Para Gilmar, Lava Jato mistura doação legal e ilegal

Ricardo Galhardo

11/03/2017

 

 

Ministro do STF e presidente do TSE diz que contribuição eleitoral via caixa 2 não deve ser objeto penal se não estiver associada à origem ilícita do dinheiro

 

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes disse nesta sexta-feira (10), que doações eleitorais declaradas à Justiça Eleitoral podem configurar crime caso sejam fruto de propina e, por outro lado, doações não declaradas, e repasses via caixa 2, são no máximo ilícitos fiscais e eleitorais, sem implicações penais. O ministro, que é presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), diferenciou ainda o enriquecimento pessoal das demais situações.

Segundo Gilmar Mendes, é preciso avaliar caso a caso, pois as revelações feitas pela Operação Lava Jato "misturaram" o que até então eram consideradas doações legais ou ilegais.

"Nós conseguimos misturar uma série de situações. Temos a doação legal sem nenhum reparo; temos a chamada doação legal entre aspas, propina; temos o caixa 2 que é defeituoso do ponto de vista jurídico mas não tem nada de corrupção e temos o caixa 2 propina", disse.

Gilmar afirmou que, em princípio, se a doação eleitoral via caixa 2 não estiver associada à origem ilícita do dinheiro não deve ser objeto penal.

"No TSE a ideia da doação meramente irregular, portanto que veio de uma empresa com fontes lícitas e apenas não foi registrada, vinha sendo considerada atípica do pondo de vista penal. Esta vinha sendo a jurisprudência até agora. Tanto é que os procuradores naquelas dez medidas (anticorrupção) estavam propondo a criminalização", afirmou.

Segundo ele, algumas empresas optam por doar via caixa 2 não porque a fonte do dinheiro seja ilícita, mas para evitar o assédio de outros candidatos. O ministro também diferenciou os casos envolvendo campanhas e os de enriquecimento pessoal.

"Claro que se alguém recebeu dinheiro para uso próprio, isso já está em um outro plano", disse Gilmar. De acordo com ele, cada caso tem de ser tratado de forma separada. "Temos situações muito nuançadas que têm de ser tratadas com muito cuidado. Tem de investigar cada situação."

 

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Delator confirma pedido de Cabral de R$ 30 milhões

Ricardo Brandt/ Mateus Coutinho/ Julia Affonso

11/03/2017

 

 

O ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa confirmou em depoimento ontem ao juiz federal Sérgio Moro que o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) lhe pediu R$ 30 milhões para a campanha eleitoral de 2010. O pedido, disse Costa, ocorreu em uma reunião no Palácio da Guanabara da qual também participou o atual governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), na época vice de Cabral.

“No pedido que foi feito pelo governador nessa reunião no Palácio do Guanabara, o governador me pediu R$ 30 milhões para a sua campanha. Como seria feito esse rateio com as empresas, eu não participei disso. Mas o valor total que me foi pedido pelo governador na data da reunião foram R$ 30 milhões”, afirmou Costa.

O ex-diretor depôs como testemunha de acusação na ação penal contra Cabral, acusado de recebimento de propina de R$ 2,7 milhões em contrato de terraplenagem das obras do Complexo Petroquímico do Rio (Comperj), da Petrobrás. O ex-governador do Rio é réu em seis ações relativas à Lava Jato e está preso em Bangu.

“Nessa reunião que eu fui no Palácio Guanabara, estava presente ele (Cabral), o secretário Wilson Carlos e, na época, o vice-governador Pezão. Os três estavam presentes nessa reunião. Ele incumbiu o Wilson Carlos de ser o interlocutor junto às empresas e assim foi feito”, declarou Costa. “O pedido foi só feito por ele, pelo Sérgio Cabral”, declarou o delator.

Nesta semana, o vice-procurador-geral da República, José Bonifácio Borges de Andrada, pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) o arquivamento da investigação sobre Pezão em inquérito que apura corrupção e lavagem de dinheiro em contratos do Comperj.

Pagamento. O delator afirmou ainda que um tempo depois o empreiteiro Rogério Nora, da Andrade Gutierrez, o procurou na Petrobrás e o questionou sobre o pagamento para o governador Sérgio Cabral.

“Como ele havia me pedido, o governador me pediu, eu disse que sim, que era para fazer. Houve uma reunião na Petrobrás com o Rogério Nora e ele fez essa pergunta: se era ou não para fazer o pagamento ao governador. Eu falei ‘sim, faça o pagamento’”, disse o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás. Segundo Costa, ele aceitou pagar o ex-governador do Rio porque Cabral “era uma figura proeminente no PMDB”.

Procurado, o governo do Rio não respondeu à reportagem até a conclusão desta edição.

 

Testemunha

O governador Luiz Fernando Pezão vai depor por Sérgio Cabral no dia 6 de abril. Ele foi arrolado como testemunha de defesa na ação que acusa Cabral de receber propina relativa ao Comperj.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45070, 11/03/2017. Política, p. A7.