O Estado de São Paulo, n. 45064, 05/03/2017.  Política, p. A7

Regra de Temer guia ‘proteção’ na Câmara

Deputados citam medida do presidente para afastar investigados como meio de blindar colegas

Por: Isadora Peron / Daiene Cardoso

 

Às vésperas da entrega ao Supremo Tribunal Federal (STF) dos novos pedidos de abertura de inquérito com base na delação de executivos e ex-executivos da Odebrecht, a Câmara se prepara para proteger os deputados que forem alvos de investigações na Operação Lava Jato.

Apesar da expectativa em relação à nova lista que deverá ser divulgada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, parlamentares dizem acreditar que, assim como ocorreu após a divulgação da primeira relação de nomes, há dois anos, apenas os casos mais graves, como do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), devem ser analisados pelo Conselho de Ética. Até hoje, nenhum outro processo foi aberto na Casa, apesar de já haver dez deputados denunciados na Lava Jato e dois deles serem réus: Nelson Meurer (PP-PR) e Aníbal Gomes (PMDB-CE).

 

Exemplo. Para proteger seus pares, líderes de partidos da base e da oposição defendem que será preciso um conjunto substancial de provas para que seja aberto um processo contra algum parlamentar e que os conselheiros terão que estabelecer parâmetros de como vão agir diante das novas ações no STF.

Citam como exemplo a medida adotada pelo presidente Michel Temer, que definiu uma “linha de corte” e anunciou que só irá afastar ministros do governo que virarem réus.

“Não bastam meras citações para abrir um processo no Conselho de Ética, isso vai depender da solidez das provas apresentadas.

O órgão não pode se antecipar e condenar alguém, isso é um papel da Justiça”, disse o líder do DEM na Casa, Efraim Filho (PB).

Essa também é a opinião do líder do PSDB, deputado Ricardo Tripoli (SP). Para ele, apenas a abertura de inquérito no Supremo não é motivo para abrir um processo de cassação na Câmara. “Quando surge uma denúncia, aí não tem dúvida, o conselho tem que agir.” Os líderes também têm mantido suspense sobre que nomes vão indicar para fazer parte do conselho – que é formado por 21 deputados – pelos próximos dois anos. Segundo eles, apesar de a eleição para a nova composição do colegiado estar prevista para meados deste mês, o assunto ainda não está na ordem do dia.

Parlamentares da oposição, porém, especulam que os partidos implicados na Lava Jato vão escolher a dedo quem irá representá- los no colegiado. “Acho que eles estão se precavendo para ter um conselho linha dura, que forme uma maioria não vacilante”, disse o deputado Ivan Valente (PSOL-SP).

 

Expectativa. Novos inquéritos devem atingir deputados

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Candidato do PP preocupa conselheiros

Por: Isadora Peron / Daiene Cardoso

 

A possibilidade de o deputado Ricardo Izar (PP-SP) disputar a presidência do Conselho de Ética da Câmara este ano despertou desconfiança entre conselheiros atuais. Embora ainda não tenha formalizado a intenção de concorrer, Izar é visto como um representante do PP, um dos principais partidos investigados na Operação Lava Jato e que teria interesse em blindar seus parlamentares de investigação por quebra de decoro.

Izar já foi presidente do Conselho de Ética entre 2013 e 2015, mas atualmente era suplente no colegiado e relator do processo disciplinar contra o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ). Em sua gestão à frente do conselho, Izar comandou os processos de cassação dos ex-deputados André Vargas e Natan Donadon. A cassação do ex-deputado Luiz Argolo chegou a ser aprovada pelos conselheiros, mas a legislatura acabou sem que o processo avançasse.

Deputados que integram a atual formação do conselho temem que a disposição de Izar pode ser o primeiro sinal de que os partidos investigados na Lava Jato tentarão proteger seus parlamentares. “O ideal é que fosse alguém com mais isenção e equilíbrio”, disse um conselheiro.

Além de Izar, os deputados Sandro Alex (PSD-PR) - atual vice-presidente do conselho - e Marcos Rogério (DEM-RO) - relator do processo de cassação de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) - já demonstraram interesse em presidir o colegiado. Ambos adotam o discurso de unidade e preservação da imagem do colegiado. “Quem assumir o conselho vai estar limitado pelas normas internas e pela pressão da opinião pública”, ressaltou um deputado que é titular da atual formação.

O líder do PP, deputado Arthur Lira (AL), disse que não recebeu o pedido de Izar para integrar o grupo e que ainda vai definir quem serão os dois representantes do PP no colegiado. Lira é um dos investigados na Lava Jato.

Conselheiros consideram ruim para a imagem do colegiado ter um presidente filiado a um partido investigado na Lava Jato. Os membros mais antigos lembram que Izar foi um presidente “cuidadoso” e “dedicado” enquanto ocupou a função, por isso o relançamento de seu nome poderia atender a estratégia dos partidos de serem discretos na blindagem. “Pode ser uma estratégia de lançar alguém que não levante suspeitas”, concluiu um parlamentar.

Izar rebateu o discurso dos colegas e lembrou que outros partidos também estão citados nas investigações. O parlamentar disse ter dúvidas se haverá tempo dos processos chegarem ao conselho, uma vez que existe a disposição dos partidos em representar os investigados só quando se tornarem réus. “Depende da velocidade do Judiciário para depois cair para o conselho”, comentou./ D. C. I. P