LIMITE A PARTIDOS MENORES AVANÇA NA CÂMARA

Catarina Alencastro

04/05/2017

 

 

Proposta de Emenda à Constituição, aprovada na CCJ, acaba com as coligações para eleições proporcionais
 
 A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara deu ontem o primeiro passo para aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acaba com a coligação partidária nas eleições proporcionais (deputados e vereadores) e cria a cláusula de desempenho, a chamada “cláusula de barreira”. As duas medidas são apontadas como formas de reduzir o número de partidos — hoje, só na Câmara há 26 legendas funcionando. A proposta limita o acesso a recursos públicos do fundo partidário e a horário gratuito de TV e rádio apenas às legendas que têm relevância eleitoral. A proposta, de autoria dos senadores Ricardo Ferraço (PSDB-ES) e Aécio Neves (PSDB-MG), já foi aprovada em dois turnos no Senado e acabou aprovada na CCJ da Câmara por 37 votos a 14. Agora, a medida segue para análise de uma comissão especial e, em seguida, vai ao plenário da Câmara, onde precisa ser aprovada em dois turnos com apoio de 60% dos deputados para ser promulgada.
 

A cláusula de barreira entraria em vigor no ano que vem. Para ter acesso a esses benefícios, o partido precisaria ter 2% dos votos válidos nas disputas de deputado federal país afora, garantindo também um mínimo de 2% em ao menos 14 unidades da Federação. A partir de 2022, essa regra se tornaria mais dura, sendo necessária a obtenção de 3% dos votos válidos nacionalmente. Os partidos que não atingissem esses patamares poderiam continuar existindo, mas sem acesso a recursos públicos, tempo de TV e rádio e sem funcionários adicionais e espaço de liderança no Parlamento.

Os partidos grandes argumentavam que a limitação, via percentual de votação, é a única solução para dar fim à “usina de partidos”. Hoje há 35 partidos em funcionamento no Brasil. Parlamentares favoráveis à PEC afirmam que outros 56 aguardam oficialização na Justiça Eleitoral. Estima-se que, quando começar a valer a cláusula de barreira, restarão apenas 11 legendas.

— Não podemos conviver com essa usina de partidos. São 56 que estão em gestação. E nós temos 26 partidos representados aqui na Câmara. Precisamos aprovar essa PEC. Não podemos mais conviver com essa farra, que atende muito mais aos donos de partidos do que à democracia — discursou Pauderney Avelino (DEM-AM).

Partidos pequenos protestaram e tentaram, por mais de seis horas, obstruir a votação. Representando o PSOL, Chico Alencar (RJ) falou de morte, extinção e apelidou a iniciativa de “cláusula de caveira”.

 

— É estabelecer que os partidos que devem sobreviver são esses 11 e o resto que se dane. E ainda abre brecha para a infidelidade total. Os que se elegeram nos pequenos podem ir para os grandes à vontade, para sobreviver. Estamos aqui lutando pela nossa sobrevivência, pelo direito de existir. Esta é a cláusula de caveira — discursou Alencar.

A PEC também estabelece o fim das coligações nas disputas proporcionais — para vereador e deputados estadual e federal — a partir das eleições de 2020. Hoje, as siglas podem se coligar livremente e as votações das legendas coligadas são somadas e consideradas de forma unificada quando da distribuição de cadeiras no Congresso. Isso permitiu, por exemplo, que em 2010 quem votou em São Paulo no deputado Tiririca ajudasse a eleger o ex-delegado Protógenes Queiroz, já que os partidos deles, PR e PCdoB, se coligaram.

A PEC cria a possibilidade de federações partidárias, por meio das quais partidos poderão se unir e passar a funcionar em bloco. Ela é semelhante à aliança proporcional, mas precisa ter validade de quatro anos e ser replicada em todos os estados e na atuação parlamentar durante a legislatura. Assim, a federação passaria a ter os mesmos direitos e funcionamento dos partidos. Segundo o relator do texto, deputado Betinho Gomes (PSDB-PE), essa é uma espécie de “salvaguarda” para os chamados “partidos ideológicos”.

A proposta cria ainda uma nova regra de fidelidade partidária que estabelece que todo político eleito que se desfiliar do partido pelo qual disputou perderá o mandato, exceto na hipótese de seu partido original não ter atingido a cláusula de barreira ou nos casos de mudança do programa partidário ou grave discriminação política pessoal.

 

FINANCIAMENTO EM OUTRA PROPOSTA

A tramitação da PEC ocorrerá de forma paralela à reforma política que está em discussão em uma comissão especial na própria Câmara, mas que trata de vários outros temas. Para facilitar a discussão, os assuntos serão votados separadamente. Instalada desde outubro do ano passado, somente anteontem a comissão da reforma política conseguiu aprovar o primeiro desses temas: uma nova tramitação, mais ágil, para projetos de iniciativa popular e para a realização de plebiscitos e referendos.

No entanto, os pontos mais polêmicos ainda estão por vir. O colegiado tentará aprovar mudanças no sistema eleitoral e no financiamento das campanhas. Há temores reais de que a comissão não consiga aprovar a reforma em tempo hábil para que passe a valer já nas próximas eleições, em outubro de 2018. Para tanto, o texto teria de ser aprovado um ano antes do pleito: ou seja, em menos de cinco meses.

 

O QUE FOI APROVADO

CLÁUSULA DE BARREIRA. A proposta atrela a liberação de recursos do fundo partidário e a concessão de horário gratuito em rádio e TV ao desempenho dos partidos nas eleições proporcionais. No ano que vem, os partidos precisarão obter nacionalmente, no mínimo, 2% dos votos válidos para deputado federal, em pelos menos 14 unidades da federação. A partir de 2022, o mínimo nacional sobe para 3% dos votos válidos.

FEDERAÇÃO DE PARTIDOS. Antes do início das campanhas, os partidos poderão se registrar no TSE como uma federação, que atuará como se fosse uma única legenda nos quatro anos seguintes. Nestes casos, serão contados para o cálculo da cláusula de barreira os votos dados aos candidatos de todos os partidos da federação.

FIDELIDADE PARTIDÁRIA. Os eleitos para cargos no Executivo ou no Legislativo que se desfiliarem dos partidos pelos quais foram eleitos perderão o mandato, exceto na hipótese de seu partido original não ter atingido a cláusula de barreira ou nos casos de mudança do programa partidário ou grave discriminação política pessoal.

COLIGAÇÃO NAS DISPUTAS PROPORCIONAIS. Esta proposta só vale para 2020 e prevê o fim das coligações nas disputas proporcionais (vereadores, deputados estaduais e deputados federais).

O globo, n.30586 , 04/05/2017. País, p. 6