Supremo tira ICMS de cálculo de PIS e Cofins

Breno Pires/ Rafael Moraes Moura / Alexa Salomão

16/03/2017

 

 

Ação traz perda de arrecadação, esqueleto de até R$ 250 bilhões e alta de impostos
 
 

Há algumas semanas, a causa até parecia perdida para as empresas, mas o jogo virou. Ontem, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o ICMS (Imposto sobre Mercadoria e Serviços) não compõe a base de cálculo para a cobrança do PIS (tributo do Programa de Integração Social) e da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social). Os tributos ajudam a financiar a Previdência e o seguro-desemprego. A decisão representa perdas bilionárias de arrecadação e pode levar o governo a elevar outros tributos, avaliam especialistas.

O STF julgou o processo da empresa Imcopa, uma importadora e exportadora de óleos, mas a decisão vale para todos os processos referentes ao tema. Assim, o julgamento tem impacto sobre todos os setores da economia, pois a cobrança de PIS e Cofins recai sobre mercadorias em geral e afeta, especialmente, os serviços de telefonia, energia elétrica e comunicação, como TV a cabo e internet.

Para os consumidores, a decisão deveria significar redução de preço. Para a União, porém, representa perdas bilionárias.

Segundo estimativas, podem deixar de ser arrecadados cerca de R$ 20 bilhões por ano, no momento em que o governo está no vermelho e não pode abrir mão de nem um centavo sequer.

E, para piorar, a conta pode ser ainda maior.

O advogado tributarista Antonio Carlos Guidoni Filho, sócio do escritório Vella Pugliese Buosi e Guidoni (VPBG), explica que há processos de empresas questionando a cobrança desde 2003, o que significa que teriam de ser ressarcidas. O volume é imenso: há cerca de 10 mil processos aguardando o STF.

 

Recurso. Após o julgamento, o Ministério da Fazenda afirmou que entrará com recurso (no jargão jurídico, vai entrar com embargos de declaração, após a publicação do acórdão). A Fazenda pedirá que a decisão do STF tenha efeitos a partir de 2018. “Somente com a apreciação dos embargos de declaração pelo plenário do STF é que se poderá dimensionar o eventual impacto dessa decisão”, diz a nota da Fazenda. No entanto, no julgamento, a Procuradoria-Geral da Fazenda estimou que as perdas poderiam chegar a R$ 250,3 bilhões, se fosse considerado o intervalo entre 2003 e 2014. Se valesse o prazo de cinco anos, período de prescrição da causa, o valor seria de R$ 100 bilhões.

A expectativa é de que o governo tentará compensar a perda.

“O presidente Michel Temer havia sinalizado que começaria a reforma tributária pelo PIS e a Cofins, por meio de medida provisória, e essa decisão do Supremo pode antecipar o processo, inclusive levando o governo a elevar a alíquota para compensar a perda”, diz Guidoni Filho.

Há quase 20 anos, as empresas perdiam na Justiça até que o tema chegou ao STF. “A discussão mostra que você precisa recorrer a todas as instâncias, que o caminho é longo para se estabelecer a constitucionalidade, mas que, como disse o juiz Celso Mello, no julgamento, a tributação não pode se exceder”, diz o advogado Leonardo Andrade, sócio do Velloza & Girotto.

O julgamento teve início na semana passada. A comunidade tributarista dava a causa como perdida. Foi surpreendida quando a votação sinalizou vitória para as empresas. Dezenas delas, de lá para cá, entraram com processos contra a cobrança.

“Historicamente, o Supremo vem garantindo ressarcimento para quem ingressou com processo até o final do julgamento, então, a tendência é que um número grande de empresas ingresse com processos daqui para frente”, diz Andrade.

Votaram pela exclusão do ICMS a relatora, ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo, os ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello e a ministra Rosa Weber. Os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli e Gilmar Mendes votaram a favor da Fazenda Nacional.

 

Votação. Carmem Lucia, presidente do Supremo Tribunal Federal, votou pela exclusão do ICMS

 

PARA ENTENDER

Era imposto sobre imposto

Desde que foram estabelecidas, há quase 30 anos, as cobranças do PIS (Programa de Integração Social) e da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) incluíram em sua base de cálculo o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Grosso modo, era como se dois tributos fossem cobrados sobre um terceiro tributo. Não houve grande questionamento jurídico sobre o tema até que duas leis, de 2002 e 2003, alteraram a redação das legislações do PIS e da Cofins: a cobrança deixou de recair sobre o faturamento e passou a ser feita sobre a receita. Com essa mudança sutil, os tributaristas entenderam, então, que o dinheiro para o pagamento de ICMS, ainda que esteja no caixa da empresa, não é receita, mas recurso destinado aos Estados. As empresas começaram a questionar judicialmente a cobrança. Sempre perderam e recorreram, até que o caso chegou ao Supremo, onde veio a vitória.

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Estados querem flexibilizar regras a crédito

Lorenna Rodrigues

16/03/2017

 

 

No Confaz, secretários fizeram apelo a Meirelles e representantes da pasta já admitem abrir uma ‘discussão ampla’

 

 

Estados querem discutir com o Tesouro Nacional regras mais flexíveis para ter o aval para operações de crédito da União, como forma de reforçar o caixa durante a crise e possibilitar a retomada de investimentos.

Com a resistência do Ministério da Fazenda e de Estados em calamidade financeira, secretários de Fazenda reunidos no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) desistiram de ampliar o projeto de recuperação fiscal para incluir qualquer unidade de Federação com dificuldade de caixa.

A estratégia agora é aproveitar a discussão de novos critérios de ratings dos Estados para aumentar a captação de empréstimos, hoje sujeitas a regras que eles consideram muito rigorosas. Os ratings são notas de classificação de risco dadas pelo Tesouro Nacional e que balizam a concessão de aval para financiamentos.

“A ideia dos Estados é encontrar instrumentos de crédito para recuperar a capacidade de investimento público. Neste momento não temos como aumentar mais arrecadação, já fizemos os sacrifícios. O que precisamos agora é de financiamento”, afirmou o coordenador do Confaz, André Horta, secretário de Fazenda do Rio Grande do Norte.

 

Mais empréstimos. Na reunião, representantes da Fazenda disseram que aceitam abrir uma discussão ampla, desde que não seja no bojo do projeto de regime fiscal, que contemplará os Estados em pior situação – hoje Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais.

De acordo com o Tesouro Nacional, uma portaria com nova sistemática de rating para Estados deverá ser colocada em consulta pública ainda este mês. Segundo participantes da reunião, a Fazenda se comprometeu a “olhar o futuro” na nova sistemática, e não apenas o nível atual de endividamento de cada Estado.

“Temos mais de 20 Estados com problema de pagamento de pessoal, na Previdência, sem conseguir fazer investimentos.

Precisamos de novos empréstimos”, disse um dos secretários que participou do encontro.

Inicialmente, os secretários queriam modificar o projeto de recuperação fiscal, em tramitação no Congresso Nacional, para permitir que qualquer estado pudesse ter acesso à suspensão do pagamento da dívida com a União em troca de contrapartidas de ajuste fiscal.

A proposta, porém, foi rechaçada pela Fazenda e por representantes dos Estados em calamidade financeira, que entenderam que isso poderia atrapalhar a tramitação do regime e atrasar ainda mais o socorro a esses entes.

Após participar da abertura da reunião do Confaz, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse que não tem condições para aliviar a dívida de Estados que não estejam em situação muito ruim. “Mostrei para os secretários que a situação fiscal do Governo Federal também é séria. Não pode simplesmente todos os Estados passarem a conta para o governo e parar de pagar a dívida”, disse.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45075, 16/03/2017. Economia, p. B7.