O Estado de São Paulo, n. 45067, 08/03/2017. Economia, p. B4

Investimento teve o pior resultado em 20 anos

Por: Daniela Amorim / Vinicius Neder

 

Em meio ao prolongado cenário de recessão, paralisação da produção e redução no consumo, a taxa de investimento na economia brasileira registrou o pior desempenho em pelo menos 20 anos. O resultado de 16,4% do PIB registrado em 2016 foi o menor da série histórica, iniciada em 1996 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Já são 11 trimestres consecutivos de retração na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida dos investimentos no PIB). Embora o ritmo de queda tenha desacelerado no quarto trimestre, quando o recuo de 5,4% ante o mesmo trimestre de 2015 foi o mais brando registrado nesse período de perdas, uma futura retomada esbarra no alto nível de capacidade ociosa. “Continua com taxas negativas, mas quedas menores”, disse Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE.

A esperança de retomada dos investimentos reside no projeto de concessões públicas prometido pelo governo, na avaliação do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). “É a única possibilidade. O impulso aos investimentos não vai sair de setores em que a capacidade ociosa está tão elevada. Seria conveniente que o arranjo financeiro e contratual que essas operações vão demandar já estivessem prontos, porque o efeito na economia demora a acontecer”, alertou Rafael Cagnin, economista-chefe do Iedi.

O Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) da indústria foi de 74,3% em fevereiro, enquanto o do setor de serviços ficou em 82,1% no mesmo mês, segundo sondagem do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV). A alta ociosidade é reflexo da retração na atividade. O PIB industrial encolheu 3,8% em 2016, enquanto o PIB de serviços diminuiu 2,7%.

“Nossa crise é interna, inclusive política. O grande ponto de interrogação é como essa crise política vai se desdobrar e se vai abalar a confiança dos agentes daqui em diante, já que foi a grande responsável pelo mico dos investimentos nos últimos dois anos”, avaliou o economista Fabio Bentes, da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

Para José Luís Oreiro, professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), o tombo nos investimentos a partir do segundo trimestre de 2014 foi o fator que detonou a recessão. “É como se fosse um avião que perde sustentação. De repente, desaba.”

Por trás desse colapso esteve o fato de que, no início daquele ano, a taxa real de retorno do capital ficou negativa, ou seja, abaixo da inflação, afirmou Oreiro. Isso ocorreu porque houve “esmagamento do lucro” das empresas, provocado por custos em alta (destaque para salários) e impossibilidade de repassá-los (por causa do câmbio favorável às importações).

Entre os componentes do PIB, a maioria teve perdas menores no último trimestre de 2016 ante o mesmo período do ano anterior. Isso não indica, porém, que a recuperação é certa, alertou Rebeca Palis. Juros, inflação e a expectativa dos consumidores são determinantes, mas “o mercado de trabalho é fundamental na equação”, declarou.

“Olhando para trás, é terra arrasada. Mas, olhando para a frente, tem novidades, principalmente o arrefecimento da inflação, que vai ajudar a partir do segundo semestre, e planta um cenário positivo para os juros. O que está faltando para a economia recuperar é o emprego mesmo”, corroborou Bentes, da CNC.

 

NO VERMELHO

● Evolução da taxa de expansão do PIB ao longo dos últimos anos

Sarney -  4,4

Collor -  -1,3   COLLOR IMPLEMENTOU O CRUZEIRO E CONFISCOU POUPANÇAS PARA CONTER A HIPERINFLAÇÃO

Itamar -  1,4

FHC -  1º mandato – 2,5

FHC -  2º  - mandato – 2,3

Lula - 1º mandato – 3,5

Lula - 2º mandato -  4,6 - MEDIDAS ADOTADAS EM 2009, COMO A EXPANSÃO DO CRÉDITO, FIZERAM CRESCIMENTO VOLTAR AO PATAMAR DE 1986

Dilma - 1º mandato - 2,3 -

Dilma - 2º mandato -  -3,8*

Dilma / Temer - -3,6** - A CRISE POLÍTICA E ECONÔMICA CULMINOU NA MAIOR RECESSÃO DESDE 1990

 

Média da taxa de variação do PIB por governo*** (%)

 

*APENAS ANO DE 2015. **APENAS ANO DE 2016. ***NOS OITO ANOS DE MANDATO, A MÉDIA DE CRESCIMENTO DURANTE O GOVERNO FHC FOI DE 2,4%, ENQUANTO NOS OITO ANOS DE LULA

FICOU EM 4,1%. CONSIDERANDO OS CINCO ANOS DE GOVERNO DE DILMA ROUSSEFF, A MÉDIA DE EXPANSÃO DO PIB FOI DE 1,1%.

 

FONTE: IBGE

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Quebra da safra derrubou PIB da agropecuária

Por: Daniela Amorim / Vinicius Neder

 

A quebra da safra agrícola no País em 2016, causada por problemas climáticos, derrubou o PIB da agropecuária no ano passado. A queda de 6,6% foi a maior da série histórica iniciada em 1996 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A safra de milho encolheu 25,7% em 2016, a produção de cana-de-açúcar caiu 2,7% e a safra de soja diminuiu 1,8%. “Essas três culturas pesam cerca de 60% do total da agricultura brasileira.

E o que cresceu no ano pesa mais ou menos só 10% da agricultura brasileira”, disse Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE.

Ela se refere ao crescimento de 22% na safra de trigo, 15,5% na do café e 2,8% na da mandioca em relação a 2015. Apesar das perdas no ano passado, o setor é uma das principais apostas para ajudar na recuperação do PIB neste ano. A expectativa é de safra de grãos recorde, o que deve fazer o PIB agropecuário voltar para o azul.

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Economia brasileira ficou na lanterna entre 39 países

País ficou atrás, no ano passado, até de nações que atravessam grave crise, como a Ucrânia e a Grécia

Por: Fernanda Nunes / Vinícius Neder

 

A recessão colocou o Brasil na última posição no ranking dos 39 países que já divulgaram o Produto Interno Bruto (PIB) de 2016. Com a contração de 3,6% do ano passado, ficou atrás de nações que enfrentam graves crises, como a Ucrânia, que cresceu 2%, e a Grécia, cuja economia avançou 0,3%, segundo levantamento da agência de risco Austin Rating.

O desempenho negativo do Brasil poderia ser superado pela Venezuela, também em grave crise, e que vem atrasando a divulgação de dados econômicos, lembrou Alex Agostini, economista-chefe da agência. No ranking de 39 países, a Rússia foi a única a acompanhar o Brasil no território negativo, com queda de 0,8% no PIB.

Para Agostini, a comparação internacional mostra que a recessão brasileira foi causada por fatores internos, como erros da política econômica e a crise política. A saída para o País é seguir no ajuste fiscal, incluindo a reforma da Previdência. “A Grécia, para voltar a crescer, fez um ajuste fiscal muito profundo e mexeu na Previdência.”

Como a crise tem motivações internas, o crescimento da economia mundial não deve contribuir para a recuperação brasileira, segundo o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Ainda que as economias da China (6,7%) e dos EUA (1,6%), principais destinos da produção brasileira, tenham crescido, o Brasil precisa arrumar a casa para tomar proveito da retomada mundial. “Não há nada a comemorar, temos de esquecer 2016. É um passado que nos assusta”,disse.

Nos dados do IBGE, a demanda interna caiu 5,3% e o PIB só caiu 3,6% porque a demanda externa avançou 1,7%. O volume importado caiu 10,3%, enquanto as exportações subiram em menor intensidade, 1,9%. Para a AEB, porém, o problema é que as matérias-primas (commodities) sustentaram o setor externo brasileiro, por conta da melhora das cotações do petróleo e do minério de ferro no fim do ano. / FERNANDA NUNES E V.N.

 

Companhia

-0,8% foi o desempenho do PIB da Rússia no ano passado, única nação entre as 39 do ranking a também apresentar, além do Brasil, número negativo para a economia

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A recessão está próxima do fim

Por: Fernando Honorato / Igor Velecico

 

O resultado do PIB de 2016 marca o fim de um processo prolongado de recessão no Brasil. A partir do primeiro trimestre deste ano, o PIB deve passar a mostrar crescimento, fruto da reorganização da política econômica, da boa safra agrícola e do corte de juros por parte do Banco Central. Desde a contração de 0,9% do PIB do quarto trimestre do ano passado, os indicadores têm sido compatíveis com riscos balanceados para o crescimento e, para nós, aumentou a probabilidade de um início de estabilização no ano.

O consumo das famílias tem apresentado contrações gradualmente menos intensas, e já projetamos estabilidade no primeiro trimestre. Por outro lado, os investimentos ainda não deram sinais de estabilização, com queda de 1,6% no trimestre passado.

Diante da ociosidade ainda existente na economia, a recuperação do investimento deverá ser lenta.

Há diferentes fatores explicando esse comportamento. No caso do consumo, a melhora tem a ver com quatro pontos: melhora nos indicadores de confiança; a queda inflação, que tem ajudado a renda disponível, junto com menor destruição de postos de trabalho, e a poupança precaucional, que produziu uma queda muito intensa do consumo nos últimos anos, começa a se dissipar. Todos esses vetores devem continuar melhorando nos próximos meses.

Os investimentos, por sua vez, ainda sofrem impacto das condições financeiras apertadas. De fato, após uma queda de demanda final intensa, as empresas cortaram os investimentos de forma importante.

Entretanto, a queda dos juros e do risco país devem começar a impulsionar os investimentos já a partir do segundo trimestre.

As outras fontes de crescimento – gastos do governo, setor externo e estoques – continuarão pouco relevantes para o crescimento.

Nossa expectativa para o PIB em 2017 é uma alta de 0,3%, ainda que reconheçamos que o grau de incerteza sobre a recuperação seja maior do que o usual. As políticas adotadas até aqui estão na direção correta, produzindo queda da inflação, dos juros e do risco de solvência das contas públicas, condições necessárias para a volta do crescimento.

 

ECONOMISTA-CHEFE E ECONOMISTA DO DEPARTAMENTO DE PESQUISAS E ESTUDOS ECONÔMICOS DO BRADESCO