JANOT PEDE IMPEDIMENTO DE GILMAR MENDES EM CASO DE EIKE

Carolina Brígido 

Rayanderson Guerra

09/05/2017

 

 

Advogado que trabalha com mulher do ministro critica decisão
 
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu para o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar o ministro Gilmar Mendes impedido de ser relator do habeas corpus do empresário Eike Batista. Segundo a ação, o ministro não poderia atuar no caso porque a mulher dele, Guiomar, trabalha no escritório do advogado Sérgio Bermudes, de quem Eike é cliente. Há pouco mais de uma semana, Gilmar libertou o empresário, e Janot pede que a decisão seja anulada, já que, em sua avaliação, o ministro não poderia ter decidido no caso.

Janot sustenta que, pela lei, o juiz não poderá exercer jurisdição no processo “em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório”.

O GLOBO procurou a assessoria do STF e o gabinete de Gilmar Mendes, mas não obteve uma resposta. O advogado Sergio Bermudes acredita que não há conflito, porque seu escritório não defende Eike na ação que foi analisada por Gilmar Mendes:

— Essa arguição me choca porque não tem nem pé nem cabeça. Eu não acompanhei o processo, não sou criminalista, nunca fui. Não há por que cogitar suspeição ou impedimento.

O pedido do procurador-geral foi encaminhado à presidente do STF, ministra Cármen Lúcia. Caberá ao plenário do STF julgar a questão. O Regimento Interno do tribunal prevê que esse tipo de caso seja apreciado em sessão secreta. No entanto o STF já baniu as sessões secretas de sua rotina. Essa questão deverá ser definida pelos ministros, quando for realizado o julgamento, que não tem prazo para ocorrer.

Antes do julgamento, Janot pediu que sejam ouvidos em depoimento Gilmar, Guiomar, Bermudes e Eike. Segundo informações do tribunal, é a primeira vez que um procuradorgeral da República entra com esse tipo de ação contra um ministro do Supremo, o que aprofunda a crise instalada entre Gilmar e o Ministério Público. Recentemente, o ministro acusou a PGR de vazar informações de investigações sigilosas. No dia seguinte, Janot insinuou que Gilmar sofria de “disenteria verbal”.

Na ação apresentada ao STF, Janot argumenta que, como cliente do escritório de Bermudes, Eike teria pago honorários a Guiomar, mesmo que indiretamente, porque ela teria participação nos lucros da sociedade advocatícia. Isso caracterizaria a suspeição do ministro, prevista no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal. Segundo as legislações, o juiz é considerado suspeito se qualquer das partes for sua credora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau.

“Em situações como essa há inequivocamente razões concretas, fundadas e legítimas para duvidar da imparcialidade do juiz, resultando da atuação indevida do julgador no caso”, afirmou Janot na ação. O procurador lembrou que, em 1982, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos afirmou que “todo juiz em relação ao qual possa haver razões legítimas para duvidar de sua imparcialidade deve abster-se de julgar o processo”.

Eike estava preso em Bangu pela Operação Eficiência, que investiga contratos fraudulentos de empresas com o governo do Rio. Gilmar suspendeu a prisão preventiva decretada em janeiro pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro. Ontem, Bretas suspendeu o prazo de cinco dias, que venceria hoje, para Eike pagar a fiança de R$ 52 milhões e não voltar à cadeia. A defesa do empresário alegou a impossibilidade do pagamento, já que os bens dele estão bloqueados. (Colaborou Daniel Gullino)

O globo, n.30591 , 09/05/2017. País, p. 4