Reforma trabalhista avança 
Bárbara Nascimento 
26/04/2017
 
 
Após passar na comissão especial, texto deve começar a ser votado hoje no plenário da Câmara

Às voltas com a resistência de partidos da própria base aliada para apoiar as reformas de seu interesse no Congresso — a trabalhista e a da Previdência —, o governo deve passar, hoje, por seu primeiro teste: a votação, no plenário da Câmara, do projeto de lei que modifica as relações de trabalho. O substitutivo do relator Rogério Marinho (PSDB-RN) foi aprovado, ontem, na comissão especial que analisou o tema na Casa, por 27 votos favoráveis e dez contrários. A expectativa é que a tramitação da matéria pelos deputados seja concluída ainda esta semana, seguindo para o Senado.

A base do governo tem se desdobrado para acelerar a votação. Na semana passada, aprovou um requerimento de urgência, que permitiu pular o período para pedidos de vista na comissão. Ontem, após a aprovação do texto base, os aliados governistas se articularam para não precisar votar os 25 destaques protocolados e, com isso, levar essa discussão diretamente para o plenário.

O relator recebeu 457 emendas, mas manteve a essência do texto. Ele deixou intacto um dos itens mais polêmicos da proposta: o fim da contribuição sindical obrigatória, relativa a um dia de trabalho por ano. Esse assunto foi alvo de várias das emendas dos deputados.

O projeto deve sofrer mais alterações até ir ao plenário. Marinho afirmou que teria, ainda ontem, uma série de reuniões com bancadas e entidades interessadas para tratar de pontos específicos do texto. Entre elas estava a bancada feminina, que queria discutir a permissão, incluída no parecer do relator, para que gestantes e lactantes trabalhem em locais insalubres.

No relatório original, Marinho previa que as mulheres nessas condições poderiam trabalhar em locais insalubres, desde que autorizadas por atestado médico. Ele reescreveu esse trecho, no entanto, acrescentando que o médico deverá comprovar no atestado que o ambiente não coloca em risco a mãe, o bebê que vai nascer, a gestação ou a lactação.

Para o relator, a permissão evitaria discriminação em alguns segmentos, que preferem não contratar mulheres em idade fértil. Ele deixou claro, no entanto, que está disposto a costurar uma nova solução, ou até mesmo retirar o artigo, se a bancada feminina assim entender.

— Acreditamos que a modificação que propomos permite que a mulher continue no mercado de trabalho em algumas situações de insalubridade. Mas, se as mulheres, que sãos as beneficiárias, entendem que isso é prejudicial, nós estamos abertos a conversar. Se elas disserem que querem retirar, que querem alterar, estamos abertos a conversar — disse Marinho.

O relator também retirou um artigo que previa que, no momento do cálculo para cota de deficientes em empresas, fossem excluídas as vagas que fossem incompatíveis com pessoas nessa situação. Segundo o novo parecer, ele foi convencido “das dificuldades em se definir quais as áreas que poderiam ser previamente excluídas da base de cálculo do percentual da cota de pessoas com deficiência (...)”.

OUTRA SALVAGUARDA À TERCEIRIZAÇÃO

Outra mudança foi em relação à jornada intermitente. Ele manteve os artigos que regulamentam esse tipo de contrato, pelo qual o empregado pode trabalhar apenas alguns dias na semana ou por algumas horas diárias, de acordo com a necessidade do empregador. A convocação do trabalhador, no entanto, deve ocorrer com pelo menos cinco dias de antecedência.

Marinho cedeu, ainda, a um pedido do Sindicato Nacional dos Aeronautas, para que a categoria seja excluída das profissões que podem ser abrangidas pelos contratos intermitentes. Esses profissionais argumentam que pertencem a uma categoria específica, que segue legislação própria, e que sua capacitação depende da prática regular da profissão. Uma mudança nisso afetaria a segurança de voo.

O relator também acrescentou mais uma salvaguarda à lei da terceirização. O relatório já previa que um trabalhador com carteira assinada não pode ser demitido e recontratado como pessoa jurídica (PJ) num prazo de 18 meses. Com a emenda, além de não ser contratado como PJ, o empregado não pode ser recontratado vinculado a uma empresa terceirizada.

ESPECIALISTAS DIVERGEM SOBRE PROPOSTA Análises sobre as mudanças sugeridas glo.bo/2ou0pji

PRINCIPAIS PONTOS

ACORDADO SOBRE O LEGISLADO. Permite que o acordado entre sindicatos e empresas tenha força de lei para uma lista de itens, entre os quais, jornada, participação nos lucros e banco de horas. Não entram direitos essenciais, como salário mínimo, FGTS, férias proporcionais e décimo terceiro.

CONTRIBUIÇÃO SINDICAL OBRIGATÓRIA. Acaba a obrigação de contribuir, com um dia de salário por ano, ao sindicato.

PARCELAMENTO DE FÉRIAS. O relatório permite a divisão das férias em até três períodos. Um deles, no entanto, não pode ser inferior a 14 dias. Os dois restantes precisam ter mais de cinco dias corridos, cada.

JORNADA. Poderá ser ajustada desde que a compensação se dê no mesmo mês e se respeite o limite de dez horas diárias, já previsto na CLT. O descumprimento das compensações legais obrigará a empresa a pagar horas extras sobre o que exceder à jornada normal.

INTERVALO INTRAJORNADA. Sindicatos e empresas poderão negociar intervalos de almoço menores do que uma hora.

JORNADA INTERMITENTE. Esse tipo de contrato permitirá a prestação de serviços em dias alternados ou apenas por algumas horas na semana. A única exceção para esses casos são os aeronautas, que não podem ser contratados pelo regime intermitente de trabalho.

TERCEIRIZAÇÃO.  Para impedir a “pejotização”, não é permitido que o trabalhador seja demitido e contratado como pessoa jurídica ou funcionário de empresa terceirizada em um período inferior a 18 meses. Terceirizados também terão acesso aos mesmos benefícios dos empregados da “empresa mãe”.

GESTANTES. Gestantes e lactantes podem trabalhar em ambientes insalubres desde que um médico comprove, por atestado, que não há risco para a mãe, o bebê, a gestação ou a lactação. Isso, no entanto, pode ser alterado em parceria com a bancada feminina do Congresso.

DEMISSÃO. O substitutivo prevê demissão em comum acordo. Por esse mecanismo, a multa de 40% do FGTS seria reduzida a 20%, e o aviso prévio ficaria restrito a 15 dias. Além disso, o trabalhador teria acesso a 80% do dinheiro na conta do Fundo, mas perderia o direito a receber o seguro-desemprego.

 

O globo, n. 30578, 26/04/2017. Economia, p. 21