Ameaças ao juiz 

Marco Grillo e Chico Otavio 

11/04/2017

 

 

Ao reforçar segurança de Bretas, presidente do TRF-2 fala em ‘solidariedade e preocupação’

A segurança do juiz federal Marcelo Bretas, responsável pelos desdobramentos da Operação Lava-Jato no Rio, foi reforçada a pedido do próprio magistrado. Em um breve pronunciamento à imprensa, ontem, Bretas não citou detalhes sobre possíveis ameaças que vem recebendo, mas, a pessoas próximas, disse que a solicitação ocorreu em função dos “últimos desdobramentos” e da mudança de entendimento da nova administração do Tribunal Regional Federal da Segunda Região (TRF-2), que tomou posse neste mês.

Fora da esfera de atuação de Bretas, as investigações mais recentes levaram à prisão cinco conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ), por determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), instância em que os integrantes do TCE-RJ têm foro. Na sextafeira, mesma data em que a portaria determinando o aumento de efetivo de segurança foi assinada — o pedido foi feito há um mês —, os conselheiros deixaram a cadeia, uma vez que a prisão provisória não foi estendida.

Ex-presidente do TCE e delator responsável por destrinchar o funcionamento do esquema de corrupção no órgão, Jonas Lopes de Carvalho informou que recebeu ameaças e recebeu autorização judicial para deixar o país.

“TRIBUNAL ESTÁ ATENTO”

Bretas e o presidente do TRF-2, desembargador André Fontes, não detalharam as razões concretas para o reforço na escolta e fizeram discursos rápidos e cuidadosos. Após os pronunciamentos, a assessoria de imprensa do TRF-2 esclareceu que a demonstração de apoio estava relacionada ao aumento na equipe de segurança do magistrado.

— Vim aqui (ao prédio da Justiça Federal), num ato simbólico, deixar clara minha solidariedade e preocupação diante dos desafios e ameaças à figura do juiz (Bretas). Não tenho como especificar isso, a não ser expondo a situação que nós queremos evitar — disse o presidente do TRF-2. — O tribunal está atento à situação do juiz Bretas. Este, talvez, seja um dos maiores desafios que o tribunal enfrenta hoje. Essa preocupação que paira sobre o juiz é a preocupação também do tribunal.

O aumento da escolta de Bretas está em vigor desde a última sexta-feira, conforme revelou o site do GLOBO. A decisão foi anunciada ontem, em visita ao desembargador André Fontes. A portaria assinada por Fontes justifica o incremento na segurança com base na “notória repercussão dos processos relacionados à Operação Lava-Jato e seus desdobramentos”.

Marcelo Bretas afirmou que vai continuar atuando da mesma forma.

— Ainda mais com o apoio explícito e institucional (do TRF-2), estou muito à vontade para tocar o processo. Não há nenhuma preocupação que não seja totalmente contornável com esse apoio que temos recebido. O processo vai correr normalmente. Temos todas as condições de tocar o processo e as questões que são submetidas a nós. Qualquer outra questão do processo, eu não posso comentar. O juiz tem que falar nos autos — afirmou Bretas.

Todos os juízes que atuam na área penal, caso de Bretas, titular da 7ª Vara Federal Criminal, têm direito a uma equipe de segurança. Em fevereiro, o magistrado já havia solicitado reforço, e o pedido foi atendido. Segundo o colunista do GLOBO Lauro Jardim, um homem foi à cantina do prédio da Justiça Federal, no início deste ano, e tentou obter informações sobre a rotina de Bretas. Um outro homem perguntou ao porteiro do prédio onde o juiz mora e os horários em que ele costuma sair de casa.

O presidente do TRF-2 enfatizou o apoio a Marcelo Bretas.

— Espero a colaboração de todos e que, acima de tudo, preservem a boa imagem da Justiça, porque, fazendo isso, preservamos a sociedade brasileira, que neste momento está a aguardar uma decisão da Justiça sobre os acontecimentos que todos têm relatado.

DECISÃO DO STJ

Bretas e Fontes não fizeram referências à possibilidade de os processos deixarem as mãos do juiz. A assessoria de imprensa do TRF-2 assegurou que a demonstração de apoio não tinha relação com assuntos processuais. No sábado, O GLOBO mostrou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) deverá decidir, em breve, se existe conexão entre a Operação Saqueador, que prendeu o empresário Fernando Cavendish e o bicheiro Carlinhos Cachoeira, e os desdobramentos da Lava-Jato no Rio. Caso o STJ rejeite a relação, as ações e inquéritos derivados sairão da alçada de Bretas e do desembargador Abel Gomes, relator do caso no TRF-2, e serão redistribuídos.

“Vim aqui deixar clara minha solidariedade e preocupação diante dos desafios e ameaças à figura do juiz (Bretas)”

André Fontes

Presidente do TRF da Segunda Região

O QUE PASSOU PELO GABINETE DE BRETAS

OPERAÇÃO RADIOATIVIDADE (28/07/2015)

Desdobramento da 16ª fase da Lava-Jato, que apura pagamento de propinas relacionadas às obras de Angra 3.

Alvos: Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, e Flávio David Barra, ex-presidente global da Andrade Gutierrez Energia.

OPERAÇÃO SAQUEADOR (30/06/2016)

Ação investiga esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro.

Alvos: o ex-presidente da Delta Construções Fernando Cavendish; o bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira; os empresários Adir Assad e Marcelo Abbud e o ex-diretor da Delta Cláudio Abreu.

OPERAÇÃO CALICUTE (17/11/2016)

37ª fase da Operação Lava-Jato, apurou crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa em obras públicas, como reforma do Maracanã e construção do Arco Metropoliltano.

Alvo principal: Sérgio Cabral, ex-governador do Rio. Também foram presos seus ex-secretário de Governo, Wilson Carlos, e de Obras, Hudson Braga, além do seu ex-assessor Wagner Jordão Garcia.

OPERAÇÃO EFICIÊNCIA (26/01/2017)

Investigou crimes de corrupção, organização criminosa, lavagem de dinheiro e ocultação no exterior de aproximadamente US$ 100 milhões (cerca de R$ 340 milhões).

Alvo: Eike Batista, suspeito de ocultar US$ 16,5 milhões de propina do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) no exterior.

OPERAÇÃO MASCATE (02/02/17)

Desdobramento da Operação Calicute.

Alvo: Ary Ferreira da Costa Filho, um dos principais operadores financeiros do grupo ligado a Sérgio Cabral.

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Odebrecht diz que assessor de Palocci levava dinheiro a Lula 

Cleide Carvalho, Gustavo Schimtt, Thiago Herdy e Sérgio Roxo

11/04/2017

 

 

A Moro, empresário confirma que ‘Amigo’ era codinome do ex-presidente

-SÃO PAULO- O empresário Marcelo Odebrecht confirmou ontem ao juiz Sérgio Moro que “Amigo” era o codinome do expresidente Luiz Inácio Lula da Silva na planilha de propinas da empresa. Segundo ele, a entrega de valores a Lula era feita por Branislav Kontic, assessor do ex-ministro Antonio Palocci. O empresário confirmou ainda que Palocci intermediava as remessas de dinheiro para o PT e era o “Italiano” na planilha de pagamentos da empresa.

O ex-ministro Guido Mantega, que sucedeu Palocci no Ministério da Fazenda, também teria passado a ser responsável pela movimentação de recursos para o PT, tendo sido batizado com o codinome de “Pós-italiano” ou “Pós-itália”. O empresário confirmou todos os repasses anotados na planilha do Setor de Operações Estruturadas, que ficou conhecido como departamento de propinas.

O empreiteiro afirmou que as duas versões de planilhas do Setor de Operações Estruturadas, que registram repasses da empresa ao PT, são verídicas.

A primeira, datada de 31 de junho de 2012, traz a informação de que havia R$ 23 milhões à disposição de Lula, identificado pelo codinome “Amigo”. A segunda, de 31 de março de 2014, aponta um saldo de R$ 10 milhões para o mesmo destinatário.

A diferença de R$ 13 milhões teria sido sacada entre os 21 meses que separam as duas versões da planilha. Os saques para Lula teriam sido identificados na tabela “Programa B”. Marcelo Odebrecht explicou no depoimento prestado ontem que “B” é uma referência a Branislav Kontic, que retirava o dinheiro em espécie e entregava ao expresidente Lula.

Registrada com o nome “Programa Espacial Italiano”, a primeira versão da planilha foi apreendida pela Lava-Jato no email de Fernando Migliaccio, um dos executivos do departamento de propinas da Odebrecht. Delator da Lava-Jato, ele entregou ao MPF outras versões do mesmo documento, com registro de saques feitos ao longo do tempo, o que permitiu aos investigadores da Lava-Jato conhecer, em detalhes, a movimentação.

A planilha “posição italiano” indica a movimentação de R$ 128 milhões que, segundo a forçatarefa da Lava-Jato, teriam sido destinados ao PT e movimentados por Palocci. O saldo da conta era de R$ 79,5 milhões em 2012.

CELULARES SÃO MOSTRADOS A MORO

Moro tem mantido os depoimentos da Odebrecht em sigilo. Argumenta que é preciso esperar que os conteúdos sejam liberados por decisão do STF.

Ontem, porém, o juiz foi surpreendido com o vazamento de informações do depoimento de Marcelo Odebrecht ao site “O Antagonista”, ainda durante a audiência. O aviso foi dado pelo advogado José Roberto Batocchio, que representa Lula, Palocci e Mantega.

Os advogados se dispuseram a mostrar seus celulares ao juiz, na tentativa de provar que não foram eles que vazaram informações. Nada foi encontrado. O juiz fez constar na ata da audiência que nem ele, nem a servidora da Justiça que acompanhou a audiência, estavam com celulares na sala. Policiais federais que faziam a escolta dos presos e procuradores também apresentaram seus aparelhos. Os advogados têm três dias para requerer medidas que considerem pertinentes.

LULA: INOCÊNCIA SERÁ PROVADA

Batochio não quis comentar as acusações. Ele afirmou ao GLOBO que houve vazamento criminoso de informações e que não revelaria ou comentaria conteúdo sigiloso. Em nota, o Instituto Lula afirmou que o ex-presidente Lula teve seus sigilos fiscais e telefônicos quebrados, sua residência e de seus familiares sofreram busca e apreensão há mais de um ano, mais de cem testemunhas foram ouvidas e não foi encontrado nenhum recurso indevido. “Lula jamais solicitou qualquer recurso indevido para a Odebrecht ou qualquer outra empresa para qualquer fim e isso será provado na Justiça. Lula não tem nenhuma relação com qualquer planilha na qual outros possam se referir a ele como ‘Amigo’”, diz a nota.

 

O globo, n. 30563, 11/04/2017. País, p. 3