TEMER ACIONA PLANO B

Carolina Brígido

Cristiane Jungblut

23/05/2017

 

 

Presidente desiste de pedir fim de inquérito após STF condicionar julgamento a laudo da PF
 

 

“O importante é que, em relação ao presidente, a prova que há é o áudio. E esse áudio, na nossa avaliação, é imprestável”

Gustavo Guedes

Advogado do presidente Temer

Sob risco de ser derrotado no Supremo Tribunal Federal, o presidente Michel Temer mudou de estratégia. Depois de, no sábado, anunciar pedido para suspender inquérito aberto para investigá-lo, ontem Temer desistiu da ideia. A defesa do presidente avisou ao relator da Lava-Jato, ministro Edson Fachin, que não será mais preciso submeter ao plenário do STF o pedido de paralisação da investigação sobre as acusações feitas pelo empresário Joesley Batista, do grupo JBS. Os advogados recuaram por receio de manchar ainda mais a imagem do presidente em meio à crise. Fachin levaria o pedido para a votação do tribunal. Muitos ministros já tinham decidido votar pela continuidade das investigações, o que enfraqueceria Temer ainda mais.

Mas a versão oficial da defesa foi outra. Na saída do gabinete de Fachin, o advogado Gustavo Guedes disse que o presidente estava satisfeito com a decisão do relator de determinar que a Polícia Federal realize diligência nos áudios. Agora, a prioridade seria elucidar o caso o quanto antes, desqualificando a gravação feita por Joesley Batista.

— O presidente quer dar essa resposta ao país o mais rapidamente possível e que, portanto, isso se encerre o mais rapidamente possível. Isso que a gente quer — declarou o advogado ao deixar o gabinete de Fachin.

O inquérito aberto no STF para investigar o presidente seguirá em tramitação. Nele, Temer é investigado por crimes de corrupção passiva, obstrução à justiça e participação em organização criminosa. O primeiro passo será o exame pericial das gravações feitas por Joesley. Se o Ministério Público Federal entender que há elementos suficientes para apresentar acusações formal contra Temer, será oferecida denúncia. Antes de o plenário do tribunal analisar se abre o processo, a Câmara dos Deputados deve autorizar com pelo menos dois terços dos membros, o equivalente a 342 votos. Se a Câmara der a autorização, Temer terá que se afastar do cargo após a abertura do processo penal.

Pouco antes da desistência da defesa, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, informou que o julgamento do recurso pedindo a suspensão do inquérito somente seria levado ao plenário após a conclusão da perícia da Polícia Federal nas gravações, conforme já tinha definido Fachin no sábado. No despacho, Cármen Lúcia informou ainda que, após conclusão da perícia, o Ministério Público Federal e a defesa de Temer teriam 24 horas para se manifestar.

De acordo com Guedes, foi incluído no processo o laudo produzido por um perito contratado pela defesa de Temer. Segundo o relatório, foram detectados 70 “pontos de obscuridade” no material. Para a defesa, o áudio não pode ser usado como prova nas investigações, diante das aparentes modificações feitas pelo delator, o dono da JBS, Joesley Batista.

— O importante é que, em relação ao presidente, a prova que há é o áudio, não há nada mais, e esse áudio, segundo as perícias, é, na nossa avaliação, imprestável — declarou o advogado.

Na petição entregue ao STF, a defesa pede a conclusão rápida do inquérito. “Como vem repetindo publicamente, o presidente da República é o maior interessado na rápida e cabal elucidação dos fatos. Por outro lado, não há dúvidas de que a perícia nos áudios é questão preliminar, prejudicial em relação a quaisquer outras diligências”.

Na semana passada, um dia após o site de O GLOBO revelar o conteúdo das gravações feitas por Joesley Batista, Temer dizia que o caso deveria mesmo ser investigado:

— Quero registrar enfaticamente: a investigação pedida pelo Supremo Tribunal Federal será território, onde surgirão todas as explicações. E no Supremo, demonstrarei não ter nenhum envolvimento com esses fatos.

Dois dias depois, após ouvir a gravação divulgada pela STF, Temer mudou de ideia, e adotou tom mais agressivo, defendendo que o inquérito deveria ser paralisado.

— Essa gravação clandestina, é o que diz, foi manipulada e adulterada com objetivos nitidamente subterrâneos. Incluída no inquérito sem a devida e adequada averiguação, levou muitas pessoas a um engano induzido e trouxe grave crise ao Brasil. Por isso, no dia de hoje, estamos entrando com petição no colendo Supremo Tribunal Federal para suspender o inquérito até que seja verificada em definitivo a autenticidade da gravação clandestina.

O Palácio do Planalto prepara nova ofensiva jurídica para tentar desqualificar o áudio do empresário Joesley Batista, reforçando a tese de que a prova seria “ilícita e viciada”. No plano político, a estratégia é tentar votar “matérias importantes para o país”. Entre parlamentares da oposição, a avaliação é que Temer recuou porque sabia que não ganharia no pleno do Supremo. Esses parlamentares avaliam a decisão de Cármen Lúcia como um indicativo neste sentido.

 

ÁUDIOS: OUÇA A GRAVAÇÃO DE CONVERSA COM TEMER

Joesley Batista, dono da JBS gravou conversa no Palácio do Jaburu oglobo.com/pais

O globo, n.30605 , 23/05/2017. País, p. 3