Valor econômico, v. 17, n. 4234, 12/04/2017. Brasil, p. A4

Fiesp envia carta ao BNDES e afirma que 'melhorou o diálogo'

 

Fabio Graner
 

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) enviou no mês passado uma carta ao BNDES com oito pontos de avaliação e sugestões sobre as políticas de crédito do banco. No documento, além de voltar a cobrar a queda no crédito do banco, em especial no ano passado, a entidade aponta problemas como a elevação dos custos de financiamento.

A entidade também faz alguns elogios, por exemplo, às medidas de ampliação de financiamento para micro, pequenas e médias empresas e de capital de giro, ainda que também cobre ajustes para aumentar a eficácia dessas ações.

Segundo o vice-presidente e diretor do departamento de competitividade da Fiesp, José Ricardo Roriz Coelho, o documento é a base para uma agenda de discussões que foi iniciada com o banco. Para ele, a instituição estatal tem se mostrado disposta a buscar soluções com o setor industrial.

"Melhorou o diálogo. Fomos bem recebidos na semana passada pela diretoria do banco", disse Roriz, que diz querer conseguir um entendimento em torno de pontos da agenda apresentada para serem anunciados em um encontro do setor industrial paulista em maio.

"A recuperação do setor privado não virá por acaso, e o estímulo para que isto aconteça deverá ter a participação de vários atores públicos e privados, e é fundamental que o banco de fomento brasileiro seja um dos protagonistas neste processo", diz a carta.

A entidade patronal, que no início do ano já vinha criticando fortemente a queda nos desembolsos do banco, avalia que o cenário ainda aponta para a continuidade dessa trajetória negativa, o que demandaria iniciativas para reverter o processo. "A provável redução nos desembolsos futuros para indústria de transformação, tanto pela queda nas consultas quanto pela queda mais acentuada nas aprovações pode dificultar a retomada do crescimento do país", diz.

Para a Fiesp, a nova política operacional do banco elevou o custo médio dos financiamentos, por conta da redução do limite de financiamento com Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que em algumas linhas caiu de 80% para 30%. Por isso, pede que os limites anteriores sejam retomados.

Na carta, enviada antes do anúncio da Taxa de Longo Prazo (TLP), a entidade criticava a ideia de vincular o juro do banco à NTN-B, título público atrelado à inflação. Segundo Roriz, mesmo com a queda na TJLP anunciada junto com a mudança de fórmula a partir de 2019 no fim de março, a crítica se mantém.

Na visão dele, a mudança vem na hora errada, pois as aprovações de crédito levam pelo menos um ano e, sob as novas condições, que adicionariam risco de longo prazo, as empresas não teriam interesse de tomar crédito. "Nesse ponto, nós temos uma discordância importante com o banco", disse.

O documento da indústria avalia positivamente as novas regras para o crédito às micro, pequenas e médias empresas. "Essas medidas poderão incentivar novos projetos de investimento em todos os setores da economia, se os recursos forem efetivamente disponibilizados", diz o texto, citando a ampliação do limite do cartão BNDES para 2 milhões e o maior limite de faturamento (R$ 300 milhões anuais), para acesso aos recursos.

A Fiesp, contudo, pede que o banco flexibilize algumas questões nesse segmento, permitindo por exemplo que o cartão BNDES financie saneamento financeiro das empresas e cobrando dos agentes repassadores para inibir reduções de limites para as empresas. A entidade, aliás, também critica o aumento dos spreads das instituições financeiras que utilizam recursos do BNDES.

Outra demanda apresentada é a flexibilização temporária da exigência de certidão negativa de débito (CND) para que as empresas possam tomar recursos com os bancos. Esse prazo seria de um ano. A medida, contudo, não depende do BNDES e, por isso, de acordo com Roriz, também está sendo negociada com a Fazenda. "Fatores limitadores das operações do BNDES com as MPMEs, como falta de CND, dificuldades com bancos repassadores e elevados spreads bancários demandam atenção e correções", diz o documento.

Outro elogio apresentado pela entidade foi a elevação do orçamento do Progeren, a linha de capital de giro do banco, anunciada no fim do no ano passado. "Foi uma medida acertada, mas existem problemas de acesso ao recurso que precisam ser resolvidos com brevidade. Se não houver recuperação do crédito, as empresas estarão sujeitas a problemas ainda mais sérios, como interrupção das suas atividades, o que gerará ainda mais desemprego, queda da renda, do consumo e da arrecadação tributária", diz o documento.

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Subsídios ao MEI podem gerar 'esqueleto' para o governo, diz Ipea

 

Edna Simão

 

O aumento do faturamento exigido para adesão ao chamado Microempreendedor Individual (MEI), assim como a redução da contribuição, está desvirtuando o foco do programa, que seria a baixa renda, e pode gerar um "esqueleto" para o governo, segundo nota técnica do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Segundo a nota, o valor das contribuições previdenciárias não serão suficientes para cobrir as aposentadorias no futuro.

O patamar das desonerações previdenciárias é um ponto em discussão no âmbito da reforma da Previdência e se intensificou com a aprovação do projeto de terceirização pela Câmara. O governo pretende fazer alterações nas regras para adesão ao MEI para elevar arrecadação. A ideia, segundo técnico do governo, seria restringir a abrangência do programa, que tem vantagens tributárias para os empresários individuais, ou fazer uma nova calibragem na alíquota cobrada sobre o salário mínimo.

No ano passado, segundo dados da Receita, a arrecadação do MEI foi de R$ 1,397 bilhão e a renúncia chegou a R$ 1,676 bilhão. A inadimplência é próxima dos 58%. No fim de 2016, havia cerca de 6,6 milhões de inscritos no MEI.

O estudo, assinado pelo coordenador de Previdência do Ipea, Rogério Nagamine Costanzi, e pela pesquisadora Graziela Ansiliero, aponta que as mudanças feitas nos programa aumentaram o subsídio implícito e elevaram o risco de uma focalização "não adequada". Em 2011, a alíquota de contribuição do MEI foi reduzida de 11% para 5% do salário mínimo e o teto de faturamento passou de R$ 36 mil para R$ 60 mil e deve atingir R$ 81 mil a partir do próximo ano.

A avaliação é que o aumento do teto do faturamento expande o potencial de beneficiários com um nível socioeconômico mais elevado. "Por outro lado, contraditoriamente, a drástica redução da alíquota contributiva amplia subsídios a um grupo que cada vez menos se enquadra no perfil esperado de trabalhadores que necessitem de tal suporte", explica a nota.

Com isso, as contribuições feitas pelos beneficiários do MEI não serão suficientes para bancar os benefícios previdenciários desse público, o que pode implicar agravamento do desequilíbrio financeiro e atuarial do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Segundo cálculo do coordenador de Previdência do Ipea, para cada um milhão de adesões ao MEI, a arrecadação anual (com base no salário mínimo de R$ 937) é de R$ 562 milhões. Por outro lado, quando essas pessoas se aposentarem, a despesa chegará a R$ 12,2 bilhões.

"O grau de subsídio das regras do MEI é extremamente elevado. Dependendo da hipótese e da taxa de juros utilizadas, o valor presente das contribuições do MEI pode representar apenas 4,3% do valor presente esperado dos pagamentos, ou seja, um subsídio que pode chegar a 95,7%. Diante deste elevado custo atuarial, o MEI deveria ser focalizado em trabalhadores com limitada capacidade financeira para contribuir para a Previdência Social", destaca a nota.

Instituído em 2008, o MEI saiu do papel no ano seguinte com o objetivo de ampliar a formalização de microempreendedores assim como a cobertura previdenciária entre trabalhadores por conta própria ou autônomos considerados de baixa renda. Atualmente, o MEI é destinado para pessoas que trabalham por conta própria e faturam até R$ 60 mil.