Eduardo Bresciani e Cristiane Jungblut
20/05/2017
O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), recebeu R$ 5 milhões para atender a um interesse da JBS como relator de uma medida provisória (MP) e meses depois teria traído a empresa, aprovando, em outra MP, uma mudança legislativa que derrubava o que havia sido combinado com o executivo Ricardo Saud, que delatou o episódio à ProcuradoriaGeral da República (PGR).
— Eu falei, “Eunício, isso aí vai quebrar o setor. Você arruma um jeito de ajudar a gente nisso e nós te ajudamos na campanha, como sempre fizemos, vamos achar um jeito e tal”. Ai ele falou: “Aí Ricardo, isso aí tem um custo, vamos fazer um custo de uns R$ 5 milhões, é muito pouco, mas para mim (sic) ajudar meus pares, ajudar quem for”— contou Saud.
Segundo ele, o pleito era da associação de empresas do setor e Eunício sabia que o custo seria cobrado dela. Foi realizada então uma nova reunião com representantes da entidade na qual se acertou o valor. Saud afirma que os recursos foram repassados como doações ao PMDB feitas em 2013 porque Eunício era o tesoureiro nacional da legenda.
A questão, no entanto, também envolvia uma disputa empresarial. A emenda acatada pelo presidente do Senado impediu que um grupo concorrente da JBS no setor de laticínios tivesse acesso a um crédito tributário de R$ 100 milhões. Meses depois, porém, o peemedebista revogou o que tinha acatado em outra MP e beneficiou os concorrentes da empresa.
— Isso foi feito, o Eunício acatou o que precisava acatar por R$ 5 milhões. Pagamos direitinho. Fizemos doações oficiais dissimuladas para ele, porque ele era tesoureiro do PMDB, estamos com as datas direitinho, para ver que não tinha nada a ver com eleição, nada a ver com nada. Pagamos. Sabe o que aconteceu doutor? Posso falar porque ele era meu amigo. Oito meses depois ele foi relator de outra medida provisória e voltou atrás — afirmou o delator.
— Revogou o artigo? — questiona o procurador.
— Exatamente. Priorizaram esse povo aí e pegaram o dinheiro – disse o executivo.
O investigador perguntou a Saud se ele não foi tirar satisfação com Eunício. O empresário disse não ter feito o confronto porque sabia que não podia reaver o dinheiro.
— Você não foi tirar satisfação com ele? Perguntar o que tinha acontecido? — questiona o procurador.
— Esse tipo de negócio, depois de pago, não tem mais jeito. Como vou falar: ‘Você tá me roubando, você tá fazendo isso’. O senhor acha que eu vou ter o dinheiro de volta ou as empresas vão ter o benefício de volta? — disse Saud.
EUNÍCIO DIZ QUE É MENTIRA
O presidente do Senado chamou de “mentirosos e imaginários” os diálogos relatados pelo executivo Ricardo Saud em sua delação premiada. Eunício admitiu que recebeu representantes do setor, mas negou que tenha atuado para favorecer a empresa.
”O senador Eunício Oliveira afirma que os diálogos relatados pelo delator são imaginários, nunca aconteceram, são mentirosos, como é possível constatar na prestação de contas do diretório nacional do PMDB ao TSE. No ano de 2013 não há doações ao partido conforme diz o delator, como é possível constatar nas prestações de contas do diretório nacional, que são públicas e podem ser verificadas nas declarações ao TSE. Como relator revisor, o senador recebeu representantes do setor sim, como é absolutamente normal em casos de relatoria. O senador Eunício Oliveira não usa e nunca usou suas funções legislativas para favorecer empresas públicas ou privadas”, disse o peemedebista em nota.
Ele destacou ainda que as doações feitas em 2014 pela empresa foram legais e declaradas à Justiça Eleitoral.
“As contribuições eleitorais do grupo JBS para a companha de 2014 aconteceram sim, e estão devidamente declaradas à Justiça Eleitoral na prestação de contas do candidato Eunício Oliveira”, concluiu em nota.
“Esse tipo de negócio, depois de pago, não tem mais jeito. Como vou falar: ‘Você tá me roubando, você tá fazendo isso’” Ricardo Saud Executivo da JBS
O globo, n. 30602, 20/05/2017. País, p. 15