

Janot também deverá requisitar a derrubada do sigilo de parte das delações. Os pedidos serão analisados pelo ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supemo. Apenas Fachin pode autorizar que o material se torne público.

 

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45073, 14/03/2017. Política, p. A7.