SIGA O DINHEIRO - FOTOS PROVAM ENTREGA DE PROPINA

Lauro Jardim

Guilherme Amado

19/05/2017

 

 

 

A delação da JBS, a mais dura em três anos de Lava-Jato, merece o título em grande parte devido aos flagrantes das fotos mostradas no infográfico ao lado. Nelas, o deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), destacado pelo presidente Michel Temer para tratar com Joesley Batista dos interesses de seu grupo empresarial, é fotografado pegando R$ 500 mil em propina — a primeira parcela de um montante prometido de R$ 480 milhões. As cenas mostram essa entrega, ocorrida em 28 de abril deste ano.

As cenas também são devastadoras para o senador Aécio Neves (PSDB-MG). A Polícia Federal filmou Frederico Pacheco de Medeiros, Fred, primo de Aécio, pegando, a mando de Aécio, R$ 1,5 milhão em propina — três quartos dos R$ 2 milhões que Aécio pediu, sem saber que era gravado, para Joesley. Imagens mostram a primeira entrega, ocorrida em 12 de abril deste ano.

Fred foi diretor da Cemig, nomeado por Aécio, e um dos coordenadores de sua campanha a presidente em 2014. Tocava a área de logística. Quem levou o dinheiro a Fred foi o diretor de Relações Institucionais da JBS, Ricardo Saud, um dos sete delatores. Foram quatro entregas de R$ 500 mil cada uma. A PF filmou três delas.

As filmagens da PF mostram que, após receber o dinheiro, Fred repassou, ainda em São Paulo, as malas para Mendherson Souza Lima, secretário parlamentar do senador Zeze Perrella (PMDBMG). Mendherson levou de carro a propina para Belo Horizonte. Fez três viagens — sempre seguido pela PF. As investigações revelaram que o dinheiro não era para advogado algum. O assessor negociou para que os recursos fossem parar na Tapera Participações Empreendimentos Agropecuários, de Gustavo Perrella, filho de Zeze Perrella.

Um dos grandes diferenciais da delação dos donos da JBS foram as “ações controladas” feitas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pela Polícia Federal. Neste mecanismo de investigação (leia mais na reportagem abaixo), o flagrante do crime é calculado de maneira que seja produzida uma determinada prova. Nessa investigação, a PF acompanhou, com câmeras e escutas, a entrega de dinheiro para intermediários de Temer e de Aécio.

 

ESQUEMA NO CADE

O primeiro contato entre Rocha Loures e Joesley foi em Brasília. O dono da JBS lhe contou o que precisava do Cade. Desde o ano passado, o órgão está para decidir uma disputa entre a Petrobras e o grupo sobre o preço do gás fornecido pela estatal à termelétrica EPE.

Localizada em Cuiabá, a usina foi comprada pelo grupo em 2015. Explicou o problema da EPE: a Petrobras compra o gás natural da Bolívia e o revende para a empresa por preços extorsivos. Disse que sua empresa perde “1 milhão por dia” com essa política de preços. E pediu: que a Petrobras revenda o gás pelo preço de compra ou que deixe a EPE negociar diretamente com os bolivianos.

Com uma sem-cerimônia impressionante, o indicado de Temer ligou para o presidente em exercício do Cade, Gilvandro Araújo. E pediu que se resolvesse a questão da termelétrica no órgão. Não há evidências de que Araújo tenha atendido ao pedido. Pelo serviço, Joesley ofereceu uma propina de 5%. Rocha Loures deu o seu ok: "Tudo bem, tudo bem". Para continuar as negociações, foi marcado um novo encontro.

Desta vez, entre Rocha Loures e Ricardo Saud, diretor da JBS e também delator. No Café Santo Grão, em São Paulo, trataram de negócios. Foi combinado o pagamento de R$ 500 mil semanais por 20 anos, tempo em que vai vigorar o contrato da EPE.

Ou seja, está se falando de R$ 480 milhões ao longo de duas décadas, se fosse cumprido o acordo. Loures disse que levaria a proposta de pagamento a alguém acima dele. Saud faz duas menções ao “presidente”.

 

O globo, n.30601 , 19/05/2017. País, p. 8