SEM CRISE NO CRONOGRAMA

Letícia Ferndandes

Geralda Doca

17/04/2017

 

 

Para governo, votação da reforma da Previdência não será afetada por delações da Lava-Jato
 
Às vésperas da apresentação do relatório da reforma da Previdência às bancadas da Câmara — o que ocorrerá em um café da manhã na terça-feira, no Palácio da Alvorada —, o presidente Michel Temer se reuniu ontem com ministros e parlamentares envolvidos na elaboração do texto para dar os retoques finais ao projeto. Ainda há pontos a acertar, mas a equipe econômica venceu a disputa pelo período de transição: em 20 anos, todos terão de se aposentar aos 65 anos. Apesar do desgaste causado pelas delações da Odebrecht, que culminaram em diversos pedidos de inquérito contra integrantes do governo, Temer e os deputados fizeram questão de afirmar que isso não deve atrapalhar o calendário da Previdência.
 

Presidente da comissão especial que trata do assunto na Câmara, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) afirmou que o plenário da Câmara votará o texto na primeira ou segunda semana de maio e que, em seguida, há disposição do Senado em dar celeridade à votação do projeto. Ele disse ainda que a comissão deve votar o relatório no próximo dia 28, após pedido de vista já esperado para a sessão amanhã.

— Ficou sacramentado o calendário, não existe a mínima possibilidade, nem desejo, de mudança. Estou cada vez mais convencido de que vamos aprovar essas reformas por uma margem elástica de votos. Estou muito convicto de que teremos 350 votos, porque o texto incorpora o que os deputados da base trouxeram ao relator — disse Marun.

Apesar de negar que a Operação Lava-Jato tenha entrado na pauta do encontro, o deputado enfatizou que não haverá qualquer alteração no cronograma por conta da crise política:

— Apesar de toda essa questão (das delações), temos razões para estar muito otimistas em relação à reforma da Previdência. Não vai (atrapalhar), em momento nenhum esse foi o tema. Vejo toda uma determinação para que continuemos trabalhando. O Judiciário cumpre o seu papel, e a gente cumpre o nosso.

Já o deputado Arthur Maia (PPS-BA), relator da reforma na Câmara, disse que a Lava-Jato não é razão suficiente para atrapalhar o cronograma do governo.

— Não vejo nenhum tipo de mudança (com as delações). Temos votado na Câmara inúmeras reformas e termos visto, paralelamente, todo o processo judicial da Lava-Jato. As reformas estão sendo votadas — disse, garantindo não estar preocupado com as delações da Odebrecht. — Por que haveria de estar?

Marun confirmou que entre as mudanças incluídas no texto — que deve incorporar emendas apresentadas por deputados da base e os cinco pontos que Temer permitiu que fossem flexibilizados — está a diminuição do tempo de contribuição para obter a aposentadoria integral, antes de 49 anos. Mas ele não disse se o novo tempo será de 40 anos:

— Não sabemos ainda como vai ser feita essa diminuição, mas certamente o tempo de contribuição não será de 49 anos, isso vai deixar de estar posto.

 

SEM TEMPO MAIOR PARA AS MULHERES

Marun também negou que o possa entrar no texto um regime diferenciado para a aposentadoria das mulheres. Alguns parlamentares queriam a ampliação para 25 anos do período necessário a atingir a idade mínima de 65 anos. Ou seja, seriam 20 anos para os homens e 25 para as mulheres. Ao fim desse período, todos estariam enquadrados nas mesmas regras: idade mínima de 65 anos para quase todo mundo e 60 anos para algumas categorias, como trabalhadores rurais, policiais e professores. A área econômica insistia — e venceu — em 20 anos para todos.

— Não vejo essa possibilidade (de mudar), hoje a mulher luta por igualdade. Existem questões que não devem ser resolvidas na aposentadoria, devem ser resolvidas no tempo em que se trabalha — disse Marun.

Hoje, no fim da tarde, Temer se reúne com a bancada feminina. Ele deve, então, fechar o ponto da idade mínima — que começaria aos 50 anos para as mulheres e aos 55 anos para os homens.

Paralelamente ao andamento da reforma da Previdência, Temer também pediu e ouviu dos presentes que é importante votar a urgência do texto da reforma trabalhista nesta semana.

Para o governo, manter a transição da reforma dentro de 20 anos é um dos pontos cruciais para segurar a trajetória explosiva do déficit previdenciário. A avaliação é que já houve recuos demais em relação ao texto original do Executivo. Com as mudanças já anunciadas, a economia pode ser reduzida em R$ 250 bilhões, bem acima dos R$ 150 bilhões informados antes, revelou uma fonte ligada ao assunto.

Segundo o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, todos os esforços do Planalto serão no sentido de mobilizar a base para aprovar a reforma. Por isso houve concessões:

— O governo está procurando viabilizar a aprovação de um projeto que tem que ser discutido e debatido pelo Congresso. É preferível se fazer alguma e se ter avanços do que não se ter nada.

 

PROPOSTAS

O que está em estudo

 

REGRAS DE TRANSIÇÃO: Adotar a idade mínima progressiva, levando em conta ainda o tempo de contribuição. Uma hipótese seria criar uma escadinha, começando com idade de 50 anos para mulheres e 55 anos para homens, até chegar aos 65 anos para ambos. Esse período de transição levaria 20 anos, ou seja, em duas décadas, ninguém se aposentará antes dos 65 anos. O pedágio seria de 30%.

APOSENTADORIA RURAL: O tempo mínimo de contribuição para requerer o benefício seria mantido em 15 anos ou passaria para 20 anos, em vez dos 25 anos dos trabalhadores urbanos. A idade mínima seria de 60 anos para homens e mulheres.

BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (BPC): Nos bastidores, o governo já recuou da desvinculação do salário mínimo. Para diferenciar o benefício assistencial do contributivo (ou seja, pago a quem recolheu ao INSS a vida toda), a idade para requerer o BPC subiria de 65 para 68 anos. Não haverá mudanças para os deficientes.

PENSÕES: O limite para acúmulo de benefícios seria de dois salários mínimos. Regras especiais de pensão para filhos menores seriam mantidas.

PROFESSORES E POLICIAIS: Primeiro, por pressão de deputados e senadores, o governo retirou servidores estaduais e municipais (onde professores e policiais civis se enquadram) do escopo da reforma da Previdência. Caberia, assim, aos estados e municípios decidirem sobre os regimes destes profissionais. Com a chiadeira de governadores e insatisfação da área técnica, o Planalto voltou atrás e deu prazo de seis meses, a contar da promulgação da PEC, para que os estados e municípios aprovem as mudanças nos seus regimes próprios. Caso nada seja feito, valerão as regras federais. O governo aceitou regras diferentes para professores e policiais federais que exerçam atividades de risco ou prejudiciais à saúde.

O globo, n.30569 , 17/04/2017. Economia, p. 17