O Estado de São Paulo, n. 45066, 07/03/2017. Política, p. A4

Gilmar defende mudança no financiamento eleitoral

Para presidente do TSE, lei atual que proíbe doações empresariais tem de ser alterada até setembro para valer em 2018; ele cita caixa 2 e vê risco de ‘falta de controle’

Por: Daniel Weterman

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, defendeu ontem mudança no sistema de financiamento de campanha eleitoral. Para ele, se a lei atual que proíbe financiamento empresarial a políticos e partidos não for modificada, a eleição presidencial de 2018 poderá ocorrer em um quadro de “anomia (ausência de regras)” e de “falta de controle”.

Antes de participar de uma palestra sobre reforma eleitoral no auditório do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis (Sescon) de São Paulo, Gilmar disse que é preciso encontrar outra forma de financiamento para as eleições de 2018 até setembro deste ano, a fim de que as novas regras já possam valer no ano que vem.

“No sistema anterior, segundo as revelações que agora estão saindo dessas informações, Lava Jato, Odebrecht, diz-se que talvez o caixa 2 tenha sido tão forte ou às vezes até mais forte do que o caixa 1. Agora, imagina o que vai ser uma eleição presidencial em que vamos ter essa corrida de elefantes, com um sistema sem regulação”, afirmou. “Portanto, esse tema precisa estar na agenda e esse é grande problema. Tem de estar na agenda até setembro, tem de ser decidido até setembro por conta do princípio da anualidade.”

 

‘Descalabro’. Gilmar considera que País vive um “descalabro” ao ser questionado sobre conteúdo dos depoimentos de ex-executivos da Odebrecht ao TSE no processo que julga a chapa Dilma Rousseff-Michel Temer.

Conforme mostrou o Estado ontem, o relator do julgamento na Corte eleitoral, Herman Benjamin, ficou impressionado com o grau de acesso e de domínio que o empreiteiro Marcelo Odebrecht contou ter ao topo da cadeia de poder, sugerindo a impressão de apropriação do poder público pelo poder privado.

“Acho que nós vivemos, isso não precisa das delações, nas últimas décadas, um quadro de descalabro tão grande que é difícil classificar essa apropriação do público pelo privado, essa relação anárquica e promíscua”, disse o presidente do TSE.

Durante sua palestra, Gilmar destacou parte do depoimento do empreiteiro Marcelo Odebrecht à Justiça Eleitoral na semana passada. “Os senhores viram as declarações de Marcelo Odebrecht dizendo que doou para a campanha de Dilma Rousseff R$ 150 milhões, dos quais 80% pelo caixa 2? Num sistema de franquia, de abertura, ocorreu isso.

E isso é pouco que se sabe desse contexto todo”, afirmou.

Para ele, o País está atualmente “em um mato sem cachorro” e em um “limbo”. “Temos de encontrar um outro meio de financiamento que não esse (atual), alguma coisa tem de ser feita, ou crowdfunding (financiamento coletivo) ou alguma coisa que se regularize em torno desse tema.” Gilmar afirmou que é preciso pensar em uma “grande engenharia institucional que permita que os itens sejam minimamente regulados” para o financiamento e que as eleições não resultem em um quadro de abuso de poder econômico. O ministro destacou que é preciso definir também um teto para as doações, sejam de empresas ou de pessoas físicas.

 

Cláusula. O ministro defendeu ainda o fim das coligações e a cláusula de barreira, medida que pode diminuir o número de partidos representados no Congresso Nacional. “Também seria grande ganho desconstitucionalizar a questão do sistema eleitoral, para deixar que o próprio jogo político partidário e a formação da maioria permitam fazer experimentos institucionais.”

 

‘Relação anárquica’. Para Gilmar, País viveu ‘quadro de descalabro’ nos últimos anos

 

PRESTE ATENÇÃO

1.Proibição de doações empresariais. Em setembro de 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, por 8 votos a 3, a inconstitucionalidade do financiamento empresarial de campanhas políticas. A ação foi ajuizada na Corte pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que via nesta fonte de financiamento brechas para corrupção.

 

2.‘Influência do poder econômico’. A ministra Cármen Lúcia afirmou que “aquele que detém maior soma de recursos é aquele que têm melhores contatos com empresas e, depois, vai representar esses interesses, não o interesse do povo”. O relator Luiz Fux disse que “o poder econômico captura de maneira ilícita o poder político”.

 

3.Chapa Dilma-Temer. O PSDB entrou com ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra a chapa sob alegação de abuso de poder econômico. Ação fala em “financiamento de campanha mediante doações oficiais de empreiteiras contratadas pela Petrobrás como parte da distribuição de propinas”, alvo de investigação da Lava Jato.

 

4.‘Apropriação do público pelo privado’. Após ouvir de Marcelo Odebrecht que ele tinha acesso a diferentes instâncias do poder, o ministro Herman Benjamin, relator do processo que pede a cassação da chapa Dilma-Temer no TSE, disse, segundo apurou o Estado, que a empreiteira se apropriou do poder público no País.

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Futuro ministro da Justiça afirma que não mudará cúpula da PF

Osmar Serraglio, que toma posse hoje, diz que não seria ‘maluco’ de tirar Leandro Daiello do comando da corporação

Por: Isadora Peron

 

Na véspera de assumir o Ministério da Justiça, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) afirmou ontem que não pretende fazer mudanças na cúpula da Polícia Federal, corporação subordinada à pasta e responsável por conduzir as investigações da Operação Lava Jato.

Ao ser questionado sobre o tema enquanto circulava pela Câmara dos Deputados, o futuro ministro chegou a brincar dizendo que trocaria o diretor-geral da PF, Leandro Daiello, nos próximos 15 dias, porque ele estava interferindo demais nos rumos da Operação Lava Jato.

Diante da reação de incredulidade dos repórteres, Serraglio riu e afirmou que não seria “maluco” de fazer isso.

A cerimônia de posse do ministro da Justiça está marcada para as 15h30 de hoje.

Serraglio afirmou que ainda está definindo a sua equipe. Segundo o peemedebista, o secretário executivo da pasta, José Levi Mello do Amaral, que está como ministro interino, será mantido no cargo e um nome de São Paulo, indicado pelo advogado criminalista Antônio Claudio Mariz de Oliveira, será o novo secretário de Segurança Pública. O próprio Mariz chegou a ser sondado para ocupar o Ministério da Justiça, mas as negociações não avançaram.

O futuro ministro afirmou também que ainda vai analisar se mantém ou não no cargo o novo presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Antônio Fernandes Toninho Costa, indicado para o cargo em janeiro.

O órgão é subordinado ao Ministério da Justiça.

Serraglio, integrante da bancada ruralista da Câmara dos Deputados, foi o relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, de 2010, que prevê que a demarcação de terras indígenas e quilombolas tem de passar pelo Congresso, em vez de depender apenas do Poder Executivo. “Essa é uma questão delicada”, limitou-se a dizer.

Serraglio foi nomeado por Michel Temer como ministro da Justiça no último dia 23. A bancada do PMDB na Câmara dos Deputados pressionou o governo por mais espaço e para ficar com o comando do Ministério da Justiça.

 

Fora. Mariz de Oliveira ligou ontem para o presidente Michel Temer e recusou convite para assumir um cargo no governo. O advogado alegou “razões profissionais e pessoais” para não fazer parte da equipe do peemedebista.

“Fiquei honrado com o convite do presidente para integrar uma assessoria que cuidaria da questão penitenciária, mas por razões profissionais e pessoais eu declinei do convite”, declarou o criminalista./ COLABOROU FAUSTO MACEDO